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Brasil precisa mudar o cerne da política econômica se quiser ter um crescimento robusto

Para além da pandemia, há aspectos estritamente econômicos, que limitam o processo de retomada do País

Por Antonio Corrêa de Lacerda
Atualização:

Os prognósticos para o crescimento da economia brasileira têm se alterado positivamente, a partir dos resultados da atividade no primeiro trimestre com crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 1,2%. Vários fatores corroboram a expectativa da retomada no ano. Por outro lado, há restrições para a dimensão, robustez e sustentabilidade do processo, como apontaremos a seguir.

O fator-chave determinante da recuperação econômica é a pandemia de covid-19. Não apenas as novas variantes do vírus, o que, por si só, já representa uma questão fundamental, há também o efeito do atraso e descaminhos do planejamento, execução e realização do programa de vacinação da população, inexistência de medidas preventivas como testagem em grande escala, correta comunicação e orientação quanto aos protocolos sanitários. A insuficiência dos programas compensatórios, como o auxílio emergencial, é outra variável relevante.

O crédito, importante item para o financiamento dos consumidores e das empresas, continua caro e restritivo. Foto: Estadão

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Mas, para além disso, há aspectos estritamente econômicos, que limitam o processo de retomada. O enfraquecimento do mercado de trabalho é evidenciado pelo número de pessoas subutilizadas, que atingiu o recorde de 33,2 milhões de pessoas. O dado contempla a soma dos desocupados, 14,8 milhões, desalentados, 6 milhões, e subocupados, 12,4 milhões, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), referente ao trimestre acumulado até fevereiro último.

Destaque-se que mesmo aqueles que permanecem ocupados têm tido o seu poder de compra corroído pela elevação da carestia, com maior impacto nos estratos de menor rendimento. A inflação tem sido maior em itens básicos de grande peso na cesta de consumo, como alimentação, combustíveis, gás de cozinha, energia e outras tarifas.

Adicionalmente, o crédito, importante item para o financiamento dos consumidores e das empresas, especialmente as de menor porte, continua caro e restritivo, apesar do nível historicamente baixo, para padrões brasileiros, da taxa básica de juros (Selic).

Todos os fatores apontados representam limitações para a expansão do consumo, que é decisivo para a retomada econômica e para estimular os investimentos, que respondem às expectativas de crescimento futuro da demanda e de rentabilidade. O elevado nível de ociosidade, presente em vários setores, como segmentos da indústria e serviços, da mesma forma é relevante. A crise hídrica e seus impactos para a geração energética é outra variável fundamental para monitorar o comportamento futuro da economia.

Estatisticamente, no entanto, como houve expressiva retração de 4,1% no PIB do ano passado, a retomada gradual das atividades em curso gera um efeito “arrasto”, que praticamente garantirá um resultado positivo para 2021.

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Outro fator favorável é a melhora do desempenho de crescimento de grandes países, que tem impulsionado a demanda e, consequentemente, os preços das commodities, em prol do Brasil, importante exportador de minério de ferro, soja e outros grãos, carnes e petróleo bruto.

O desafio brasileiro é tornar o crescimento mais robusto e sustentável. Isso pressupõe ampliar a geração de valor agregado, a partir das vantagens competitivas locais, e elevar a criação de oportunidades de trabalho e renda para a população.

Isso requer uma mudança do cerne da política econômica, corrigindo importantes distorções, como tributação e competitividade, mas também maior ênfase nas medidas e estratégias para o desenvolvimento e inserção na economia mundial.

*PROFESSOR-DOUTOR, DIRETOR DA FEA-PUC-SP, PRESIDENTE DO CONSELHO FEDERAL DE ECONOMIA (COFECON), PUBLICOU, ENTRE OUTROS, “O MITO DA AUSTERIDADE” (EDITORA CONTRACORRENTE). WWW.ACLACERDA.COM

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