Com ‘jabuti’, Eletrobrás coloca estatal do Centrão como gestora de projetos do Parnaíba e Furnas

Codevasf será a encarregada em administrar os recursos das obras; estatal é conhecida pelo uso de verba pública sob indicações políticas e está no centro do esquema do orçamento secreto

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Por Anne Warth
3 min de leitura

BRASÍLIA – O relatório da Medida Provisória (MP) que permite a privatização da Eletrobrás incluiu um jabuti para mudar o responsável pela gestão dos recursos bilionários que serão repassados para o Nordeste e para a recuperação do reservatório de Furnas. Na MP original, o governo havia sugerido a criação de um comitê gestor, mas o relator da medida, deputado Elmar Nascimento (DEM-BA), designou a diretoria da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) para administrar os recursos.

A estatal é conhecida pelo uso de verba pública sob indicações políticas e está no centro do esquema do orçamento secreto revelado pelo Estadão. Conforme mostrou a reportagem, o presidente expandiu e turbinou a estatal loteada pelo Centrão, que poderá aplicar cerca de um terço dos recursos desse orçamento, por imposição dos políticos que a controlam. Com uma história marcada por corrupção e fisiologismo, neste ano a estatal conseguiu um orçamento recorde de R$ 2,73 bilhões.

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Com uma história marcada por corrupção e fisiologismo, neste ano a estatal conseguiu um orçamento recorde de R$ 2,73 bilhões Foto: Wilton Júnior/Estadão

O governo incluiu, na área de atuação da empresa, mil novos municípios, muitos deles localizados a mais de 1.500 quilômetros das águas do São Francisco. Na prática, o governo transformou a “estatal do Centrão” num duto de recursos para atender interesses eleitorais. Originalmente, a área da Codevasf incluía apenas Alagoas, Bahia, um pedaço de Goiás e de Minas, Pernambuco e Sergipe – por onde correm o rio, seus afluentes e subafluentes –, além de Brasília, sede da companhia.

Por decisão de Bolsonaro, a Codevasf também atende agora o Amapá, reduto do senador Davi Alcolumbre (DEM); o Rio Grande do Norte, base do ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho (sem partido), e a Paraíba, do deputado Wellington Roberto, líder do PL na Câmara.

Não por acaso, a empresa se tornou a preferida de deputados e senadores, pela capacidade de executar obras e entregar máquinas aos municípios e Estados mais rapidamente do que o governo. Isso se deve ao fato de, sendo uma estatal, ter regras de contratação mais flexíveis do que um ministério.

Para a gestão dos projetos da Região Norte, o deputado também rejeitou o comitê gestor e designou o Ministério de Minas e Energia. Além disso, incluiu entre os beneficiários da região da Amazônia Legal projetos que visem melhorar as condições de navegabilidade do Rio Madeira.

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A MP da Eletrobrás (MP 1031/2021) está prevista para ser votada na próxima semana na Câmara. Depois, precisa ser apreciado pelo Senado. A MP perde a validade em 22 de junho.

Repasses bilionários

Nascimento incluiu ainda a bacia do Rio Parnaíba entre os beneficiários dos repasses bilionários que a companhia fará após a privatização. “Essa medida deverá preservar essa importante fonte hídrica do Nordeste brasileiro, contribuindo para impedir a degradação de sua Bacia”, diz o parecer do relator.

O texto enviado pelo governo incluiu compensações previstas no texto para políticas públicas de apoio às regiões Norte, Nordeste e Sudeste, como a revitalização da Bacia do São Francisco. Ao todo, o texto prevê pagamento de R$ 8,75 bilhões distribuídos ao longo de dez anos.

Nascimento também ampliou os benefícios ao Nordeste ao retirar da MP o trecho que permitia descontar do montante a ser destinado ao Rio São Francisco o valor econômico da energia que será disponibilizada ao Projeto de Integração do Rio São Francisco com as Bacias do Nordeste Setentrional (PISF).

O parecer ainda abriu possibilidade de aumentar os repasses bilionários para as regiões após o período de dez anos. Ele estabelece que uma parte dos resultados financeiros da estatal que será criada para gerir Itaipu e Eletronuclear, que não poderão ser privatizadas, sustente esses programas no futuro.

Os recursos deverão vir do valor adicionado dos novos contratos de Itaipu após a quitação do empréstimo para sua construção, que se encerra em 2023. Segundo o parecer, esses recursos deverão ser repassados à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) nos primeiros dez anos. Depois, dois terços irão para a CDE e um terço para os projetos do Norte, Nordeste e Sudeste.

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