Publicidade

Cannes marca volta a padrões mais simples

Publicitários criticam excesso de glamour com pouco conteúdo

Por Marili Ribeiro e CANNES
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Espartano nas celebrações, segundo profissionais do meio, por decorrência direta da crise global, a 56ª edição do Festival de Publicidade de Cannes marcou também o que alguns acreditam ser um novo patamar para o negócio da publicidade. Com os cortes de receita e a reordenação de verbas publicitárias, disseram em palestras consultores e anunciantes, o mercado voltará para um nível de preços bem abaixo do de antes da crise. "A eleição de Barack Obama está mudando a cara do mundo. O discurso publicitário estava vazio e precisa se repensar. Novos valores vão aflorar e, com eles, formas mais simples e diretas de fazer as mensagens publicitárias chegarem aos consumidores", diz Marcello Serpa, sócio e diretor da AlmapBBDO, agência que conquistou oito Leões este ano em Cannes. Ele considera que experiências do gênero já surgiram entre as campanhas premiadas. "Basta avaliar o trabalho vencedor da agência Leo Burnett de Portugal para a Cruz Vermelha. Eles instalaram em um shopping uma loja para ?vender? doações, como se fosse um produto. É uma tirada simples, mas acontece quando as pessoas estão propícias a se engajarem", explica Serpa. Para ele, a oferta excessiva de seminários glamourosos pelos nomes dos palestrantes, mas vazias de conteúdo, porque ninguém vem a público revelar suas efetivas estratégias, está desgastada. Cannes, para ele, deveria voltar à fórmula que coloca a discussão no artesanato da atividade. Muitos executivos reclamaram, fora do holofote, que os temas dos 53 seminários e 20 workshops quase nada acrescentavam, além de se ver de perto as celebridades, como o presidente da Microsoft, Steve Ballmer, e do Google, Eric Schmidt. A volta aos parâmetros que deram origem ao Festival de Publicidade não significa defender a supremacia das mídias tradicionais - como comerciais para televisão, anúncios de rádio e jornal - ante o inevitável avanço dos canais de comunicação online. Muito pelo contrário, diz o vice-presidente de Criação da Young & Rubicam, Marco Versolato. "Observo hoje que quase todas as peças têm desdobramentos. Podem começar na internet, ou via uma mensagem de texto no celular, e depois migram para outras plataformas. Os consumidores também são chamados a participar. Nunca as campanhas foram tão multicanais como agora", diz Versolato, enquanto aponta para os cartazes e outdoors feitos com dinheiro doado pela população da África do Sul, uma das campanhas premiadas este ano. ENGAJAMENTO Há vários casos que misturam entretenimento e bons resultados, com baixos custos. Um deles envolveu o lançamento de um aparelho celular na China. Resolveram homenagear o praticante de artes marciais Bruce Lee, morto há 35 anos. "Soltaram vídeos na rede como se fossem peças descobertas após a morte do lutador", conta Mario D''Andréa, vice-presidente de Criação da agência JWT. "Eram coisas absurdas, com ele jogando pingue-pongue. Tudo feito com sósia. A ação fez tanto sucesso que mais de 12 milhões viram os vídeos na web. Quando a campanha avisou que o aparelho estaria na loja, mais de 35 mil pessoas fizeram fila para comprar." Engajamento da audiência e vários pontos de contato com os potenciais públicos tornaram a criação das campanhas e a programação de mídia mais complexas. "Para os profissionais de mídia, o aumento da responsabilidade veio com o crescimento do prestígio", considera a jurada brasileira na categoria, Gleidys Salvanha, diretora de Mídia da agência W. Essa área foi uma das que mais premiou soluções multicanais. Quase todos os presidentes de júri defenderam o mesmo ponto de vista ao justificar as peças escolhidas: foram aquelas capazes de mobilizar pessoas em torno de uma grande ideia, seja divertida, social ou política. O engajamento do cidadão anônimo do interior dos EUA que ajudou a eleger Barack Obama impregnou o espírito do negócio da propaganda. Assim como ele usou e abusou das mídias digitais ao mesmo tempo em que não deixou de aplicar as mídias de massa para atingir seus objetivos, a fórmula em cartaz no meio publicitário é a convergência de canais. FRASES Marcello Serpa sócio da AlmapBBDO "O discurso publicitário estava vazio e precisa se repensar" Marco Versolato vice da Young & Rubicam "As campanhas nunca foram tão multicanais como agora" Gleidys Salvanha diretora da W e jurada em Cannes "Aumento da responsabilidade veio com prestígio"

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