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Bresser critica política de juros altos do governo FHC

Por Agencia Estado
Atualização:

O ex-ministro da Fazenda Luiz Carlos Bresser Pereira discorda da declaração do presidente Fernando Henrique Cardoso sobre o fato de os altos juros praticados no Brasil não dependerem de uma decisão de governo, mas sim das condições do mercado. Junto com o economista Yoshiaki Nakano, Bresser é o autor do estudo intitulado "Uma estratégia de desenvolvimento com estabilidade", que vem causando alguma polêmica no meio governista por afirmar que é possível, sim, reduzir os juros dos níveis atuais, e que esses níveis não correspondem àqueles determinados pelas leis de mercado. "A taxa de juros atual é muito mais alta do que aquela que o mercado determinaria, correspondente ao risco país", afirma Bresser em entrevista à Agência Estado, dizendo que o mesmo vale para as taxas de financiamento de médio e longo prazo. "Há países de risco mais elevado do que o nosso e com taxas substancialmente menores", acrescenta. O motivo das taxas elevadas, explica o ex-ministro, está nos diversos papéis que os juros exercem hoje: manter o câmbio valorizado e impedir assim maiores pressões inflacionárias, convencer os investidores locais a financiarem o governo e atrair capital estrangeiro. Além, é claro, de controlar a demanda agregada e seus impactos sobre a inflação, segundo o documento a única das funções realmente legítima dos juros. Bresser critica a postura excessivamente cautelosa do governo em reduzir os juros e diz que, passadas as duas primeiras etapas de consolidação do plano de estabilidade no Brasil (primeiro, a de preços, e depois, a do câmbio), é chegada a hora da estabilidade para os juros. "Aqui a discussão é sobre como se estabiliza a economia para se poder ter desenvolvimento. A primeira etapa foi o brilho do Plano Real, em 94, e a estabilidade dos preços. Daí o câmbio se valorizou, e a segunda briga foi para desvalorizar o câmbio. Isso aconteceu em 99, o câmbio flutuou, mas não se desvalorizou o quanto seria necessário. Por quê? Porque a taxa de juros manteve-se muito alta. A terceira batalha para completar a estabilização macroeconômica do Brasil é essa dos juros", enfatiza Bresser. "E nós descobrimos recentemente que é possível fazer isso", acrescenta. Ele credita que seria possível baixar as taxas "para algo como 5% a 6% em termos de juros reais, não mais que isso", enquanto tivermos o atual nível de risco país. Também cobra alguma dose de coragem adicional do governo para reduzir as taxas. "Há esse sentimento de que é perigoso mexer nos juros, assim como sempre se falava sobre o câmbio antes da desvalorização. Posso dizer que era mais perigoso mexer no câmbio do que nos juros. Em certos momentos é preciso ter coragem e fazer algo. Nos juros, o perigo é bem menor, tem seu risco, é claro, mas se tem de assumir. Ou se pode fazer como a Argentina, que fez ajuste fiscal, mais ajuste fiscal, etc, e veja no que deu", comenta Bresser. O documento econômico do PSDB encomendado ao ex-ministro Bresser Pereira também causou polêmica por ser entendido como uma crítica direta à atual política econômica do governo e, especialmente, ao ministro da Fazenda, Pedro Malan. Apesar das críticas ao ministro no tocante à condução anterior da política cambial e agora da política dos juros, Bresser garante que não se trata exatamente disso. "É importante ressaltar que a gente não está fazendo nenhuma crítica especial ao governo. Eu gosto muito do Armínio Fraga (a quem elogiou por diversas vezes durante a entrevista) e tenho minhas divergências com o Malan", afirma o economista. "Agora, veio parte da imprensa querendo dizer que isso é uma briga entre monetaristas e desenvolvimentistas. Isto é uma tolice imensa. Eu não sou desenvolvimentista em hipótese alguma, talvez tenha sido quando tinha meus 20 anos, assim como o Pedro Malan, o Armínio e a equipe do Banco Central não são monetaristas. O monetarismo entrou em crise há pelo menos 10 anos", comenta Bresser, lembrando que a discussão é sobre como desenvolver o País com estabilidade. Questionado se o documento do PSDB representaria a base do futuro programa econômico do partido, que lança nesta quinta-feira como seu candidato o ministro da Saúde, José Serra, o ex-ministro Luiz Carlos Bresser Pereira diz que não é essa a idéia do estudo. O objetivo seria incitar o partido e a sociedade como um todo ao debate. "Não tenho idéia se ele aproveitaria o estudo e nem quero comprometer o Serra com as minhas idéias", sublinha Bresser. "O que eu posso dizer é que o Serra e eu sempre tivemos idéias muito semelhantes, desde que nos conhecemos, há muito tempo. Nunca tivemos nenhuma discordância importante em matéria econômica. Assim, imagino que ele possa adotar algumas das minhas idéias, mas vai depender exclusivamente dele", completa o economista. Ele diz que esta será uma eleição presidencial em que os programas terão maior importância junto ao eleitorado - e que por isso o debate assume especial importância - onde há de se discutirem mais as idéias, menos as pessoas. "O Brasil tem avançado nessa questão de debater mais seriamente, respeitosamente, e não ficar um candidato desqualificando o outro. Pena que o Ciro (Gomes) não percebeu isso, ele tem algumas boas idéias", provoca o ex-ministro. Sobre a questão da política industrial, Bresser Pereira esclarece que ela é importante para o desenvolvimento do Brasil, mas que, em nenhum momento, defenderia protecionismos ou reservas de mercado nos moldes de antigamente. "Nem pensar, em hipótese alguma . Os tempos do protecionismo acabaram", diz Bresser. "A meu ver, uma política industrial também não é a solução mágica de nossos problemas", completa ele, explicando que recusou o convite de uma emissora de televisão para falar sobre o tema. "Isso desviaria o assunto. Eu apareceria como o defensor da política industrial, e o Malan contra. Ele não é contra política industrial", comenta o economista. Ele explica que uma política industrial responsável consistiria basicamente no financiamento abundante para as empresas que têm capacidade de exportar ou de substituir importações de maneira competitiva. Isso eliminaria um ciclo que considera perverso: quando o mercado interno fica aquecido, muitas das empresas se voltam para este mercado e deixam de exportar, provocando efeitos que levam, de ciclos em ciclos, à semi-estagnação econômica.

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