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Líder de mercado na Oliver Wyman, Ana Carla Abrão trabalhou no setor financeiro a maior parte de sua vida, focada em temas relacionados a controle de riscos, crédito, spread bancário, compliance e varejo, tributação e questões tributárias.

Com as emendas de relator, só o interesse pelo poder e reeleição guiam as escolhas políticas

Agrada-se a alguns, desagrada-se a ninguém, e o País paga a conta pelas péssimas escolhas que os gestores públicos vêm fazendo por nós

Por Ana Carla Abrão
Atualização:

Este ano nos superamos. Dentre os tantos carimbos que marcam os trilhões do nosso Orçamento, são os das emendas parlamentares que hoje merecem os holofotes. Em particular, o RP9, das emendas de relator, que escalaram em valor e em importância. Fiel representação de tudo o que uma boa gestão de recursos públicos abomina, essas emendas teriam chegado a R$ 29 bilhões em 2021 não fosse o excesso de ambição em um Orçamento tão engessado. Ao final, ficaram “apenas” R$ 18,5 bilhões, que vêm se prestando a tudo, menos ao País que lhes financia.

As emendas de relator são uma excrescência que faz emergir o que há de pior nos nossos políticos Foto: Fábio Motta/Estadão

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A Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2021 fixou a despesa da União para o exercício financeiro deste ano em R$ 4,3 trilhões. Desses tantos trilhões, 38% são direcionados para as chamadas despesas obrigatórias. Só os gastos com pessoal e Previdência consomem, respectivamente, R$ 363,6 bilhões e R$ 698,5 bilhões. Se somarmos outros carimbos que levam recursos a destinos predefinidos, sobra relativamente pouco para atender a demandas ilimitadas. Todo ano é a mesma coisa, o processo orçamentário expõe o loteamento de fatias cada vez maiores de recursos públicos para atender cada vez menos brasileiros. Numa queda de braços, o Orçamento mostra seu crescente engessamento e, ao mesmo tempo que diz garantir a provisão de recursos para determinadas áreas – como saúde e educação –, deixa ações relevantes num longínquo e desatendido segundo plano. Agrada-se a alguns, desagrada-se a ninguém, e o País paga a conta pelas péssimas escolhas que os gestores públicos vêm fazendo por nós.

Mas é a distribuição obscura de recursos num varejo disfuncional que mais envergonha. Alimentada na falta de transparência, implode qualquer possibilidade de coordenação na alocação de recursos públicos, dá poder discricionário a uns poucos, gera ineficiências na distribuição dos gastos e incentiva negociações políticas espúrias. Favorece a compra de votos e fomenta a corrupção, assim como foi o mensalão petista. Não há programa, partido, crença ou interesse público a guiar as escolhas. Só poder e reeleição.

As emendas de relator são uma excrescência que faz emergir o que há de pior nos nossos políticos – naqueles que as distribuem e nos que se deixam guiar por elas. Representam nosso esfacelamento institucional ao permitir, também por meio delas, que o Executivo delegue ao Legislativo sua função de governar, enquanto este, embevecido pelo poder que lhe caiu no colo, abandona sua função de legislar em prol de todos. Cabe hoje ao Judiciário – vejam só – intervir para tentar recolocar cada um no seu lugar. 

* ECONOMISTA E SÓCIA DA CONSULTORIA OLIVER WYMAN. O ARTIGO REFLETE EXCLUSIVAMENTE A OPINIÃO DA COLUNISTA

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