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Crescer com menos inflação

Por Alberto Tamer
Atualização:

Há incertezas sobre a inflação nos próximos meses e como agir para administrá-las sem desacelerar de forma excessiva o crescimento. No momento, ambos, inflação e PIB, evoluem a passos insustentáveis. A questão é saber como harmonizá-los. Mais política monetária, mais juros e redução da liquidez, ou mais política fiscal? E como enfrentar o dilema de juros altos atraindo investimentos financeiros e desvalorizando o dólar, que ajuda a conter a inflação com importações a preços menores, mas desestimula as exportações de produtos industriais? Não seria preciso Shakespeare para dizer: "Eis é a questão". Ao contrário de Hamlet, não estamos diante de uma crise existencial, embora muitos economistas digam que sim. O que o País enfrenta é o desafio de escolher estratégias já desenhadas nos últimos dois meses do novo governo.O Copom foi muito realista na ata da última reunião. Há incertezas, sim, mas poderíamos dizer, previsíveis. Pode parecer contradição, mas não é. É possível prever um cenário de incerteza nos próximos meses, mas ao mesmo tempo, identificar e se preparar para seguir caminhos e soluções alternativas.Um dos méritos da ata do Copom foi ser mais clara que as anteriores ao desenhar cenários e indicar caminhos. Não há entrelinhas para ler. O cenário da inflação não é favorável, há fatores que continuam pressionando os preços, como os descasamentos entre a expansão da demanda e a oferta, a alta das commodities. Mas não são fatores necessariamente duradouros. E as surpresas que podem vir de fora? São previsíveis e há medidas prontas para enfrentá-las.Apesar das incertezas externas, os sinais são de desaceleração da inflação no país, no último trimestre do ano. É o resultado das medidas monetárias já adotadas - pode ser que seja preciso mais, admite o Banco Central. Sinais de desaquecimento. A equipe econômica do governo já identifica uma desaceleração do crescimento. Já se fala, em Brasília, em 3,5% para este ano ante os 4,5% da última previsão. Se 7,5% do ano passado era muito, insustentáveis, 3,5% é pouco. Entre os economistas do governo ou não, é quase unânime que o potencial é em torno de 5%. Há que se considerar o freio dos preços menor dos produtos importados sobre a inflação e a entrada de uma safra generosa, que, de uma forma ou de outra, deve conter a alta dos alimentos. Mais ainda, já se registra uma retração da expectativa dos consumidores em consequência da renda corroída pela inflação. Não há sinais de que os aumentos salarias, este ano, compensem essa perda. Os dados atuais mostram que as vendas no varejo estão crescendo menos.É perigoso. Reações e críticas surgiram neste fim de semana. O governo e o BC estão correndo riscos imprudentes. Há o efeito inflacionário dos R$ 55 bilhões repassados para o BNDES, e até quando se pode usar a desvalorização do dólar para conter a inflação sem danificar ainda mais a indústria? E dá para confiar mesmo nos resultados do ajuste fiscal? Que confusão! Nesse cenário de incertezas em que uns querem mais rigor contra a inflação e crescimento menor, e outros procuram o meio caminho, só uma coisa parecia clara, depois da ata do Copom, no fim de semana. Os desafios foram bem identificados pela equipe econômica e o BC, as medidas alternativas já foram analisadas e estão prontas para serem executadas. E estão agindo. O BC indica que pode voltar a agir sobre a liquidez, o governo inicia a execução de um ajuste de gastos. Dá para confiar? Por enquanto, sim. Por exemplo, a presidente já disse que essa questão dos caças fica para depois. Não há clima para despender R$ 15 bilhões nessa compra quando se corta o Orçamento. Seria uma incoerência, disse ela aos ministros. Negou também pedidos de gastos de governadores do Nordeste - que a elegeram - e não aceitou a proposta de aumentar ou criar impostos e segurou um salário mínimo considerado inflacionário. São medidas e atos que revelam uma política comum. São medidas e atos que revelam uma política comum entre BC e governo, para o país continuar crescendo menos com menos inflação.

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