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CGU apura denúncias de pagamento de auxílio emergencial a brasileiros em situação ilegal no exterior

Órgão ainda não tem ideia de quantas pessoas fraudaram o sistema para se inscrever no programa; os identificados terão de devolver os valores

Foto do author Julia Lindner
Por Anne Warth e Julia Lindner
Atualização:

BRASÍLIA - Brasileiros que moram no exterior em situação ilegal encontraram brechas para receber o auxílio-emergencial de R$ 600 mensais. A Controladoria-Geral da União (CGU) está apurando as denúncias, confirmou o órgão ao Estadão/Broadcast, mas ainda não tem ideia da quantidade de pessoas que fraudaram o sistema para se inscrever no programa. Quem for identificado será obrigado a devolver os valores e poderá sofrer sanções civis e penais – não explicitadas pelo órgão, no entanto.

Mais de dez milhões de pessoas enquadradas nos requisitos do auxílio-emergencial ainda aguardam o processamento de seus pedidos. Enquanto isso, entre as fraudes já apuradas, o Estadão revelou que militares – recrutas que prestam serviço obrigatório e pensionistas – receberam o benefício de forma irregular. Já o jornal O Globo mostrou que estudantes universitários, mulheres de empresários, servidores públicos aposentados e seus dependentes também conseguiram obter o benefício.

CGU está apurando as denúncias de possíveis fraudes no recebimento do auxílio. Foto: Pixabay

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O benefício é pago pela União para ajudar trabalhadores informais, microempreendedores individuais (MEI), autônomos e desempregados com renda per capita de até R$ 552 mensais ou renda familiar de até R$ 3.135, o equivalente a três salários mínimos. 

Não têm direito ao auxílio aqueles com emprego formal, que estejam recebendo seguro-desemprego ou benefícios previdenciários ou assistenciais (exceto o Bolsa Família) e que receberam rendimentos tributáveis acima de R$ 28.559.70 em 2018, de acordo com declaração do Imposto de Renda.

A burla ao sistema acontece na base de dados da Receita Federal. Brasileiros que estão em situação regular no exterior – ou seja, que se mudaram para outro país de forma definitiva ou que passaram à condição de não-residente em caráter temporário – são obrigados a fazer a apresentar a Declaração de Saída Definitiva do País ao órgão. 

Quem imigra ilegalmente não presta essa informação ao fisco e, por isso, conta como residente no Brasil, sem emprego formal ou renda. Por causa dessa falha, é identificado como elegível nas operações de cruzamento de informações realizadas pela Dataprev, responsável por dar suporte tecnológico para o Ministério da Cidadania no reconhecimento do direito do auxílio aos cidadãos. “A empresa utiliza as informações constantes nas bases oficiais do governo federal para cruzar os dados e realizar a elegibilidade dos cidadãos, conforme previsto na legislação”, informou a Dataprev.

Redes sociais

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Em comunidades em redes sociais que reúnem brasileiros residentes em outros países, o próprio Itamaraty tem orientado os cidadãos a baixarem o aplicativo do auxílio-emergencial em lojas do Google e da Apple “brasileiras”. Os Consulados do Brasil em Tóquio, Roma e Madri publicaram em suas páginas no Facebook orientações para o recebimento do benefício.

Nos comentários dessas publicações, brasileiros confirmam ter recebido o dinheiro, enquanto alguns cobram consciência e acusam os demais de estarem se apropriando de recursos que deveriam ficar no Brasil. Aqueles com dificuldades em fazer o pedido pelo celular recebem orientações dos demais. A principal dica é fazer a solicitação pelo site do auxílio. Assim, é possível preencher os dados com um celular de um familiar ou amigo que tenha um número nacional.

Em dólares, na cotação em que a moeda fechou ontem, 21, no mercado oficial, R$ 600 equivalem a US$ 107,98. O auxílio equivale a 88,28 libras esterlinas no Reino Unido, a 98,71 euros nos países da União Europeia e a 11.634,67 ienes no Japão.

Fraudes

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À frente das investigações de fraudes dentro do Tribunal de Contas da União (TCU), o ministro Bruno Dantas afirmou que as pessoas que se inscrevem no programa a partir de informações falsas cometem crime de falsidade ideológica e de declaração falsa a órgãos públicos – cuja pena é de reclusão de um a cinco anos e multa, conforme artigo 299 do Código Penal Brasileiro.

“São criminosas e devem ter seus nomes enviados ao Ministério Público para serem processadas”, afirmou. Segundo ele, embora a lei não cite que é preciso morar em território nacional para receber o dinheiro, a interpretação do governo é razoável e válida. “Não faz sentido pagar benefício assistencial para alguém que mora em outro país.”

Segundo o Itamaraty, todos os postos diplomáticos do Brasil no exterior receberam a mesma informação com orientações para os brasileiros sobre auxílio emergencial e podem adaptar o formato do conteúdo. O Ministério de Relações Exteriores também esclarece que apenas faz esclarecimento sobre regras do benefício, mas que o controle sobre a concessão cabe a outros órgãos.

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A Caixa, que realiza os pagamentos, não se pronunciou sobre o caso. O Ministério da Cidadania informou ter firmado parceria com a CGU para acompanhar o processo de pagamentos. “É importante destacar que em breve o nome dos beneficiados com o auxílio emergencial estará no portal da Transparência do Governo Federal”, disse a pasta.

“Assim, havendo recebimento indevido do auxílio por quem prestar declaração falsa ou utilizar qualquer outro meio ilícito para indevidamente ingressar ou se manter como beneficiário do auxílio emergencial, haverá o dever de ressarcimento dos valores recebidos de forma indevida, sem prejuízo das sanções civis e penais cabíveis, nos termos previstos no art. 4º, da Portaria nº 351, de 7 de abril de 2020.”

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A apuração da fraude e a identificação das pessoas tem tudo para ser um desafio, no entanto. A CGU informou que realiza cruzamentos das informações com diversas outras bases utilizadas pelo governo federal e que recebe denúncias pela plataforma integrada de ouvidoria e acesso à informação Fala.BR. Mesmo com esse cruzamento, várias falhas já foram constatadas.

“Nessa ação de monitoramento, há um trabalho de análise de tipologias de denúncias e comunicações de irregularidades vinculadas especificamente à concessão do auxílio emergencial, por meio do qual identificamos que há manifestações que relatam casos de brasileiros que moram no exterior e que apresentaram informações falsas no cadastro para o recebimento do benefício”, disse a CGU.

O objetivo dos trabalhos realizados pela CGU é identificar situações de potencial incompatibilidade com as regras e requisitos definidos para o pagamento do auxílio. O resultado dos cruzamentos é utilizado tanto pela CGU em seus trabalhos investigativos e de acompanhamento, como também é encaminhado aos órgãos competentes, para averiguação e eventuais providências de ajustes e correções.