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Covid-19 acende debate sobre taxação de grandes fortunas

Aumento do patrimônio de mais ricos na pandemia amplia pressão para alíquotas mais altas para milionários na reforma tributária

Foto do author Adriana Fernandes
Por Adriana Fernandes e Camila Turtelli
Atualização:

BRASÍLIA - A crise gerada pela covid-19 acendeu o debate no Brasil sobre a necessidade de aumentar os impostos do “andar de cima” junto com a proposta de reforma tributária em tramitação no Congresso. A divulgação na semana passada de uma lista de 42 brasileiros que aumentaram sua fortuna em US$ 34 bilhões, mesmo durante a pandemia, fez crescer a pressão para que a reforma tire do papel o imposto sobre grandes fortunas e eleve o Imposto de Renda dos super-ricos para diminuir a desigualdade social no País.

A corrente que cresce no Congresso é de que a reforma tributária tem de ser mais ampla do que apenas a simplificação de impostos para ajudar a reconstruir o País na fase pós-pandemia. Proposta encabeçada pela Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital (Fenafisco), junto com acadêmicos e um grupo de entidades ligadas aos Fiscos, aponta um potencial de arrecadação de R$ 40 bilhões por ano somente com o imposto sobre grandes fortunas. 

Deputado Hercílio Coelho Diniz: “Temos de mudar nossa base tributária, migrar do consumo para patrimônio e renda” Foto: Agência Câmara

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O imposto passaria ser a cobrado das pessoas com patrimônio a partir de R$ 10 milhões com alíquotas progressivas: de 0,5% (R$ 10 milhões a R$ 40 milhões); 1% (R$ 40 milhões a R$ 80 milhões) e 1,5% (acima de R$ 80 milhões). “Somos um dos campeões mundiais de desigualdade e concentração de renda. Precisamos utilizar também esse imposto”, defende Charles Alcântara, presidente da Fenafisco.

A Constituição de 1988 previu a instituição de um imposto sobre grandes fortunas no Brasil. Até hoje, no entanto, a medida depende da aprovação de um projeto de lei complementar que determine como será feita essa taxação. O imposto sobre grandes fortunas é o único dos sete tributos previstos na Constituição que ainda não foi implementado. 

Outras propostas

Entre os projetos que tramitam no Congresso Nacional para regulamentar o imposto sobre grandes fortunas está o do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Apresentada em 1989 – quando ainda era senador –, a proposta chegou a ser aprovada no Senado no mesmo ano, mas ficou travada na Câmara.

Para Dão Real, especialista do Instituto Justiça Fiscal, a aplicação do imposto sobre grandes fortunas em vários países no passado, mesmo que desativado depois da crise financeira de 2008, cumpriu a sua finalidade de reduzir desigualdade social em outras nações. Dão lembra que, com a pandemia, países europeus retomaram o debate para a volta desse tributo. 

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Senador Oriovisto Guimarães: “Não tenho restrição a nenhum imposto isoladamente dentro de uma ampla reforma tributária” Foto: Dida Sampaio/Estadão

Os defensores de uma reforma mais ampla viram com os bons olhos a declaração do relator da reforma, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), de que vai trabalhar para a “justiça tributária”. 

A expectativa é de que o relator possa avançar em mudanças nas alíquotas do IR da pessoa física e a volta da tributação de lucros e dividendos, proposta que está sendo elaborada também pela equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes. Um das ideias em estudo é criar uma alíquota de 35% para os contribuintes com renda mais alta – integrantes da equipe econômica falam em remunerações que superem a marca de R$ 40 mil por mês. A Fenafisco defende uma alíquota ainda maior, de 45%. 

No Congresso, milionários divergem

No Congresso, quase metade dos deputados declarou nas eleições de 2018 ter patrimônio superior a R$ 1 milhão, enquanto no Senado esse patamar chega a quase 66%. Isso quer dizer que muitos parlamentares podem ter de votar para ampliar os próprios tributos. 

O deputado Hercílio Coelho Diniz (MDB-MG), com patrimônio de R$ 38 milhões, segundo declaração à Justiça Eleitoral, é a favor de taxar os “super-ricos”. “Temos de mudar nossa base tributária, migrar do consumo para patrimônio e renda”, afirmou o dono de uma rede de supermercados na região do Vale do Aço, em Minas Gerais. 

Deputado Alexis Fonteyne: “A simples redistribuição de riqueza não resolve a causa da pobreza” 

Já seu colega, o deputado Alexis Fonteyne (Novo-SP) – R$ 28 milhões em bens – tem opinião contrária. Para ele, que atua no ramo de pisos e revestimentos industriais, a taxação sobre grandes fortunas não é eficiente. “Se mostrou absolutamente inócuo no mundo todo”, disse. “A simples redistribuição de riqueza não resolve a causa da pobreza”, afirmou.

Com patrimônio de R$ 238 milhões, o senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), empresário que fundou o Grupo Positivo, disse estar aberto ao debate. “Não tenho restrição a nenhum imposto isoladamente. Penso que só devemos criar ou modificar alíquotas de impostos já existentes dentro de uma ampla reforma tributária.” 

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