O anúncio, feito na manhã desta segunda-feira, 6, de que a Smiles fechou acordo com a Gol para a compra antecipada de R$ 1,2 bilhão em passagens aéreas acirrou a disputa entre os acionistas da empresa de programa de fidelidade. Sócios minoritários da Smiles vão entrar com um pedido de liminar na Justiça para barrar a operação. Eles já estavam insatisfeitos com os controladores da empresa - a Gol, que detém 52% de participação - desde o início da pandemia.
Segundo os advogados Cesar Augusto Fagundes Verch e Márcio Louzada Carpena - sócios do Carpena Advogados, que representam três fundos de investimentos que, juntos, têm 4% das ações da Smiles -, as operações de compra antecipada de passagens “não estão sendo realizadas pelo interesse da companhia, mas da sua controladora”.
Em março, pouco antes de a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarar a pandemia do coronavírus, a Smiles já havia realizado duas operações de compra antecipada de passagens que totalizaram R$ 425 milhões. Para os minoritários, essas operações, semelhantes a empréstimos, foram feitas com uma taxa de juros inferior ao que a Gol conseguiria no mercado.
Os minoritários alegam ainda que, em março deste ano, a Smiles já tinha um saldo de R$ 700 milhões com a Gol. Isso significaria que não haveria necessidade de comprar mais passagens antecipadas.
Nesta segunda, os minoritários protocolaram o pedido de realização de uma assembleia extraordinária para discutir o assunto. Poucos minutos depois, a Smiles emitiu fato relevante em que anunciou a compra de mais R$ 1,2 bilhão em passagens antecipadas.
“Estamos colocando que essa operação é afrontosa. Imagina que sou minoritário e estou emprestando para a Gol a uma taxa de 115% do CDI (Certificado de Depósito Interbancário) sem garantia nenhuma. Comprando passagem, em meio à pandemia, que nem sei se vai ser voada”, disse o advogado Márcio Louzada Carpena.
Em um indicativo de que o mercado não recebeu bem a operação, as ações da Smiles caíram 2,39% nesta segunda, enquanto o Ibovespa (principal índice da B3) subiu 2,24%.
Para Renato Mimica, sócio do BTG Pactual e diretor de investimentos da Exame Research, no entanto, a compra antecipada de passagens pode ajudar o investidor da Smiles. “A Gol é uma fonte de valor para a Smiles. Para o investidor da Smiles, o essencial agora é que a Gol sobreviva”, diz. Em relatório, o Bradesco BBI considerou que os termos do acordo são favoráveis para a Smiles, pois garantem à empresa acesso a bilhetes mais baratas até junho de 2023.
De acordo com a Smiles, porém, a operação de adiantamento de compra realizada nesta segunda “segue à risca os estatutos da companhia e tem como principal objetivo assegurar as condições de competitividade no longo prazo do ecossistema formado pelas duas empresas e fazendo com que elas estejam mais bem preparadas para o momento de retomada pós-pandemia”. Em nota, a empresa informou ainda que a operação favorecerá os clientes pelos próximos três anos, “gerando valor no longo prazo para todos os acionistas da companhia".
O comitê independente da Smiles recomendou a operação e, em relatório, afirmou que a venda antecipada fortaleceria a principal parceira comercial e operacional da empresa “em um momento ímpar de instabilidade e incerteza”. “Revigorando a GLA (Gol Linhas Aéreas), a Smiles também se beneficia e se torna mais competitiva para a retomada do mercado brasileiro no pós-crise.”
Essa não é a primeira vez que a Smiles realiza uma operação semelhante em momento de crise acentuada da Gol. Em 2015 e 2016, quando a companhia aérea atravessava um de seus piores desequilíbrio financeiros, a Smiles também a ajudou comprando passagens antecipadamente.
Procurada, a Gol não se manifestou até a publicação da reportagem.