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Crise internacional freia a onda dos IPOs e afeta finanças das empresas

Mudança de humor no mercado aumenta os riscos de quem tomou dinheiro emprestado para abrir capital

Por Patricia Cançado e Ricardo Grinbaum
Atualização:

Os recentes tremores no mercado financeiro trouxeram uma nova preocupação para as empresas e os bancos de investimentos brasileiros. Muitos deles foram pegos no contrapé, quando se preparavam para abrir capital e vender suas ações na Bolsa de Valores. Pelas contas de Alfried Plõger, da Associação Brasileira de Companhias Abertas (Abrasca), o número de estréias na Bolsa (IPOs, sigla em inglês para oferta inicial de ações) não vai mais chegar a 70, como se previa. Do início do ano até agora, foram feitas 49 ofertas. ''''Mesmo que se queira, dificilmente se conseguirá vender tantos papéis'''', diz Plöger. Ou, em outras palavras: ''''O gato subiu no telhado; nenhum banco aconselharia uma empresa a vender ações agora'''', diz o advogado Luiz Octavio Lopes, do escritório Mattos Filho. Para Lopes, a festa de dinheiro farto, que incentivou todo tipo de empresa a vender ações, perdeu o gás. ''''Está claro que é um novo mercado; os investidores provavelmente estarão mais seletivos e mais duros.'''' PLANO B Ninguém sabe ao certo o quanto mudou o humor do mercado, mas, por via das dúvidas, as empresas estão pensando em planos alternativos. É o caso da rede de supermercados G. Barbosa, do Nordeste. Seu dono, o fundo de investimentos americano Acon, estudava duas alternativas para vender a empresa: uma oferta de ações na Bolsa ou uma negociação com alguma grande rede, como Pão de Açúcar, Wal-Mart ou Carrefour. Agora, a segunda opção ficou mais próxima. ''''O IPO desacelerou.O que se questiona é se o momento é adequado para entrar na Bolsa'''', diz uma fonte ligada às negociações. O medo dos donos do G. Barbosa é não conseguir vender a empresa na Bolsa de Valores pelo que eles acham que ela vale, entre US$ 300 milhões e US$ 400 milhões. A empresa de shopping centers Aliansce, que tem como um de seus principais sócios a Gávea, do ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, estava fazendo seu road show - apresentação a investidores - no dia em que as bolsas desabaram. A Aliansce cancelou os compromissos e pediu à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para interromper o processo. O pedido de abertura de capital foi suspenso por 60 dias. É tempo suficiente para avaliar se o mercado vai se recuperar ou não. Adiar ou cancelar um processo de abertura de capital tem seus custos - e eles podem ser ainda mais altos que se imagina. Antes da crise, havia dinheiro fácil para as empresas se prepararem para o IPO. Num ambiente feroz de competição, os bancos de investimentos vinham emprestando muito dinheiro para engordar as empresas e deixá-las mais atraentes na hora de vender ações. Esse tipo de operação é conhecida, em geral, como ponte para o IPO. Enquanto o mercado ia bem, o pagamento da dívida e das comissões dos bancos estava garantido porque era descontado do dinheiro levantado na venda de ações. O risco dessa operação é que a ponte não leve a lugar nenhum, uma vez que não haja ambiente para abrir capital. Nesse caso, as empresas podem ter dificuldade para pagar os empréstimos e os bancos ficarem com um mico em suas carteiras. Empresas que já pegaram dinheiro emprestado para se preparar para um IPO podem ser levadas a mudar de estratégia. No início do ano, o banco mineiro Bonsucesso e seus donos - a família Pentagna Guimarães - pegaram dois empréstimos, no valor de R$ 230 milhões, com o banco de investimentos UBS Pactual. O Bonsucesso estava às vésperas de abrir o capital quando a crise estourou. O IPO não saiu. Segundo o Bonsucesso, o banco perdeu o prazo para a entrega de documentos à CVM. Agora, deverá fazer nova tentativa só no final de setembro ou início de outubro, ''''devido à crise de liquidez'''', diz o presidente do Bonsucesso, Paulo Henrique Pentagna Guimarães. A questão agora é saber se os investidores terão o mesmo apetite que antes para comprar ações do Bonsucesso e, assim, dar os recursos necessários para pagar o UBS Pactual. O Bonsucesso não é o único caso. Um dos maiores bancos de investimentos do País emprestou mais de R$ 700 milhões em um ano para viabilizar aberturas de capital. Foi um sucesso. Por enquanto.

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