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Economista e sócio da MB Associados

Opinião|Crise e ajustes nas empresas (2)

Atualização:

No último artigo iniciei uma discussão a respeito dos diferentes tipos de resposta das empresas em situações de crise econômica. Mencionei o ajuste defensivo, por redução de custos, e o ajuste via consolidação e ganhos de escala. Neste caso, a consolidação pode, desde que as sinergias entre empresas possam mesmo ser capturadas, levar a ganhos importantes em prazos relativamente curtos. Daí para a frente, a continuidade de resultados passa a depender da evolução dos próprios mercados. Mencionei também, os ajustes pela diferenciação de produtos, com o exemplo da produção orgânica. Incluo nesse grupo de ajustes a busca de nichos.Um bom exemplo de aproveitamento desses espaços específicos de mercado é o que aconteceu com a Fernando Maluhy, empresa que cria com designers, coleções especiais de estampas e, a partir daí, comanda a cadeia de tecidos de alta qualidade, indo do algodão até a distribuição no atacado e varejo de produtos estampados. Embora trabalhe com tecidos para linha infantil, juvenil e outras, a empresa foi se especializando em produtos para artesanato, e passou a ter uma posição dominante. Nicho, inovação e qualidade são objetivos sempre perseguidos. A companhia segue um ensinamento japonês: quando uma estampa for copiada, lance duas e melhore, ainda mais, a qualidade de seu produto. O quarto ajuste é aquele que ocorre através de uma mudança no modelo de negócios. Um exemplo extremamente interessante é o da Lupo, conhecida indústria de produtos de vestuário, fundada em 1921. Especializada por longo tempo na produção de meias, em 1988 partiu para a diversificação na área de "underwear". Em 1994, apareceu uma oportunidade de abrir uma loja de fábrica em um shopping. Embora houvesse dúvidas quanto à reação dos varejistas, a loja acabou sendo um sucesso. Em seguida, a segunda loja em Araraquara também se mostrou bem-sucedida, de sorte que, em 1995, foram abertas as duas primeiras franquias em São José do Rio Preto e no Rio de Janeiro. Rapidamente, a companhia percebeu que poderia competir com a crescente importação de similares, uma vez que a Lupo mudava a coleção mais rapidamente do que a importação, o que lhe deu vantagem num setor francamente exposto à competição externa e onde muitas outras empresas passaram a enfrentar grandes dificuldades. Hoje, a Lupo tem 284 franquias, que representam aproximadamente metade de suas vendas. Desenvolve continuamente sistemas gerenciais que, entre outras coisas, informa muito rapidamente a reação dos consumidores aos diversos novos modelos, o que agiliza e otimiza a cadeia de produção. Essa ligação nos segmentos têxtil, vestuário e calçados, de produção e distribuição, é responsável pela capacidade de competir de forma bem-sucedida com importações, desde que preservada a agilidade e a capacidade de criar e produzir com qualidade. Vale notar que a Lupo continua sendo uma indústria. Outros casos de sucesso são conhecidos, como Hering, Dudalina e Arezzo.Finalmente, o caso mais complexo, pelo que exige das empresas, é o do ajuste via avanço tecnológico, Aqui, um dos melhores exemplos que conheço é o da BM&FBovespa. O sistema financeiro brasileiro trabalha com uma regulamentação prudencial bastante robusta, que foi sendo construída com base em experiências passadas (por exemplo, o requerimento de capital dos bancos brasileiros é bem maior que o padrão internacional há muito tempo). Da mesma forma, a BM&FBovespa é uma das poucas bolsas do mundo que tem dentro dela todos os serviços para a boa operação: negociação, liquidação, custódia, análise de risco e garantias associadas, o que torna o sistema bastante seguro. Casos como o da implosão da corretora americana MF Global não têm como ocorrer no Brasil. Ainda assim, a BM&FBovespa montou um plano de investimentos em tecnologia da informação (TI) que busca elevar a qualidade dos sistemas de negociação, de liquidação, de administração de risco, de segurança da informação, abrir novas frentes de negócios e reduzir custos operacionais, que resultaram num amplo programa de inversões da ordem de R$ 1,5 bilhão, dos quais a maior parte já foi gasta. Os projetos foram os seguintes: 1) Puma: nova plataforma eletrônica de negociação, que substituiu as quatro anteriores. O sistema é muito mais rápido, mais estável, mais resiliente e possui grande capacidade de processamento. O Puma já está funcionando sem interrupções e sem registro de problemas graves há 400 dias consecutivos. O sistema foi desenvolvido com a CME Group. 2) Novo data center em Santana do Parnaíba que acomodará as plataformas de negociação, clearing e de central depositária de ativos da companhia. Existe espaço para acomodar a infraestrutura de TI de diversos tipos de clientes da Bolsa. 3) Nova clearing e novo sistema de risco Core: a clearing vai integrar as antigas clearings de ações, derivativos, câmbio e ativos, como títulos públicos federais. A maior padronização e automação do processo gerará redução de despesas hoje recorrentes enfrentadas pelo mercado. O novo sistema de risco permitirá maior eficiência na alocação de garantias/capital pelos investidores, sem detrimento da segurança e robustez do sistema. Estima-se um benefício de cerca de R$ 20 bilhões para o mercado, somente na primeira fase do projeto, prevista para este mês.4) Nova plataforma de registro de operações do mercado do balcão.Todos os sistemas são de propriedade da BM&FBovespa e estão na fronteira da qualidade e da modernidade. Tanto é que a companhia tem agora a possibilidade de exportar serviços técnicos para outras bolsas ao redor do mundo, em vez de pagar pelas licenças, como era o caso da antiga plataforma de negociação.A empresa também está preparada para crescer no futuro próximo e os clientes terão benefícios de redução dos custos de operação do sistema.Tanto quanto no passado, as empresas continuarão a enfrentar desafios nos próximos meses, pela desaceleração corrente da atividade econômica, pela sucessão presidencial, pela economia global e pela revolução tecnológica em curso no mundo. A resposta de cada uma construirá seu futuro.

Opinião por JOSÉ ROBERTO MENDONÇA DE BARROS
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