Olhando retrospectivamente, é possível detectar as digitais do grupo de “conselheiros” do presidente Jair Bolsonaro em diversas medidas que o ministro da Economia, Paulo Guedes, teve de “agasalhar”. Uma delas foi a decisão de subsidiar o gás de cozinha e o óleo diesel, em troca do aumento dos tributos pagos pelos bancos.
Outra foi o atraso no envio da reforma administrativa ao Congresso, inicialmente previsto para o fim de 2019, sob a alegação de que o “timing político” era inadequado. Depois, quando a proposta foi finalmente enviada ao Legislativo em setembro do ano passado, integrantes do grupo agiram para excluir os atuais servidores da proposta oficial.
Também é possível identificar as suas digitais no Plano Pró-Brasil, elaborado com o aval de Bolsonaro pelo ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, chamado de “fura-teto” por Guedes, por defender a flexibilização do limite de gastos. No fim, o plano não foi implementado, mas gerou muita confusão na praça e escancarou a oposição feroz enfrentada por Guedes dentro do próprio governo.
O mesmo aconteceu com as demissões dos presidentes da Petrobras, Roberto Castello Branco, e do Banco do Brasil, André Brandão. O primeiro, indicado por Guedes, apesar de a empresa ser ligada ao Ministério das Minas e Energia, por defender uma política de preços para os combustíveis com base nas variações de mercado. O segundo, diretamente ligado a Guedes, por propor o fechamento de agências deficitárias da instituição.
Adversidades
De certa forma, é natural que o presidente discuta os principais assuntos da República com o grupo que lhe é mais próximo. O problema é que Bolsonaro, talvez mais do que os seus antecessores no Planalto, parece ser mais suscetível a tudo o que lhe chega aos ouvidos. Além disso, nem ele nem seus interlocutores mais frequentes compartilham com Guedes uma visão liberal da economia, ainda que, em público, muitas vezes, procurem demonstrar o contrário.
É certo também que, em Brasília, não é de hoje que o ministro da Economia (ou da Fazenda, até 2018), por ter a chave do cofre, torna-se alvo do “fogo amigo”. Foi assim no governo Lula, quando a então ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, atracou-se com Antonio Palocci, seu colega da Fazenda, por causa de seu programa fiscal.
Foi assim, também, no governo FHC, quando o então ministro do Planejamento, José Serra, torpedeava o ministro da Fazenda, Pedro Malan, por sua política fiscal austera, e até no governo militar, quando o então ministro da Agricultura, Antônio Delfim Netto, se estranhava com o seu colega da Fazenda, Mário Henrique Simonsen, por não liberar recursos para a pasta. A diferença, agora, é que o próprio Bolsonaro “põe pilha” nos ataques de seus colaboradores mais próximos à política econômica – e ainda faz isso publicamente, sem qualquer embaraço.
Diante das adversidades, porém, Guedes está mostrando que prefere contemporizar, para fazer o que for possível no governo, em vez de se manter fiel às suas ideias e convicções fora do ministério.