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Cliente da Soletur terá problemas para receber

O pedido de falência da Soletur, na semana passada, somado à concordata das Fazendas Reunidas Boi Gordo S. A., revelou que o amparo do CDC pode ser ineficaz nos dois casos. Ou seja, os clientes devem esperar decisão judicial para poder receber o que pagaram ou investiram. Veja como agir.

Por Agencia Estado
Atualização:

O pedido de falência da Soletur - considerada a maior operadora de turismo no País - deixará os consumidores que contrataram os serviços da empresa em situação complicada. Esta é a avaliação do advogado José Fernando Mandel, presidente da Comissão de Falências e Concordatas da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), seção São Paulo, e um dos autores da nova lei sobre a questão - que tramita no Congresso Nacional há nove anos. Vale lembrar que, logo antes da falência da Soletur, foi registrado o pedido de concordata da Fazendas Reunidas Boi Gordo S. A., cujos investidores permanecem em estado de espera a fim de receber seu dinheiro. Mesmo que tenham contratado advogado, não há muito o que fazer, além de torcer para que a empresa cumpra as exigências do processo: pagamento de 40% de suas dívidas no primeiro ano e 60%, no segundo. Caso isso não aconteça, a falência é decretada e, como no exemplo da Soletur, aumentam ainda mais os riscos de não recebimento dos créditos. Nas duas situações, nem o Código de Defesa do Consumidor (CDC) pode ser aplicado, pois é preciso respeitar as exigências e prazos da ação judicial, seja ela uma concordata ou uma falência. Diferente da concordata, em que todos os credores são tratados da mesma forma, na falência o pagamento das dívidas deve respeitar uma hierarquia a partir dos recursos obtidos. No caso da Soletur, a falência ainda não foi decretada. O processo encontrava-se nas mãos do Ministério Público - órgão fiscalizador - que, ontem, já deu parecer favorável à decretação da falência, além de investigar suspeita de fraude contra a empresa. Agora, é o juiz quem deve decidir ou não pela falência da Soletur. Esta decisão, segundo o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, deve acontecer entre hoje e segunda-feira. E, assim que for decretada a falência pelo juiz, a Soletur não existirá mais. Ou seja, as portas da empresa estarão fechadas. Então, de acordo com José Mandel, forma-se uma nova pessoa jurídica, a chamada massa falida da empresa, administrada por um síndico - geralmente o maior credor da empresa. "E os donos não podem mais entrar, só os síndicos ou serventuários da Justiça." Riscos ao cancelar pagamentos Os clientes que já viajaram e estão pagando as prestações devem esperar a decretação da falência para depositar os valores em uma conta oficial, que será aberta para este fim. Caso não façam isso, o síndico da massa falida verificará os débitos e cobrará os devedores posteriormente. Já para os consumidores que estão pagando em parcelas seu pacote e ainda não viajaram, a recomendação de entidades de defesa do consumidor, da Associação Brasileira das Agências de Viagens (Abav) e de advogados é interromper os pagamentos. Porém, vale lembrar que há o risco de que esses valores não pagos também sejam cobrados. Como a empresa já estava em dificuldade financeira - uma prova disso é o pedido direto de falência, ao invés da concordata -, há grandes chances de que já tenha descontado os cheques e títulos de crédito. José Mandel afirma que, provavelmente, a Soletur já deve ter adiantado o recebimento junto a instituições financeiras, que se tornaram as titulares. Por isso, há o risco de que os clientes tenham o nome enviado ao Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) ou ainda sejam objeto de uma ação de cobrança por estes novos titulares. Arystóbulo de Freitas aconselha o consumidor a, em primeiro lugar, insistir no cumprimento do contrato se a viagem estiver próxima e os vouchers - compromisso de reserva - estiverem em suas mãos. "Ele deve ligar para os hotéis e companhias aéreas e se certificar de que as empresas têm a intenção de cumprir o contrato estabelecido com a Soletur." Do contrário, segundo o advogado, não pode viajar e deve parar de pagar. Também vale ressaltar que os hotéis no exterior podem ter outras regras legais, o que pode complicar ainda mais a negociação. "É fundamental que tudo seja por escrito para formalizar a requisição do consumidor e a resposta da empresa. Senão, ele pode receber uma informação pelo telefone e outra quando chegar lá." Todos os procedimentos devem ser documentados Caso o cliente da Soletur opte por cancelar os pagamentos, é necessário exigir o estorno dos valores das próximas parcelas, se a compra foi feita no cartão de crédito, ou sustar os cheques emitidos. É recomendável que os dois procedimentos também sejam feitos por escrito. "Se há um contrato e o prestador de serviço já recebeu - ou mesmo que não tenha recebido - o consumidor pode exigir que ele cumpra sua parte. Depois, o mesmo prestador de serviço pode entrar na falência para tentar receber." Vale lembrar que, em 99% dos casos de falência, os credores quirografários - fornecedores e clientes que não têm nenhum privilégio de recebimento - não recebem nada. Ou seja, eles estão na mesma situação que os clientes da Soletur - últimos da fila para receber os recursos do processo de falência - e podem se recusar a cumprir com sua parte a fim de evitar um prejuízo ainda maior nas suas contas, caso a operadora não tenha quitado seus débitos com estas empresas. Agora, quem está viajando pela Soletur neste momento já pode estar tendo problemas com hotéis e companhias aéreas. Elas também podem se recusar a prestar o serviço. Porém, Varig, TAM e TAP confirmaram a garantia de embarque dos passageiros que já têm o bilhete em mãos. Os que têm apenas o voucher estão desprotegidos, pois o documento não funciona como garantia para a prestação do serviço, como atesta o advogado José Mandel. Quem pagou tudo ou parte e não viajou pode tentar receber Os clientes da Soletur que saldaram sua dívida com a empresa e ainda não usufruíram do serviço só têm uma forma de tentar receber o que pagaram: entrar no processo de falência, caso seu nome não conste da lista de credores ou haja erro no valor da dívida. Para isso, é necessário contratar advogado e habilitar o crédito. Ou seja, provar exatamente quanto a empresa deve em seu nome. Também é importante ressaltar que na falência os credores quirografários - sem garantia, como clientes e fornecedores - costumam nada receber. Há uma hierarquia de pagamento: créditos trabalhistas; dívidas com o fisco nesta ordem: federais, estaduais e municipais; e, por último, os credores. Na maioria dos casos, de acordo com José Mandel, os recursos são suficientes para pagar até o limite das dívidas tributárias federais. E, quando o dinheiro acaba, ninguém mais recebe. Por isso, antes de contratar um advogado, é necessário estimar os gastos em relação ao crédito e o risco de não ter o dinheiro de volta. Uma alternativa apontada por ele é a representação dos credores por entidades de defesa do consumidor, como Idec e Procon. Já no caso de associações formadas para diminuir as despesas com o processo e honorários advocatícios, é preciso tomar alguns cuidados (veja matéria no link abaixo). Em um processo falimentar, todas as medidas relacionadas à massa falida da empresa devem se dirigir ao juízo em que a falência vem sendo processada. No caso da Soletur, a 8ª Vara de Falências e Concordatas do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Portanto, segundo o advogado José Mandel, não é possível fazer uso do benefício do Juizado Especial Cível. "O juízo da falência é universal. Ou seja, tudo relacionado ao processo deve circular naquele tribunal e todas as pendências, encaminhadas para lá." Ainda segundo ele, este processo da Soletur pode levar no mínimo de três a quatro anos.

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