Um capítulo crucial da história da União Europeia será escrito neste domingo pelo povo que forjou as bases da cultura do Ocidente. E a história será traçada numa eleição em que paira um incógnita: se Bruxelas expulsará ou não a Grécia da zona do euro.Fora a grande dúvida, há duas certezas: a primeira é que, seja com Antonis Samaras ou Alexis Tsipras, haverá um governo de coalizão com a maioria no Parlamento; a segunda, de que, qualquer que seja o governo, os europeus terão de renegociar o programa de resgate aprovado em fevereiro, que concedeu ao país € 130 bilhões em empréstimos, porque suas metas já se tornaram anacrônicas.A incerteza sobre a permanência do país na zona do euro é o que mais desestabiliza os mercados financeiros há dois anos e meio. Desde dezembro de 2009, com a descoberta de um déficit equivalente a 14% do Produto Interno Bruto (PIB) no orçamento grego, a Europa tenta socorrer o país injetando recursos e exigindo medidas de austeridade. Apesar dos acordos, a crise não parou de se aprofundar. Isso porque as sucessivas políticas de rigor impostas por Bruxelas e pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) levarão o país a uma depressão de 20% do PIB em cinco anos ao fim de 2012. No intervalo dos 12 últimos meses, o desemprego aumentou 57%, chegando a 22,4% em maio passado. Entre jovens de 18 a 25 anos, 65% não têm trabalho.Enquanto Samaras fala em renegociar o acordo com a Europa, Tsipras promete romper com políticas de rigor como a que resultou no corte do salário mínimo de 700 para 480. Além disso, ignora as ameaças de expulsão da zona do euro. "O euro não é um fetiche", disse na quinta-feira, ao afirmar que não quer manter a divisa a qualquer custo.Entre membros de seu comitê de campanha em Atenas, o Estado apurou que essa postura é apenas retórica. O Syriza aposta que a UE não romperá o cordão umbilical que a prende à Grécia por uma razão pragmática: a expulsão custaria muito mais caro a Bruxelas. Convicto disso, Tsipras sinaliza nos bastidores que, em lugar de romper o acordo de fevereiro, pode apenas renegociar algumas cláusulas, obtendo o alongamento dos prazos de reembolso, reduzindo os juros, diminuindo o rigor e incluindo uma política de estímulo ao crescimento no pacote."A saída da Grécia do euro não acontecerá porque pelo menos oito países teriam o mesmo destino", diz o deputado Nikos Voutsis, um dos coordenadores do Syriza. "Por isso, o Syriza propõe uma solução europeia, com um novo acordo sobre o pagamento das dívidas e um programa de investimento no modelo do Plano Marshall. Haverá negociação, e sem o FMI. Esteja certo."Por mais temerária que pareça a aposta, economistas ouvidos pelo Estado concordam que a renegociação será inevitável. Shahin Vallée, pesquisador do Instituto Bruegel, de Bruxelas, acredita que a UE será obrigada a renegociar, mesmo que Tsipras seja eleito. Isso porque a saída da Grécia do euro seria recebida pelos mercados financeiros como o fracasso da moeda única. Panayotis Genimatas, presidente de honra do Banco Europeu de Investimentos (BEI), vai mais longe e entende que, mesmo em caso de vitória de Samaras, os acordos terão de ser revistos.O maior risco é de que a rediscussão demore demais e a Grécia mergulhe numa crise de liquidez. Essa hipótese é plausível porque a cada dia os bancos da Grécia estariam perdendo 800 milhões em depósitos.Em meio a tanta instabilidade, o único sinal positivo é a garantia de que, desta vez, haverá um governo de coalizão, ao contrário da eleição fracassada de 6 de maio. Ao Estado, líderes políticos confirmaram que, seja com Samaras ou Tsipras, um governo terá o apoio da maioria no Parlamento. "Haverá uma coalizão, é certo, porque nós participaremos com qualquer um dos vencedores", garante Dimitris Chatzisokratis, responsável pela política econômica do Partido da Esquerda Democrática (ED), que faz parte da coalizão Syriza.