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Brasil e Índia - TI e inserção internacional

Por Ricardo Camargo Mendes
Atualização:

Até o final da década de 80, Brasil e Índia adotaram modelos similares de desenvolvimento, baseados na substituição de importação e focados no mercado doméstico. Os modelos se sustentavam na forte presença do Estado em setores-chave e no tamanho de seus mercados. Atualmente, ambos têm baixa inserção no comércio internacional de bens - em boa parte, uma herança dessas estratégias. A fatia do Brasil é de 1,2% e a da Índia, de 1%, sinal de que continuam dependendo em larga escala das vendas internas. A liberalização nos dois países começou praticamente ao mesmo tempo, embora com estratégias e dosagens distintas. Surgiram diferenças, em especial em alguns setores, como o de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC). O desenvolvimento de TIC no Brasil foi sustentado pelo crescimento do mercado financeiro. Na Índia, foi baseado na venda de serviços terceirizados e de baixo custo para clientes no exterior. Essa diferença ajuda a explicar por que o mercado doméstico brasileiro é de cerca de US$ 27 bilhões, enquanto o indiano é de US$ 12 bilhões, mesmo com uma população seis vezes superior à nossa. Porém a conversa muda quando o assunto é a fatia no mercado global. O valor total das contratações de serviços de Tecnologia da Informação (TI) e de Business Process Outsourcing (BPO) fora dos países onde os clientes estão localizados (offshore) chegou a US$ 70 bilhões no ano passado. Nesse mercado a Índia é de longe o maior fornecedor, tendo vendido US$ 46,3 bilhões entre julho de 2008 e junho de 2009. Apesar dos esforços recentes do Brasil para se posicionar como uma alternativa à Índia em terceirização, as vendas externas somaram US$ 1,3 bilhão em 2008 - 1,85% do mercado global. Para ter uma noção da força da Índia, as exportações brasileiras do complexo soja e de minério de ferro somaram US$ 44,5 bilhões, em 2008 - US$ 1,8 bilhão abaixo dos US$ 46,3 bilhões em TI-BPO indianos. Estima-se que a demanda por serviços terceirizados no exterior deve crescer a uma taxa anual de 20% em 2007-2012, para US$ 145 bilhões. A Índia continuará o principal fornecedor, mas a competição deve se acirrar. Para o Brasil, há como ganhar mais terreno. O País dispõe de vantagens competitivas que o posicionam melhor que os indianos em diversos segmentos, sobretudo em relação ao valor agregado nos serviços, derivado da alta capacitação e inovação no setor. Mas serão necessárias mais ações que acelerem a internacionalização do setor de TIC brasileiro. A definição de nichos estratégicos é uma medida a ser tomada. Diferenciar commodities de serviços com valor agregado será essencial e saber se posicionar em mercados estratégicos, muitas vezes fora do eixo EUA-Europa, pode ser um diferencial. É justamente esse trabalho que os indianos estão fazendo, pensando aonde podem chegar em 2020. Segundo a Nasscom, que representa as empresas de TI-BPO da Índia, a expansão futura virá em especial da demanda das economias em desenvolvimento, das pequenas e médias empresas nos mercados tradicionais, de setores que hoje não estão no foco (governos, saúde e mídia, por exemplo) e da agregação de valor nas exportações por meio da inovação tecnológica e da capacitação profissional. Os novos mercados poderão responder por até 80% do crescimento até 2020. Se a Índia mantiver as iniciativas atuais, a Nasscom acredita que as exportações de serviços de TI-BPO do país poderão alcançar US$ 175 bilhões. Se forem adotadas mais iniciativas, inclusive de inovação e agregação de valor, o valor pode chegar a US$ 310 bilhões. Outra estratégia buscada pelos indianos é reforçar as vendas no mercado doméstico, com o objetivo de chegar a US$ 65 bilhões em 2020. Os indianos já demonstraram a importância do planejamento estratégico, baseado em políticas públicas, para qualificar a inserção internacional em TIC. Algumas empresas brasileiras também já começam a seguir estas trajetórias, como a de focar em países em desenvolvimento e em empresas de pequeno e de médio portes de mercados tradicionais. Produtos de valor agregado e diferenciados - caso do setor financeiro - também são encontrados aqui. No entanto, são necessários investimentos permanentes em educação e capacitação e, é claro, em inovação tecnológica. Sem a pretensão de ocupar o lugar dos indianos, mas com reais possibilidades de aumentar sua inserção internacional, o Brasil pode buscar o seu espaço. *Ricardo Camargo Mendes, mestre em Relações Internacionais pela Universidade de Cambridge, é diretor da Prospectiva Consultoria

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