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Capitalismo e ganância

Por Jay Bookman
Atualização:

O segredo do sucesso do capitalismo é sua capacidade de pegar uma das emoções mais poderosas da humanidade - a ganância - e dominar essa emoção para impulsionar o progresso econômico. Ao buscar cobiçosamente seu próprio interesse, reza teoria, cada um de nós contribui quase acidentalmente para a maior prosperidade de todos. E, em grande parte, é assim que funcionou. A inovação e a disposição de assumir riscos, encorajadas pelo capitalismo, deram a bilhões de pessoas uma qualidade de vida e uma segurança que seriam inimagináveis sem elas. Se existe um sistema melhor e mais produtivo para atender às necessidades físicas da vida humana, nós ainda não o descobrimos. Mas então surge um ano como 2008, em que o capitalismo cambaleou e a segurança de milhões de americanos está ameaçada. Trilhões de dólares de riqueza desapareceram num espaço de tempo notavelmente curto, junto com milhões de empregos. O medo, e não o otimismo, domina a paisagem, e todos, de economistas a cabeleireiros e a membros do Congresso se perguntam o que deu errado e como resolver o problema. Há explicações técnicas, políticas e explicações do senso comum. Há explicações que tentam descer aos detalhes fundamentais e as que oferecem uma análise abrangente. Minha sucinta avaliação? O capitalismo funciona tirando o melhor de nossa ganância; falha quando deixamos a ganância tirar o melhor de nós. E esse é um problema constante e eterno. Nós sempre soubemos que a ganância é perigosa. Recuando no tempo até onde a palavra escrita pode nos levar, toda grande religião, toda grande cultura advertiu contra os perigos da ganância. Num sistema capitalista, o conhecimento da dupla natureza da ganância - seu poder quando é controlada, seu perigo quando não o é - estabelece uma tensão permanente, duradoura. O truque é dar à ganância corda suficiente para colher seus benefícios ao mesmo tempo em que se reduz ao mínimo seus perigos. Nesse sentido, uma economia movida pela ganância é como um submarino nuclear. Ambos são impulsionados por uma fonte de energia potencialmente ilimitada, mas destrutiva, que precisa ser mantida dentro de limites seguros. Mas a ganância, por sua própria natureza, é sedutora. Ela sempre quer mais, um pouco mais, só um pouquinho mais, por favor. E a ganância pode nos convencer a racionalizar as coisas que não podem, ou não devem, ser racionalizadas. Como uma medida de seu poder, por exemplo, a ganância ajudou a transformar uma celebração religiosa do nascimento de um pobre e humilde menininho numa manjedoura num festival de consumo e consumismo. Mas estou divagando. Com o progresso da crise econômica, muita atenção está sendo dada ao fracasso dos controles regulatórios e jurídicos da ganância. Como pode um esquema de pirâmide financeira de US$ 50 bilhões passar despercebido durante anos? Como podem agências de classificação de crédito conferir sua classificação de mais seguro para bônus de alto risco? Como podem financistas de Wall Street receber gratificações de centenas de milhões de dólares sobre lucros que não eram realmente lucros? A resposta curta é que as pessoas que sabem mais começam a não saber mais. Elas se convencem - ou se deixam convencer - de que aliviar um pouco os freios produzirá ainda mais riquezas, que os controles anteriores da ganância são realmente desnecessários e contraproducentes. E, no fim das contas, os controles jurídicos e regulatórios da ganância sempre ficarão sujeitos a manipulações. É por isso que leis e regras são meramente expressões formalizadas das atitudes culturais, morais e éticas, subjacentes e não escritas, ante a ganância. São essas atitudes que mudaram tão profundamente na última geração. Se não for controlada, a ganância sobrepuja qualquer senso de proporção, justeza ou moralidade. Nós achávamos que, como a ganância é boa, a ganância não deve ser restringida. O que descobrimos - de novo - é que quando adequadamente controlada, a ganância é uma servidora eficaz e produtiva. Mas, como patroa, é terrível. *Jay Bookman é vice-editor de primeira página de ?The Atlanta Journal-Constitution?

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