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Cariocas e paulistas levam mais tempo de casa ao trabalho

A mobilidade nos grandes centros é um problema que afeta a todos, ainda que de modo desigual. Sobram carros e faltam soluções 

Por e Paulo Saldaña
Atualização:

 

SÃO PAULO - Já está muito claro que as manifestações de julho não ocorreram por causa de apenas vinte centavos. Mas o fato de a questão da mobilidade ter sido o motivo das revoltas - que tiveram o estopim em São Paulo e ainda pululam pelo País - não é mero acaso. Também não é acaso que os atos tenham se concentrado nas grandes cidades, sobretudo na Região Sudeste.

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O porcentual de pessoas que passam mais de uma hora no trânsito nas regiões metropolitanas da Região Sudeste é praticamente o dobro das outras áreas similares do resto do País. Enquanto 21,3% dos moradores das regiões metropolitanas de São Paulo, Rio e Minas ficam mais de uma hora para chegar ao trabalho, em outras sete aglomerações metropolitanas do País esse porcentual é de 11,5%.

Para chegar a esses e outros índices, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), do governo federal, analisou os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2012.

O estudo divulgado no mês passado reafirma a impressão que sentimos a cada dia: o trânsito, os congestionamentos e as dificuldades de mobilidade atingem praticamente todos os cidadãos, mesmo que de modo desigual. Faltam soluções de tráfego, transporte coletivo de qualidade. Sobram carros e mais carros.

O brasileiro gasta, em média, 30 minutos para chegar ao trabalho, segundo os resultados colhidos pelo Ipea. Mas, se considerarmos apenas as áreas metropolitanas do País, a média sobe para 40 minutos - e, ao olharmos só para as metrópoles do Sudeste, são 43 minutos. Apenas no trajeto de ida.

Um dos responsáveis pelo estudo do Ipea, Carlos Henrique Ribeiro de Carvalho explica que as grandes cidades do Norte e Nordeste foram as que tiveram o maior impacto nos últimos anos, registrando a maior variação de tempo gasto no trânsito. O fenômeno é resultado das altas galopantes nas taxas de motorização na região. "Sobretudo nas classes mais pobres", diz.

O morador da região metropolitana de Belém, por exemplo, demorava 24,3 minutos para chegar ao trabalho em 1992 e em 2012 esse prazo passou para 32,8, um salto de 35,4%. Outra população que sofreu foi a de Salvador, cujo tempo gasto aumentou 27,1%, alcançando média de 39,7 minutos.

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Apesar disso, Rio e São Paulo ainda mantêm os piores resultados em tempo gasto. E a "Cidade Maravilhosa" lidera. O carioca leva em média 47 minutos da sua casa ao trabalho, enquanto o paulista, 45,6 minutos. Em Minas, são 36,6.

O estudo do Ipea não apresenta índices da Grande Vitória, no Espírito Santo, mas dados elaborados pelo Observatório das Metrópoles com base nos dados do Censo de 2010 mostram que o morador de lá demora 36,5 minutos para fazer o trajeto.

O tamanho das populações, das frotas de veículos e a complexidade e desorganização da malha urbana explicam por que a situação do Sudeste é ainda pior. "Áreas como São Paulo se destacam porque as regiões já estão em um nível tão complexo que qualquer alteração no perfil de motorização já tem grande impacto", diz Carvalho, do Ipea.

Menos carro, por favor. Entre as conclusões apontadas pelo Ipea estão a necessidade de grandes investimentos em mobilidade. Mas não seria o bastante, segundo especialistas. O consultor de logística Horácio Augusto Figueira fez um estudo comparando o congestionamento máximo de 23 grandes cidades do País - a maioria na Região Sudeste - com o tamanho da frota de automóveis de cada uma delas.

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"O resultado é um gráfico em linha reta, provando que uma coisa está diretamente ligada à outra", diz ele, que trabalhou com informações do Departamento Nacional de Trânsito. A conclusão de Figueira é que grandes obras viárias não resolvem sozinhas a questão do congestionamento - é preciso reduzir o número de carros.

Ainda de acordo com Figueira, as faixas exclusivas de ônibus, que são alvo de críticas por motoristas de São Paulo, são a melhor saída possível a curto prazo para resolver os congestionamentos. Elas têm potencial de retirar os carros das vias à medida que conseguem transportar muito mais pessoas do que as faixas usadas pelos carros. "O custo para criar as faixas é baixíssimo, e elas podem transportar muito mais gente."

Em um quilômetro de via, 150 carros enfileirados transportam 200 pessoas. Essas mesmas 200 pessoas podem ser levadas por dois ônibus biarticulados, que ocupam esse mesmo quilômetro de via com distância de 500 metros de um para o outro, sem parar em congestionamento e com uma velocidade média bem maior do que a dos carros, explica ele.

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Após as manifestações que forçaram o prefeito Fernando Haddad (PT) a baixar o preço da passagem de ônibus de R$ 3,20 para R$ 3,00, a gestão apostou forte na criação de faixas exclusivas de ônibus. A malha de pistas implantadas neste ano chegou a 256,6 km.

O engenheiro Luiz Célio Bottura, ex-ombudsman da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) de São Paulo, lembra que mesmo eventuais congestionamentos de ônibus são mais "baratos" para as grandes cidades do que o trânsito travado de carros.

"Os custos per capita no transporte coletivo são muito menores, seja em consumo de combustível, seja na manutenção dos veículos, seja na emissão de poluentes", afirma. "E os ônibus precisam de menos gente para cuidar", diz, referindo-se à quantidade de fiscais de trânsito para supervisionar o tráfego de veículos.

"A indústria automobilística recebe uma série de incentivos fiscais para produzir. Então, as cidades ficam lotadas de carros mesmo. Mas ela é a mesma indústria que produz os ônibus. Em termos de crescimento econômico, a queda da produção de carros pode não ser algo negativo", afirma.

"Isso porque o custo de operação do ônibus é muito baixo. Os ônibus podem ser muito bons. O problema deles é o mesmo da escola e do hospital público. Quem reclama dele não tem voz para reclamar." 

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