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Caos social e a hiperinflação espreitam Argentina

Por Agencia Estado
Atualização:

?Esto se va al diablo? (?isto vai para o diabo?) foi uma das frases mais ouvidas nas ruas da capital argentina neste fim de semana. O sombrio comentário referia-se à livre flutuação do peso em relação ao dólar, evento que debutará nesta segunda-feira, após quase onze anos de um câmbio rígido no qual, desde março de 1991 até o início de janeiro deste ano, um dólar equivalia a um peso. Ao longo de janeiro, o câmbio foi alterado, mas manteve a rigidez, ficando entre US$ 1,00 e 1,40 peso. Nos próximos dias estará em jogo o próprio destino do governo do presidente Eduardo Duhalde. A city financeira portenha e os analistas políticos são unânimes em afirmar que, se o dólar disparar, a situação social ficará incontrolável. ?Despenhadeiro? Neste cenário, a única saída para o governo seria convocar eleições de forma antecipada, o que tampouco é garantia de solução imediata. A contenção da moeda americana dependerá em boa parte do sucesso da missão do ministro da Economia, Jorge Remes Lenicov, que parte nesta segunda-feira para Washinton, onde se reunirá com representantes do FMI. ?É um despenhadeiro à beira do qual teremos que nos equilibrar por um bom tempo?, admite o presidente do Banco Central, Mario Blejer. O governo confessa a contragosto a possibilidade de uma hipotética disparada. Mas a descarta como duradoura e afirma que somente ocorrerá nos primeiros dias, para depois ?normalizar-se? em 1,60 peso. Diversos analistas duvidam e afirmam que a escalada do dólar continuará, como foi registrado no câmbio paralelo nas últimas semanas, quando chegou a 2,30 pesos. Hiperinflação A prestigiada Fundação Capital sustenta que o dólar poderia ser cotado a 3 pesos nos primeiros dias. Em um relatório divulgado neste domingo, a Fundação sustentou que a população desconfia do governo e que por isso tentará ?refugiar-se? na moeda americana. Para evitar este cenário, a instituição sustenta que ?é importantíssimo que a Argentina conte com o apoio financeiro internacional, para que o Banco Central disponha de um estoque forte de intervenção que utilize para estabilizar o valor do dólar?. Sem esse apoio, a Fundação afirma que não lhe parece prudente que o Banco Central perca reservas para manter baixa a cotação do dólar. No entanto, o economista Raúl Cuello é mais pessimista: ?O governo optou pela pior estratégia ao deixar a moeda flutuar em um contexto de um déficit fiscal enorme e sem possibilidades de financiamento interno e externo. O país começou o caminho da hiperinflação?. Dinheiro em espécie Cuello sustenta que a saída para esta crise é ?retornar rapidamente ao regime de conversibilidade, embora com um tipo de câmbio diferente?. Os argentinos que comprarem dólares a partir desta segunda terão que apresentar seu documento de identidade. Os estrangeiros que também desejarem a moeda deverão mostrar seu passaporte, com a data de entrada no país. Somente as casas de câmbio terão permissão para compra e venda da moeda americana, fato que, pela primeira vez em uma década, colocará os bancos de fora deste tipo de operação. Como forma de conter a compra, o governo somente a autorizou mediante dinheiro em espécie, eliminando a possibilidade de cheques ou débito automático. ?Costas largas? Neste domingo, véspera do dia ?D?, Eduardo Amadeo, porta-voz do presidente Eduardo Duhalde, assegurou que o Banco Central conta com as reservas necessárias para conter uma escalada da moeda americana: ?Com dois terços dos fundos que o governo possui compram-se todos os pesos que há no mercado. Quem apostar no dólar precisa saber que terá pela frente alguém com costas largas?. No entanto, Amadeo negou-se a revelar a estratégia que o governo aplicará para conter o dólar: ?Em que tipo de câmbio vamos intervir é um segredo de Estado?. Apesar do segredo, Amadeo revelou que, se o dólar chegar a 2,20 pesos, pode ser que o BC o deixe correr e que, na terça-feira, intervenha com US$ 400 milhões, baixando a cotação para 1,60. Remarcação já começou Amadeo disse que o caminho que o governo tem pela frente ?é complexo, e não existem fórmulas mágicas para sair do desastre deixado pelo ex-ministro da Economia Domingo Cavallo?. O presidente Duhalde convocou as principais lideranças do setor de supermercados para uma reunião nesta segunda-feira na Casa Rosada, na qual o governo pressionará as empresas para evitar uma remarcação de preços. A remarcação já está acontecendo há semanas. Os preços dos alimentos aumentaram entre 10% e 40%. O governo ameaça punir as empresas através da lei de defesa do consumidor. ?O governo agirá com dureza?, prometeu o subsecretário de Comércio Interior, Silvio Peist. O problema é que o Estado argentino, encolhido drásticamente nos governos dos ex-presidentes Carlos Menem (1989-99) e Fernando De la Rúa (1999-2001), não possui mais uma estrutura de fiscalização dos preços. Exportações devem crescer Dentro do governo, no entanto, não se sabe ainda em que proporção a desvalorização da moeda poderá favorecer as exportações. O secretário de Relações Econômicas Internacionais, Martín Redrado, admitiu que não é possível fazer, por enquanto, o cálculo de quão competitivos se tornarão os produtos made in Argentina. No entanto, Redrado considera que o comércio ?deve começar a crescer na última parte deste ano e no ano que vem?. O secretário também sustentou que a relação com o Brasil melhorou com a desvalorização argentina: ?A partir da desvalorização do real começou um clima de lei do olho por olho e dente por dente. Mas com a eliminação da barreira cambial (com o fim da conversibilidade argentina), o intercâmbio comercial poderá aumentar?. Redrado disse que para que os produtos argentinos sejam competitivos no Brasil é necessário ?um forte programa fiscal e apoio internacional?. Leia o especial

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