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Cruzada de Mantega esbarrou em Lula e BC deu a palavra final

Tentativa de impedir aumento da taxa de juro produziu efeito contrário

Por Fabio Graner
Atualização:

A decisão de ontem do Comitê de Política Monetária (Copom) tem potencial para acirrar os ânimos do governo no debate sobre os rumos da política econômica. Quando em meados de março os sinais de que a alta da Selic era iminente começaram a ficar mais claros, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, saiu a campo de maneira atabalhoada para tentar pressionar o Banco Central a não elevar os juros. E com Mantega se alinharam o grupo desenvolvimentista do governo, os conselheiros do presidente Lula e o setor empresarial. A preocupação central desse grupo é que a elevação dos juros básicos provoque uma aceleração no movimento de valorização do real ante o dólar e agrave o quadro de deterioração da conta corrente do balanço de pagamentos, sobretudo para 2009 e 2010. Isso porque o real valorizado, além de tirar competitividade das exportações, favorece as importações. O primeiro capítulo teve contornos tragicômicos. O ministro da Fazenda lançou nos jornais uma idéia de limitar financiamentos de bens duráveis, como veículos. Mantega avaliava que, tentando conter os empréstimos de prazo superior a 36 meses, poderia desaquecer um pouco a demanda e evitar que o BC subisse os juros. A proposta, que remontava aos inflacionários anos 80, foi bombardeada por todos os lados, inclusive por aliados, e engavetada com um desmentido. Mantega então passou a se reunir com empresários dos setores com maior demanda, como automotivo e siderúrgico, entre outros, para questionar se os investimentos estavam sendo feitos. A mensagem que ele tentava passar ao BC era de que a oferta da economia estava sendo ampliada e a demanda aquecida seria plenamente suprida sem inflação, quando os investimentos amadurecessem. No fim de março, em outro capítulo da novela, o BC divulgou seu relatório trimestral de inflação, com projeções que mostravam o IPCA acima da meta no fim do ano. Mais importante nesse dia, contudo, foi a declaração do diretor de Política Econômica do BC, Mário Mesquita. Ele disse que o BC deve agir de forma preventiva e autoridades monetárias que esperam a inflação divergir demais da meta para agir, depois têm de fazê-lo de forma mais intensa e por mais tempo. Interpretada pelo mercado como declaração de voto pela alta nos juros e sinal claro de que o BC subiria os juros, a fala de Mesquita e os sinais do BC receberam uma reação de Mantega poucos dias depois, na reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES). Em um bem elaborado discurso sobre a situação da economia brasileira, Mantega atacou os "ortodoxos", que, segundo ele, "costumam ter medo do crescimento". Foi o momento mais grave da disputa entre BC e Fazenda, que ainda teve adicionado, poucos dias depois, os ingredientes de proposta de elevar informalmente o superávit primário para tentar evitar a alta na Selic e a ventilação da idéia, improcedente, de que o governo estaria estudando instituir um sistema de metas de câmbio. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva entrou em campo e chamou o presidente do BC, Henrique Meirelles, e Mantega para conversarem. Desde então, Mantega conteve seu ímpeto declaratório e a briga refluiu. Na sexta-feira passada, em viagem à Holanda, Lula deu sinal de que respaldava a atuação no BC na tentativa de manter a inflação na meta. O presidente disse que não dava palpite na questão dos juros e, ainda se referindo à expectativa de alta de 0,25 ponto na Selic, acrescentou: "Não será nem a redução de 0,25 (ponto porcentual), nem a manutenção de 11,25% nem o aumento de 0,25 que trará qualquer transtorno à economia brasileira". Mesmo assim, a disputa entre desenvolvimentistas e BC ganhou um capítulo extra nesta semana, quando o Ipea entrou em campo contra a alta dos juros. A visão do instituto, chefiado pelo desenvolvimentista Márcio Pochmann, era de que uma decisão nesse sentido seria no mínimo precipitada. Fontes do governo avaliaram como equivocada a manifestação do Ipea, que, ao reacender a pressão contra o BC, reforçava a tendência de alta do juro, já que a autoridade monetária é ciosa em tentar deixar clara sua autonomia operacional.

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