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Como o Brasil está superando a instabilidade

O cenário básico para a economia brasileira em 2001 é favorável. Os principais riscos vêm do cenário internacional - em especial, da Argentina e dos Estados Unidos. Veja a análise do economista-chefe do JP Morgan, Marcelo Carvalho.

Por Agencia Estado
Atualização:

O Brasil é hoje mais resistente a turbulências externas, mas não imune. Se as condições externas permitirem, a economia brasileira crescerá a um ritmo razoável no ano que vem, cerca de 4%. Mantido o compromisso do governo com o ajuste fiscal, as metas acertadas com o Fundo Monetário Internacional (FMI) devem ser atingidas, e a dívida pública se estabiliza como proporção do PIB. A inflação deve continuar sob controle, suficientemente próxima das metas de 6% este ano e de 4% para 2001. A taxa de juro real hoje ainda é muito elevada, principalmente com a inflação em queda. Isso significa que o Banco Central (BC) deveria aproveitar as oportunidades para - de forma prudente, mas determinada - reduzir o juro nominal ao longo do ano que vem, talvez para algo perto de 14% em média em 2001. No campo doméstico, as coisas vão bem. É no cenário externo que a situação complica. Principais riscos? A situação da Argentina e o desaquecimento da economia norte-americana. Na Argentina, o pacote com o FMI ganha algum tempo. O acordo é condição necessária - mas não suficiente - para colocar a economia argentina nos trilhos. Para tanto, é preciso que o nosso vizinho consiga retomar o rumo do crescimento sustentado. Não será fácil. Com seu regime de câmbio fixo, a Argentina tem poucos instrumentos domésticos de política macroeconômica, o que a deixa à mercê das condições externas. Um eventual colapso na Argentina - quer dizer, alguma combinação de desvalorização cambial, calote na dívida, ou ambos - seguramente respingaria no Brasil. O impacto aqui certamente seria negativo, ainda que temporário. A outra principal fonte de preocupação no cenário externo, até mais importante do que a Argentina, é a desaceleração do crescimento global, principalmente nos Estados Unidos. Já há sinais claros de desaquecimento da economia americana. A grande dúvida hoje é se esse será um pouso suave ou uma aterrissagem forçada. E as perspectivas para a Europa e a Ásia não são propriamente espetaculares. Veja como o cenário externo afeta o Brasil Em um cenário global mais conturbado, uma questão chave para o Brasil é como fica o investimento direto. Hoje, esse tipo de fluxo de capital financia plenamente o buraco das contas externas, o chamado déficit em conta corrente. Para o ano que vem, depois de frustrar todas as expectativas em 2000, a balança comercial não promete grandes avanços. Isto é, o Brasil deverá continuar apresentando um déficit externo considerável no ano que vem, cerca de 4% do PIB. E é muito provável que o fluxo de investimento direto caia em 2001. A dúvida é quanto. As turbulências externas, de um jeito ou de outro, batem no câmbio. Como o Banco Central reagiria a pressões sobre o real? Em primeiro lugar, ele deixaria o câmbio se ajustar. Afinal, é exatamente para isso que existe o regime de câmbio flutuante, para funcionar como um colchão que ajude a absorver choques externos. Felizmente, o impacto do câmbio sobre a inflação até agora tem sido bastante modesto. Isso permite ao Banco Central deixar o câmbio escorregar sem precisar reagir imediatamente. Claro, se a desvalorização cambial for tamanha a ponto de ameaçar as metas de inflação, a situação será outra. Nesse caso, o Banco Central reagiria, oferecendo mais títulos públicos vinculados ao dólar, vendendo reservas diretamente no mercado de câmbio e - finalmente, se necessário - elevando juros. Uma eventual combinação de pressão sobre o câmbio e aumento de juros teria impactos fiscais negativos. Essa piora fiscal poderia colocar em questionamento a trajetória das contas públicas. Para evitar preocupações com a dinâmica da dívida pública, é possível que o governo tenha então de anunciar novas medidas de ajuste fiscal. Por sua vez, a conjunção de apertos monetário e fiscal reduziria as perspectivas de crescimento econômico. Dependendo da intensidade e da duração da crise, o PIB cresceria não mais 4%, mas sim, digamos, 2%. Em um cenário mais difícil, surgiria uma questão interessante: como fica a sucessão presidencial de 2002? Em resumo, o Brasil tem hoje uma nau reforçada e bons timoneiros. Mas, nos oceanos globais do ano que vem, o mar não está para peixe. Assumindo que as águas turbulentas não virem maremoto, o Brasil será capaz de singrar relativamente bem por esses mares nunca navegados. Se a tanto ajudar o engenho e a arte.

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