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Cidades do petróleo têm nova onda de dificuldades

Com pandemia, municípios como Macaé vivem forte redução da atividade econômica

Por Fernanda Nunes
Atualização:

RIO | A Bacia de Campos, área de produção de petróleo que fez do Norte do Rio de Janeiro uma região próspera em arrecadação e emprego, entrou em uma onda de decadência que já se estende por cinco anos e foi reforçada pela pandemia. Nunca antes a Petrobrás se desfez de tantos campos e plataformas como nos últimos dois anos. Em 2020, pela primeira vez, a produção da Bacia de Campos caiu abaixo da marca de 1 milhão de barris por dia. Além disso, a covid-19 permitiu que funcionários que antes davam expediente na região passassem a trabalhar de outros locais.

Prédio da Petrobrás em Macaé, que agora estávazio Foto: WILTON JUNIOR / ESTADÃO

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O efeito dessa confluência de fatores negativos é visível em cidades como Macaé, Campos dos Goytacazes e Rio das Ostras. A proliferação de placas de aluguel e venda de imóveis retrata a crise e revela que o Norte fluminense já não é a uma terra de oportunidades. “Abri um espaço pequeno no centro de Macaé, em 2010, para servir almoços e lanches. Foi muito bom até 2015. Mas, três anos depois, já não estava legal. Com a covid, encerrei o negócio. Agora faço bolo em casa”, conta Manoela Guedes, que chegou a ter 11 funcionários com carteira assinada e, neste ano, dispensou os últimos três.

Em Campos dos Goytacazes, o município mais beneficiado com a arrecadação de royalties nos tempos de prosperidade, o presidente da associação comercial, Leonardo Abreu, diz que ele próprio está sendo afetado pela crise. 

Ainda em 2019, após a Petrobrás esvaziar um prédio no município, seu faturamento caiu 30%. Antes mesmo dos prejuízos da pandemia tomarem proporções maiores, em março, Abreu fechou sua loja de salgados em Macaé. “Se há queda da atividade de petróleo, a mão de obra vai buscar outros lugares. É menos gente para circular e gastar”, afirma Abreu.

Para contornar os desafios, Herbert de Paula, que há 15 anos é dono de três padarias em Macaé, tem apostado na venda de alimentos mais sofisticados e, por isso, mais caros. Ele relata que o número de clientes vem caindo desde 2015. “Isso já estava acontecendo antes da covid-19. Começou com a Lava Jato. Foi um monte de gente embora”, diz.

Uma fotografia da queda do investimento da Petrobrás e dos efeitos na cidade de Macaé é o Edifício Novo Cavaleiros, o último a ser esvaziado pela estatal na cidade. O contrato do aluguel do prédio foi encerrado em 2019. A entrega ocorreria no fim do ano. Veio, então, o coronavírus e todo pessoal foi liberado a trabalhar a distância. Segundo cálculo do Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense (Sindipetro-NF), 1,7 mil trabalhadores ocupavam o prédio.

O prédio é hoje uma estrutura às escuras numa zona nobre da cidade, ocupado por poucos seguranças e cercado por um estacionamento abandonado e um terreno baldio. Na portaria, maquetes de plataformas estão amontoadas num canto. No dia em que a reportagem foi ao local, móveis de escritório que estavam amontoados na calçada diante do edifício foram posteriormente levados por um caminhão de mudança.

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Os efeitos da derrocada da região começaram com a Operação Lava Jato, continuaram com a queda da cotação do petróleo e agora são ampliados pelo programa de desinvestimentos da Petrobrás. Nunca a estatal se desfez de tantas áreas de produção como em 2019 e 2020, diz o professor do Instituto de Economia da UFRJ Iderley Colombini. Foram vendidos integralmente seis campos e parcialmente outros dois. Em 2020, com a pandemia, o pesquisador contabiliza a interrupção da produção em oito plataformas.

Resultado: no acumulado de janeiro a setembro de 2020, a queda da produção de barris de óleo pela Petrobrás foi de 17%, segundo a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP)

A Petrobrás refuta a tese de que reduziu sua presença no Norte fluminense. Por meio de sua assessoria de imprensa, afirmou que “mantém-se em plena atividade” na área, onde atua com um plano de renovação com foco em ativos de maior valor agregado. “Esse plano inclui a instalação de pelo menos três novas unidades na Bacia, nos próximos anos, além de diversos projetos de desenvolvimento para aumento da produção, revitalização e reorganização da malha de escoamento.”

Região fechou 50 mil vagas

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A contração da produção da Bacia de Campos custou 50 mil postos de trabalho, nos últimos cinco anos, a dois municípios do Norte fluminense, Campos dos Goytacazes e Macaé. Os dados são do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho, e fazem parte de pesquisa de Iderley Colombini, professor do Instituto de Economia da UFRJ.

Os efeitos no mercado de trabalho são mais sentidos em Macaé, onde funciona a sede administrativa da Petrobrás e também estão instaladas dezenas de empresas fornecedoras de bens e serviços à estatal. A cidade responde por 80% do saldo entre admissões e dispensas desde 2015.

Uma peculiaridade, no entanto, aconteceu no mercado de trabalho em Macaé, no ano passado. Após cinco anos de perdas, o número de pessoas que conseguiram um emprego superou o de demissões – mas esse efeito não veio da indústria do petróleo. O respiro ocorreu no segmento de serviços de engenharia e arquitetura, que inclui trabalhos como os de assessoria técnica de engenharia.

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Ao mesmo tempo em que foram fechados 358 postos de trabalho em atividades diretas e apoio à extração de petróleo no ano passado, foram criados 1,4 mil em serviços de engenharia e arquitetura. Ainda assim, o total de salários pagos para manter as plataformas funcionando, R$ 21,5 milhões, superou o do segmento em expansão, R$ 13,7 milhões.

“A situação só tem piorado para os petroleiros. A cada ano são condições piores de trabalho e salários menores para os terceirizados”, afirma o presidente do Sindicato dos Petroleiros no Norte Fluminense, Tezeu Bezerra

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