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Crise ''engole'' 30 milhões de carros

Montadoras devem fechar 35 fábricas e cortar 124 mil trabalhadores no mundo até 2010, a maior parte nos EUA

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Quase 30 milhões de carros vão sobrar no mundo este ano. A indústria automobilística deve produzir 59,3 milhões de veículos, segundo estimativas, embora tenha capacidade instalada para fabricar 87,8 milhões. Com ociosidade acima de 30%, demissões de trabalhadores e fechamento de fábricas devem ocorrer por todos os continentes, muitas delas já anunciadas. Até agora, as montadoras divulgaram planos - parte já efetivado - de cortar 124 mil vagas até 2010, a maioria nos Estados Unidos, onde em janeiro as vendas despencaram 37% e na Europa, que em igual período registrou queda de 27%, a maior em 20 anos. O número de fábricas a serem fechadas beira 35. O setor automobilístico reúne uma cadeia imensa, que vai da mineradora que produz matéria-prima para o aço dos carros até a costureira que faz o uniforme do metalúrgico. Em todos os países, o setor tem importante participação no Produto Interno Bruto (PIB). Uma demissão na linha de montagem puxa dezenas de outras, o chamado efeito dominó. "O que está ocorrendo neste momento é uma catástrofe global na indústria de veículos", declarou semana passada o diretor do grupo francês PSA Peugeot Citroën, Christian Streiff. Segundo ele, até mesmo os emergentes Brasil, Rússia e China, antes considerados "geradores de crescimento", interromperam o movimento de alta. Estudo recém-concluído pela consultoria internacional PricewaterhouseCoopers mostra que, entre os 20 maiores fabricantes mundiais, 19 vão diminuir a produção de automóveis e comerciais leves neste ano em relação a 2008. O único país que não terá saldo negativo, a China, vai registrar elevação de apenas 1,5%, após quatro anos seguidos de crescimento médio de 20% (ver mapa acima). "Está sobrando capacidade e é difícil imaginar uma rápida recuperação nos próximos anos para usá-la", admite o presidente da General Motors do Brasil, Jaime Ardila. "O excesso custa muito dinheiro". Há dez anos, a indústria automobilística tinha capacidade de fabricar 70 milhões de veículos ao ano e já contabilizava excedente de 20 milhões de unidades. Desde então, algumas fábricas foram fechadas nos Estados Unidos, mas várias outras foram inauguradas principalmente em países asiáticos, no Leste Europeu e no Brasil, que no ano passado tornou-se o sexto maior produtor de carros, duas posições à frente da que tinha em 2007. NOVA PAISAGEM O excesso de capacidade de 28,5 milhões de veículos que deixarão de ser feitos este ano equivale praticamente à produção prevista pelos quatro principais mercados mundiais: Japão, EUA, China e Alemanha, sem contar caminhão e ônibus. Só de um ano para outro serão perdidos quase 7 milhões de carros. A produção global deve cair de 66,2 milhões de veículos em 2008 para 59,3 milhões este ano, o que representará uso de apenas 67,5% da capacidade produtiva das empresas. Para o brasileiro Carlos Ghosn, presidente mundial do grupo Renault/Nissan, se o desempenho do primeiro mês do ano se mantiver, as vendas da indústria automobilística chegarão a no máximo 50 milhões de unidades. "A crise pode ser longa. Nos obriga a mudar os planos e vai alterar a paisagem do setor automobilístico mundial", disse na semana passada. Entre os países, o Japão se mantém este ano como maior fabricante de veículos (9,6 milhões de unidades), mas o segundo colocado passa a ser a China (7,5 milhões), que vai desbancar os EUA (7,2 milhões). Os números não incluem caminhões e ônibus. Em 2012, a China completa sua virada e passa a ser a maior produtora mundial (com 10,9 milhões de unidades), deixando o Japão em segundo lugar (10,4 milhões) e os EUA em terceiro (9,8 milhões). A Price calcula que a produção brasileira vai cair 13%, interrompendo uma sequência de alta média de 10% verificada a partir de 2003. "Mesmo incluindo caminhões e ônibus, o porcentual de queda deve ser o mesmo", diz Marcelo Cioffi, da Pricewaterhouse do Brasil. O número total deve ficar próximo a 2,8 milhões de veículos, ante 3,2 milhões em 2008. Ardila, da GM, trabalha com igual volume para este ano. O Brasil, na opinião de Cioffi, volta a se recuperar a partir do próximo ano e chegará em 2012 com uma produção de 3,3 milhões de automóveis e comercias leves,mantendo-se assim no sexto lugar entre os maiores produtores, posição alcançada no ano passado. Até lá, porém, o País já terá capacidade produtiva próxima aos 5 milhões de veículos, caso os investimentos anunciados pelas empresas não sejam interrompidos. A sobra de capacidade no mundo é geral, não só automotiva, afirma o presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Jackson Schneider. Uma das consequências no ramo de veículos, diz ele, é regiões como Europa e América do Norte exportarem seus excedentes para mercados hoje abastecidos pelo Brasil. "Vamos enfrentar concorrência onde antes ela não existia."

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