A falta de autonomia das agências reguladoras, seja financeira ou decisória, está entre os fatores que minam a competitividade brasileira e influenciam na decisão de investimento das empresas. No último Índice de Competitividade Mundial 2014, elaborado pelo International Institute for Management Development (IMD) e pela Fundação Dom Cabral, os pilares relacionados à regulação ocupavam os últimos lugares, 58.º e 59.º lugar, entre 60 países. Para especialistas, em parte, essa posição é resultado do desvirtuamento do papel das agências reguladoras nos últimos anos. "Ninguém tem dúvida de que a existência dos órgãos reguladores é imprescindível no mundo dos negócios. Mas eles têm de voltar à sua essência original, que era regular o mercado com independência, sem ingerência política", afirma o advogado Tiago Lobão, do escritório Leite, Tosto e Barros.
As agências foram criadas na década de 90, após o programa de privatização das estatais do governo Fernando Henrique Cardoso. Inspiradas no modelo americano, elas surgiram para regular os serviços públicos (como energia, telefonia, água e saneamento) e fazer a conciliação entre governo, empresas e consumidor. Cabe a elas fiscalizar e punir as empresas que não obedecem às regras definidas.
O problema é que, nos últimos anos, elas passaram a sofrer uma forte intervenção por parte do governo federal. "Por lei, elas são independentes do Poder Executivo e deveriam ser órgãos técnicos", afirma o presidente da Comissão de Estudos de Regulação do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp), Pedro Dutra. Na avaliação dele, hoje as agências viraram órgãos da administração pública e fazem o que os ministérios e a Presidência determina.
Um dos casos mais emblemáticos, na opinião dos advogados, é o represamento das tarifas de energia. Para cobrir o rombo das distribuidoras, que ficaram sem contratos para atender 100% de seu mercado depois que o governo criou a MP 579 (renovação das concessões), pegou-se empréstimo no mercado e o valor será repassado para o consumidor em parcelas a partir do ano que vem. "A partir do momento que deixa fatores externos interferir numa atividade, a agência está defendendo o interesse de alguém", diz Tiago Lobão. Nesse caso, diz ele, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) também sofreu um intervenção.
Finanças.
Um ponto crítico que asfixia as agências reguladoras é a falta de independência financeira. No ano passado, o contingenciamento de verbas para os órgãos reguladores somou R$ 7 bilhões nas dez agências do País, segundo dados da ONG Contas Abertas. No fim, elas tiveram R$ 3,9 bilhões disponíveis, mas só conseguiram empenhar 88% do montante. A verba mais curta tem impacto direto numa das principais atividades das agências reguladoras: a fiscalização.
Junta-se aí os quadros incompletos que prejudicam as decisões das agências. Pelas recomendações da OCDE e do Banco Mundial, além da independência nas decisões, as agências devem ter um órgão colegiado com cinco diretores escolhidos pelo presidente da República e chancelados pelo Congresso. Hoje, em duas importantes agências o quadro está incompleto. A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e Agência Nacional de Água (ANA) estão com quatro diretores. Na Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), a lei define apenas três diretores.
O professor de economia da FGV-SP, Arthur Barrionuevo, ex-conselheiro do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), defende a aprovação de uma lei geral das agências. Para ele, o Congresso precisa ter uma participação mais efetiva no controle dos reguladores. "Os nomes indicados pela presidência sempre são aceitos pelo Congresso. Raramente há divergência. Quando isso ocorre é apenas uma forma de confrontar o governo. As agências precisam prestar mais contas ao Congresso."
A falta de independência e as constantes interferências do executivo nas agências acabam atrapalhando o ambiente regulatório e, consequentemente, afetam os investimentos. "Além disso, os projetos demoram a sair e quando saem têm problemas técnicos e são paralisados pelo TCU (Tribunal de Contas da União)", afirma o advogado Rafael Adler, do escritório Azevedo Sette.