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Crises financeiras regionais ameaçam economia chinesa

Capacidade do Estado de ampliar investimentos pode ser reduzida no momento em que ritmo de crescimento é o menor em 10 anos

Por CLÁUDIA TREVISAN , CORRESPONDENTE e PEQUIM
Atualização:

A China começa a viver a ressaca do boom de investimentos, alimentado por crédito fácil dos últimos três anos, com uma sucessão de crises financeiras regionais que podem dragar empresas e bancos em um efeito dominó ou forçar o governo a lançar bilionárias boias salva-vidas aos que se afogam. No melhor cenário, o peso das dívidas reduzirá a capacidade de o Estado ampliar investimentos no momento em que a economia desacelera para o menor ritmo em mais de uma década.Notória pelo forte setor privado e o espírito empreendedor, a Província de Zhejiang registrou aumento de 35% nos créditos de recuperação duvidosa dos bancos no primeiro semestre de 2012, que estavam em 1,34% do total no fim de junho, o equivalente a 75,9 bilhões de yuans (R$ 24,17 bilhões). Na cidade de Wenzhou, que já viveu uma crise financeira no ano passado, o porcentual de empréstimos podres saltou de 0,37% em junho de 2011 para 2,69% um ano mais tarde, o mais alto nível em uma década - a média nacional era de 0,9% na mesma época, cifra que muitos analistas consideram irreal.A 2.242 km de distância, na Mongólia Interior, a cidade de Ordos também viu o rápido aumento porcentual de créditos duvidosos, que passaram de 0,7% no fim de 2011 para 2,14% em junho. O local é o exemplo máximo da extravagância que inflou a bolha imobiliária chinesa, com milhares de apartamentos vazios.Maquiagem. Winnie Wu, analista do Bank of America Merrill Lynch, acredita que o governo está forçando os bancos estatais a não registrarem em sua contabilidade muitos dos empréstimos que azedaram. As instituições financeiras também são obrigadas a fornecer crédito ao que ela chama de "empresas zumbis", que já deveriam ter fechado as portas pela impossibilidade de sobreviverem sem ajuda oficial.Em sua opinião, o porcentual de 0,9% de créditos irrecuperáveis é "surpreendentemente baixo", se for considerada a recente onda de devedores que não conseguiram pagar suas obrigações. Só o conglomerado Zhongjiang Holding tem débito de 3 bilhões de yuans (R$ 355,3 milhões) com o China Construction Bank, mesmo valor que a Jade Cargo deve para o Bank of China. As duas empresas pediram falência nos últimos dois meses. O débito total do grupo Zhongjiang alcança 8 bilhões de yuans, dos quais 5 bilhões em empréstimos bancários. O presidente da holding, Yu Zhongjiang, foi preso em junho sob acusação de delitos financeiros.Em Pequim, a empresa garantidora de crédito Zhongdan pediu falência na terça-feira, depois de se debater contra a crescente falta de liquidez desde o início do ano. A companhia garantiu financiamentos no valor de 3 bilhões de yuans, em transações que envolvem 22 bancos e 294 empresas da capital chinesa.Antes de fugir para os Estados Unidos em fevereiro, o dono da Zhongdan, Chen Yibao, também provocou estragos na província sulista de Guangdong, que concentra a indústria manufatureira exportadora da China. Suas duas garantidoras de crédito na região, Huding e Changfu, realizaram operações fraudulentas que causaram perdas para centenas de pequenas empresas. O caso levou à prisão de nove administradores das companhias e ao afastamento de Xie Pengfei, um alto dirigente do governo provincial suspeito de favorecimento e conivência com as transações."A China enfrenta uma série de crises financeiras, que estão pipocando em diferentes regiões", disse ao Estado o americano Patrick Chovanec, professor da Universidade Tsinghua. Michael Pettis, professor da Universidade de Pequim, prefere a expressão "problema de dívida", provocado pela expansão do débito em velocidade maior que a capacidade de pagamento. Em sua opinião, a palavra "crise" pressupõe a possibilidade de colapso dos bancos, o que é pouco provável na China, já que o Estado deverá socorrer as instituições em dificuldades. O próprio governo reconhece a ameaça. Em editorial publicado em sua primeira página no dia 14 de agosto, o jornal Notícias Financeiras, editado pelo Banco do Povo da China, ressaltou os riscos financeiros regionais, que são agravados pela desaceleração econômica.O editorial previu aumento do volume de créditos de má qualidade nos balanços dos bancos e ressaltou os problemas decorrentes da queda na arrecadação das administrações provinciais, do crédito subterrâneo concedido à margem do sistema bancário e das dificuldades de caixa enfrentadas pelas construtoras em razão das medidas restritivas adotadas pelo governo para desinflar a bolha imobiliária."Com mudanças no ambiente externo e a desaceleração da economia doméstica, todos os potenciais riscos do setor financeiro podem ser facilmente expostos", ponderou o texto.

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