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Bolsonaro pode mandar baixar tarifa de energia? Entenda como a Aneel decide as bandeiras

Definição do valor da taxa extra cobrada sobre a conta de luz depende de decisão técnica, que considera um conjunto de fatores como a situação dos reservatórios das hidrelétricas, hoje muito baixos, por causa da crise hídrica

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Por André Borges
Atualização:

BRASÍLIA - As bandeiras tarifárias de energia elétrica são uma taxa extra cobrada do consumidor de energia quando há períodos de forte escassez de chuvas, o que leva à necessidade de acionar as usinas térmicas, que são mais caras do que as hidrelétricas.

A definição sobre qual será a bandeira tarifária, porém, decisão que é avaliada mensalmente, não é um gesto meramente político, mas sim uma decisão técnica executada pela Agência Nacional Energia Elétrica (Aneel). Para decidir qual será a bandeira de cada mês, unidades técnicas da agência reguladora levam em conta um conjunto de fatores, como o nível de consumo previsto para o período, a situação dos principais reservatórios de água do País, a previsão de chuvas para o mesmo intervalo e a disponibilidade geral de operação de todo o setor elétrico, o que é diariamente calculado e fiscalizado pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS).

O presidente Jair Bolsonaro em evento organizado por evangélicos em Brasília, na quinta-feira. Foto: Alan Santos/PR - 14/10/2021

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Quando a bandeira tarifária é acionada, significa que, ao fazer a equação desses indicadores, conclui-se que haverá um custo maior para garantir o abastecimento em todo o País. Não se trata de um dinheiro extra, que fica guardado em caixa. Os pagamentos da bandeira tarifária ajudam a equilibrar as contas e evitar rombos que comprometam o setor elétrico. Antes das bandeiras, esses custos eram repassados anualmente aos consumidores, quando as distribuidoras de energia faziam seus reajustes tarifários. Com as bandeiras, esses reajustes atrelados a limitações hídricas passaram a ser mensais.

Quando o presidente Jair Bolsonaro diz ao País, como fez nesta quinta-feira, 14, que pedirá ao Ministério de Minas e Energia que mude a bandeira tarifária da energia elétrica na marra, trocando o estágio atual, que é a “bandeira de escassez hídrica”, para a bandeira “normal”, o chefe do Executivo está dizendo que vai desprezar a análise desses indicadores, ou seja, seria uma intervenção direta sobre uma decisão técnica tomada por uma agência reguladora, estrutura que deve ter independência do governo federal.

Não existe bandeira “normal”, como diz Bolsonaro. O que existe são as bandeiras verde, amarela, vermelha patamar 1, vermelha patamar 2 e, agora, devido à pior estiagem dos últimos 91 anos, a bandeira de escassez hídrica. Na bandeira verde, que é o que Bolsonaro chama de “normal”, não há cobrança de taxa extra do consumidor de energia. Nos demais níveis, uma taxa é cobrada na conta de luz e, conforme o nível definido, essa taxa sobe ou desce.

A bandeira amarela acrescenta R$ 1,874 para cada 100 quilowatts-hora consumidos. No caso da bandeira vermelha, esse valor sobe para R$ 3,971 no patamar 1 e R$ 9,492 no patamar 2. A bandeira de escassez hídrica acrescenta R$ 14,20 para cada 100 quilowatts-hora consumidos.

Quando o regime de bandeiras entrou em operação, em maio de 2015, o que se esperava é que, mais do que um instrumento de arrecadação de recursos, a cobrança mensal funcionasse como um "sinal de preço" para a população, ou seja, que sensibilizasse o usuário. Ao sentir o peso no bolso, haveria redução de seu consumo. Além de sinalizar quais são os custos reais de geração de energia, a bandeira tornaria as contas mais transparentes, alertando o consumidor sobre o aumento na tarifa, o que levaria a um consumo mais consciente, reduzindo a demanda energética.

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Esse resultado pode ter certa efetividade, mas, concretamente, o que sua cobrança tem feito é coberto contas que, antes, eram pagas pelo Tesouro Nacional.

As bandeiras tarifárias foram criadas no embalo do que o governo chamava, em 2015, durante a gestão da então presidente Dilma Rousseff, de "realismo tarifário". Na prática, o que se fez naquela época foi retirar do Tesouro Nacional o ônus de bancar as contas bilionárias do setor elétrico - resultado do desarranjo causado durante o processo conturbado de renovação das concessões de hidrelétricas do setor, passando essa dívida para as contas de luz.

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