PUBLICIDADE

Brasil pode gastar mais se for responsável

Por Alberto Tamer
Atualização:

Por que a economia mundial está saindo da recessão mais cedo do que se previa? Paul Krugman, prêmio Nobel de Economia, responde refletindo o pensamento de quase todos: basicamente por causa da grande intervenção governamental. Os países em que ela foi mais intensa, Estados Unidos, China, Brasil, estão se livrando antes. Os que tardaram ou foram tímidos, todos na União Europeia, vão demorar e sofrer ainda muito. Esse é um fato insofismável. Foi isso que evitou a segunda grande depressão da história, afirma Krugman. HÁ UM LIMITE. QUAL? O Brasil antecipou-se ao lançar uma política fiscal ousada e consistente que está funcionando bem, mas chegou a hora de perguntar: qual foi o custo e até quando o governo poderá mantê-la sem pôr em risco o equilíbrio fiscal e a sua credibilidade externa? Esse tema tem provocado discussões acaloradas entre economistas e a equipe econômica. Até o sempre tranquilo ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, perdeu a calma e chamou de especuladores os que condenam a política anticíclica e a acusam de pouco responsável por seus efeitos negativos na estabilidade fiscal. A resposta mais consistente e bem documentada veio, em artigo de Affonso Celso Pastore e Maria Cristina Pinotti, no Valor desta segunda-feira. "Há espaço ainda para manter o estímulo, mas há riscos de gastos permanentes de difícil reversão", como vem ocorrendo, afirmam. O estímulo do governo à economia foi significativo. Em 12 meses, o superávit fiscal primário situava-se pouco acima de 4% do Produto Interno Bruto (PIB). Em julho, recuou para 2% e a projeção é que feche o ano entre 1,5% e 1,8%. "Há, assim, um estímulo fiscal superior a 2% do PIB." Comparando com o esforço de outros países para impedir uma recessão profunda, poder-se-ia argumentar que o estímulo fiscal brasileiro é até modesto. Nos Estados Unidos, o déficit - não superávit - passou de 3% do PIB em 2008 para 13% neste ano; a dívida pública, que era de 41% do PIB em 2008, está perto de 55% neste ano, segundo o Congresso. Estima-se que, se nada for feito, poderá chegar a 85% do PIB em 2019. "Os EUA podem elevar até fortemente a dívida pública porque têm uma reputação de disciplina fiscal e nunca tiveram um default. As mudanças macroeconômicas dos últimos anos permitem ao Brasil realizar uma política fiscal contracíclica (a atual), mas nosso passado nos obriga a fazê-lo em dimensões muito mais modestas", afirmaram Pastore e Pinotti. Para eles, o fantasma do crescimento explosivo da dívida pública não é mais tão aterrador como no passado. Hoje, a dívida pública consolidada é apenas um pouco acima de 40% do PIB mas as taxas de juros, que incidem sobre ela, vêm caindo continuamente, reduzindo seu peso. Eles estimam que se for deduzida a inflação, de 4,5%, dos juros e um crescimento mesmo modesto de 3,5% no próximo ano, "serão necessários superávits fiscais inferiores a 2% do PIB para estabilizar a dívida líquida. Conclusão: não se ressuscita o fantasma do default, que já tivemos, "mas aumenta a tentação de elevar os gastos e reduzir mais o superávit primário". Isto é, o risco não está em manter a atual política de estímulo fiscal, mas de usá-la mal com gastos permanentes. E essa tentação de gastar mais e com menos responsabilidade é ainda maior num ano eleitoral em que o governo já tem um candidato. Gastar mais aumenta a demanda, ajuda sair da recessão, mas a eleger o novo presidente também. Este é o risco. Gastar mais em áreas que dão mais resultado eleitoral, mas tem retorno pouco sustentável e efeitos fiscais danosos. ENTÃO É MUDAR TUDO? Não. Nem aqui nem nos Estados Unidos, onde só há notícias positivas. Graças aos benefícios fiscais e tributários a economia americana que estava caindo 6%, recuou apenas 1% no segundo trimestre. Está saindo do fundo do poço. Na China, o enorme pacote de estímulo essencialmente à demanda interna e, mais ainda, empréstimos bancários de mais de US$ 1 trilhão em alguns meses, estão fazendo que a economia cresça 7% neste ano. Em ambos, o objetivo que está sendo alcançado, é restabelecer a confiança do consumidor e reanimar o mercado interno. No Brasil, também. Poucos duvidam que o PIB será positivo neste trimestre e poderemos terminar um ano com um índice pelo menos de estabilização após dois trimestres negativos. Por isso, não há como condenar a política fiscal, mesmo que ela reduza o superávit. É o preço que estamos pagando para evitar que o desemprego aumente e a recessão se prolongue. Todos os indicadores econômicos de consumo, emprego, construção civil são positivos. Essa política deve ser mantida. O risco, alertam Pastore e Pinotti, com muita propriedade e comprometer-se com gastos permanentes que não podem ser desfeitos quando a situação voltar à normalidade; o risco é acreditar que simplesmente o aumento do consumo, mesmo ao custo de uma redução do superávit e do equilíbrio fiscal, representa uma solução permanente para voltar a crescer. O governo está acertando com política anticíclica mas precisa resistir à enorme tentação de gastar mais já que o superávit fiscal ainda permite. Mas será isso possível num ano eleitoral? O que acha o leitor? *E-mail: at@attglobal.net

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.