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CENÁRIOS-Mercado questiona êxito de IOF no longo prazo

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Por Silvio Cascione
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O pedágio imposto pelo governo ao capital estrangeiro fez com que o dólar desse uma trégua nas semanas seguidas de queda frente ao real, mas o mercado ainda faz contas para estimar se a alta desta terça-feira vai durar. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciou na véspera a incidência de IOF sobre investimentos estrangeiros em ações e renda fixa, com alíquota de 2 por cento. A reação inicial fez com que o dólar avançasse mais de 2 por cento, a 1,748 real, mas Mantega afirmou nesta quarta que os efeitos só serão realmente sentidos no longo prazo, e não "em 24 horas". "No começo de 2008, o governo adotou a mesma medida, com êxito bastante limitado. O real se valorizou mesmo com o imposto", afirma Alexandre Schwartsman, economista do banco Santander e ex-diretor do Banco Central, em relatório. Na ocasião, o governo começou a cobrar 1,5 por cento de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) dos investimentos estrangeiros, mas somente em renda fixa. Mesmo assim, o dólar manteve a tendência de baixa e chegou a 1,56 real alguns meses depois. A alíquota foi zerada em outubro, no auge da crise financeira global. A principal diferença, desta vez, é a presença das ações no alvo do IOF. Por isso, a analista Flavia Cattan-Naslausky, da RBS Securities, alerta que "há o risco de o Brasil ver reduzida, ou eliminada, sua participação nos principais índices acionários globais". Ela recomenda um ajuste na carteira de investimentos a favor do peso mexicano, em detrimento do real. "Nessa perspectiva, o real pode ser negociado a um nível mais alto, perto de 1,95 e 2 reais", completou. PRESSÃO EXTERNA DEVE CONTINUAR A maioria dos analistas, no entanto, lembra que o cenário externo contribui para o declínio do dólar. "O ponto principal é que os governos não têm o poder de impedir a apreciação real de suas moedas quando os fundamentos externos trabalham nesse sentido", destaca Paulo Leme, analista do banco de investimento Goldman Sachs, também em relatório. Nathan Blanche, sócio-diretor da Tendências Consultoria, tem avaliação parecida. "Se com a economia fechada os controles cambiais não funcionaram, imagina agora", diz, citando o nível atual de abertura da economia brasileira neste momento da globalização. Entre os principais fatores que contribuem para a queda global do dólar e o fortalecimento de moedas emergentes está o fato que, apesar da melhora dos mercados de crédito após a crise, os incentivos dados pelos governos para vencer a recessão, como os juros baixos, devem continuar em vigor por muitos meses. Com poucas opções de remuneração atrativa para o capital, o Brasil --agora grau de investimento-- tem sido um dos principais destinos. Mesmo bancos locais têm captado recursos no exterior, endividando-se em dólares e aplicando em reais. Isso leva o banco francês BNP Paribas, por exemplo, a manter a aposta na baixa do dólar ante o real. "Ainda prevemos que o dólar cairá abaixo de 1,70 real no quarto trimestre." No ano, apesar da alta nesta sessão, o dólar acumula queda de cerca de 25 por cento. COPA E OLIMPÍADA Independentemente do impacto, porém, a medida deixa o mercado com o pé atrás. "Haverá menos confiança dos investidores na estabilidade das regras", avaliou Roberto Padovani, economista-chefe do banco WestLB do Brasil. Schwartsman, do Santander, levanta também a questão macroeconômica. Segundo ele, a taxação das aplicações na bolsa de valores pode prejudicar os investimentos necessários para manter o crescimento do país. "Na ausência de um forte ajuste fiscal, a poupança externa precisará cumprir seu papel para financiar os investimentos adicionais", comentou, citando o capital necessário para viabilizar a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016. Mauro Leos, vice-presidente de rating soberano da agência Moody's, reitera que ainda é cedo para avaliar o impacto efetivo da medida. "Não sei se isso será eficaz para frear a apreciação do real. (Mas) é apenas uma reação do governo a uma situação da taxa de câmbio que mudou significativamente. Essa é uma situação com a qual o Brasil vai ter de conviver." (Reportagem adicional de Luciana Lopez e José de Castro, em São Paulo, e Ana Nicolaci da Costa, em Brasília)

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