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Nem sindicatos 'fortes' conseguem reajustes salariais acima da inflação em 2015

Pela 1ª vez em mais de dez anos, metalúrgicos e petroleiros tiveram só a reposição da inflação, sem ganho real na renda

Por Mário Braga
Atualização:
Foco dos sindicatos agora é manter os empregos Foto: Fabio Motta/Estadão

A recessão da economia e as crises intrínsecas aos setores da atividade em 2015 levaram aos piores resultados de negociações salariais desde 2002, inclusive nas categorias com sindicatos mais fortes. No caso de metalúrgicos e petroleiros, foi a primeira vez em mais de dez anos em que os acordos garantiram apenas a reposição da inflação, sem ganho real na renda. O resultado reflete esforços para evitar demissões em um ambiente que não lembra em nada o de aumentos salariais significativos durante os anos 2000.

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Na década passada, a estabilidade econômica permitiu a sindicalistas garantir até reajustes nominais equivalentes ao dobro da inflação. Foi o caso dos metalúrgicos do Estado de São Paulo em 2009, segundo Luiz Carlos da Silva Dias, presidente da Federação Estadual dos Metalúrgicos (FEM). O ganho real na época foi da ordem de 4,8%. "De 2003 a 2014, o ganho real acumulado está na casa de 35%. O período do governo Lula e o primeiro mandato da presidente Dilma foram muito bons neste aspecto", avalia. Já em 2015, o aumento do salário da categoria ficou em 9,88%, um número alto, mas apenas suficiente para compensar a taxa acumulada pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) no período.

José Maria Rangel, coordenador-geral da Federação Única dos Petroleiros, aponta a crise global do setor de óleo e gás como fator agravante da piora das condições ao negociar com a Petrobrás. "A discussão se pautou mais para buscar alternativas para a empresa sair deste momento difícil", afirmou. Segundo o sindicalista "havia problemas bem maiores" do que ter ganho real de salário. O reajuste dos petroleiros da estatal em 2015 ficou em 9,58%, repondo o IPCA acumulado em 12 meses. A título de comparação com o ganho real nulo de 2015, a categoria já chegou a ter reajustes 3,8% acima da inflação nos últimos dez anos.

Segundo o pesquisador da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), Hélio Zylberstajn, é natural que à medida que a recessão econômica se aprofunde, o foco dos sindicatos migre do aumento da renda para a manutenção do emprego. "Evitar demissões se torna o objetivo preponderante, mesmo que seja às custas de não ter crescimento salarial", resume.

Ao comparar a situação atual com a de 2002, última vez em que FEM e FUP não conseguiram garantir ganho real de salário aos trabalhadores, Zylberstajn ressalta que o ponto em comum é a inflação elevada. "Isso fez com que tanto lá em 2003 como agora, a proporção de reajustes abaixo da inflação fosse muito elevada", disse. Olhando para frente, no entanto, o pesquisador faz um alerta. "No passado, quando a recuperação da economia chegou, o quadro da atividade, que não estava tão ruim, se reverteu rapidamente. Agora, a situação está pior", o que sugere, segundo o especialista, que a reversão das condições de barganha junto aos padrões deve demorar a se concretizar.

O projeto Salariômetro, coordenado por Zylberstajn, revela que entre 2007 e 2014, enquanto o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) variou entre 3% e 8%, os aumentos medianos reais de todas as categorias oscilaram, com poucas exceções, entre 0% e 2%. Os dados mostram ainda que quando a alta de preços rompeu a barreira dos 8%, entre julho e outubro de 2015, os ganhos medianos reais caíram a zero . Após o INPC ultrapassar os 10%, entre novembro de 2015 e fevereiro de 2016, houve perda real de salário.

Quando se observa o reajuste médio em vez do mediano, o Salariômetro sinaliza que a situação é ainda mais crítica. Em julho, a variação do ganho real dos trabalhadores já estava negativa em 2%, chegando a um recuo mais forte que 6% em dezembro. Antes de 2015, apenas em fevereiro de 2009 foi registrada uma perda real de salário na média e, mesmo assim, a média dos reajustes não chegou a ser 2% inferior à inflação do período, voltando ao campo positivo nos meses seguintes.

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Para Fábio José Ferreira da Silva, do Conselho Regional de Economia de Pernambuco, em momentos como o atual, dificilmente uma categoria escapa de condições mais duras nas negociações com patrões. As mais sindicalizadas, no entanto, são as que têm melhores condições de minimizar os efeitos negativos sobre os trabalhadores. "Piora para todo o mundo, mas piora um pouco menos para quem tem sindicatos mais fortes", disse.