PUBLICIDADE

COLUNA-Mercado respira aliviado, mas surpresas ainda estão no ar

Por ANGELA BITTENCOURT
Atualização:

O mercado reagiu aqui e lá fora nos últimos dias. A tranquilidade foi restaurada, mas não alegrou ninguém porque há uma suspeita no ar. A turbulência externa pode ser revigorada em data certa e voltar a assombrar bancos centrais, instituições financeiras e investidores. Entre 11 de setembro e 9 de outubro serão divulgados balanços de cinco conglomerados internacionais que toparam de frente com a crise instaurada, há um mês, no mercado imobiliário nos Estados Unidos. Nesse período, Goldman Sachs, Bear Stearns, Morgan Stanley, Lehman Brothers e Citibank apresentam resultados contábeis que devem confirmar perdas impostas pelo crédito hipotecário. Autoridades monetárias brasileiras e gestores de grandes fundos de investimentos miram o calendário e esperam tempo quente, embora prevaleça o consenso de que o Brasil vem resistindo bem ao aumento da volatilidade dos ativos financeiros. Ainda assim, a tensão cresce porque o mercado doméstico identifica mudança de tendência de indicadores relevantes: a inflação sobe e a liquidez, que ainda é ampla, diminui. As pressões "transitórias" que estão puxando os índices de inflação estão durando demais. O salto do IPCA-15 de julho para agosto, como mostrado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) na quinta-feira, confirmou que a inflação brasileira, que estava abaixo do peso, resiste à dieta e avança para o centro da meta de 4,5 por cento. INFLAÇÃO NO GATILHO A sondagem semanal de indicadores feita pelo Banco Central com 100 instituições financeiras, divulgada no relatório Focus, deve corrigir projeções de inflação, inclusive corrente, já nesta segunda-feira. E o mercado financeiro, mesmo aguardando as revisões, poderá elevar as taxas de juros no mercado futuro, até porque aumentam as dúvidas sobre a inflação local e internacional em 2008 e 2009. Sozinha, a turbulência externa, que respingou no Brasil mas sem fazer estrago, alçou a curva de juros em 1 ponto percentual nas últimas semanas. O mercado encerrou a semana passada convencido de que o prognóstico de avanço de 0,25 por cento para o IPCA de agosto, mantido no Focus da segunda-feira passada, foi derrubado pelo índice antecedente --o IPCA-15 que subiu 0,42 por cento. Uma primeira atualização de expectativa foi feita pelo Comitê de Acompanhamento Macroeconômico da Andima que elevou de 0,27 para 0,47 por cento a variação do IPCA de agosto. A confirmação da estimativa da Andima provocará um ajuste expressivo na inflação oficial acumulada em 12 meses, que passará de 3,74 por cento no cálculo até julho para 4,18 por cento --variação mais elevada desde maio de 2006. OFERTA DE MOEDA DIMINUI A sobra de reais nas reservas bancárias, frente ao estoque de títulos federais a ser financiado pelas instituições, ainda é gigantesca mas está cedendo. Em julho, as aplicações feitas pelos bancos diretamente em títulos federais da carteira do BC atingiram inéditos 200 bilhões de reais. A sexta-feira foi encerrada com essas aplicações rondando 180 bilhões de reais, e na manhã de segunda-feira, terão caído a cerca de 152 bilhões de reais. Esta redução acontece porque o BC devolverá aos bancos 28 bilhões de reais ao recomprar títulos vendidos temporariamente ao mercado. A queda na oferta de moeda indica que duas fontes de expansão de reais --resgate de títulos públicos e compra de dólares pelo BC no mercado interno-- estão encolhendo. Neste mês, o Tesouro resgatou 3,7 bilhões de reais em títulos e vendeu 9,5 bilhões de reais até quinta-feira. DÓLAR SOBE E BC VIRA "VILÃO" Também neste mês, a compra de divisa pelo BC caiu ao menor nível do ano, inclusive, porque a autoridade monetária está fora dos negócios há nove dias consecutivos --período em que os investidores internacionais se retraíram em função da crise externa. Em agosto, até o dia 17 --mostram os dados de emissão monetária-- o BC comprou cerca de 2,9 bilhões de dólares ou, em média, 229 milhões de dólares ao dia. Até então, a menor média diária, de 230 milhões de dólares, havia sido registada em janeiro. A valorização do dólar --em alta que chegou a superar 8 por cento no mês há poucos dias-- ativou outro mecanismo que reduz a liquidez: os ajustes dos contratos de swap cambial reverso. Esses contratos, lançados pelo BC na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F), tem o efeito de compra de dólar futuro. Os preços sofrem ajustes diários. Quando a variação do dólar supera a taxa de juro, o mercado transfere dinheiro para o BC. Quando o juro supera a correção cambial, o mercado recebe dinheiro do BC. De janeiro a julho, o juro superou a correção cambial e o BC injetou 5,9 bilhões de reais no mercado. Em 13 dias de negócios em agosto, o mercado entregou 4,2 bilhões de reais ao BC. E a saída de reais do mercado para o BC deve continuar pelo menos até o fim do mês. Esta perspectiva só será alterada caso o dólar desabe frente ao real. Entretanto, desde o início do mês, até a sexta-feira, o dólar subiu em torno de 5 por cento, enquanto o juro do mês inteiro ronda os 0,99 por cento.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.