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Debate expõe divergência sobre indústria

Para Claudio Haddad, País não consegue ser competitivo em todas as áreas; Delfim Netto diz que núcleo do problema é a taxa de câmbio

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Por Raquel Landim
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Em uma sala reservada de um restaurante chique de São Paulo, 20 grandes empresários se reuniram para almoçar e discutir os problemas da indústria brasileira. No cardápio, questões estruturais, como a estagnação da produtividade, a tributação dos insumo e a baixa qualificação da mão de obra. Mas o prato principal foi o câmbio valorizado."O câmbio é o fator que faz toda a diferença do mundo. Se não acertar, não tem jeito", sentenciou Paulo Cunha, presidente do Grupo Ultra, já na hora do cafezinho, após as exposições de Claudio Haddad, presidente do Insper, e Delfim Netto, ex-ministro da Fazenda.O Estadão participou na semana passada do almoço organizado pelo Instituto de Estudos do Desenvolvimento Industrial (Iedi). Estavam presentes dirigentes de empresas como J. Macedo, Coteminas, Iochpe Maxion, Duratex e Marcopolo.Na cabeceira da mesa, Pedro Passos, presidente da Natura, abriu o encontro enumerando mudanças urgentes para o País: reforma tributária, mais investimentos, menos gastos correntes, fim da indexação, redução dos custos dos insumos industriais, mais financiamento de longo prazo.Enquanto o almoço era servido (uma salada verde, seguida de bacalhau ou cordeiro), Júlio Sérgio Gomes de Almeida, consultor do Iedi, apresentava, num Powerpoint, a situação da indústria, com números indigestos. A produção industrial caiu 3,6% entre o terceiro trimestre de 2008 (pós-crise global) e o primeiro trimestre deste ano. O déficit comercial do setor atingiu US$ 52 bilhões no ano passado.A missão de Haddad e Delfim era tentar explicar qual é o problema da indústria brasileira, que não consegue acompanhar o "boom" de consumo e perde espaço para o importado. Os dois especialistas tinham visões distintas do problema e receitas diferentes para solucioná-lo."A indústria tem futuro no Brasil dependendo do tipo. O Brasil não precisa de toda a gama da indústria, só da mais eficiente", disparou Haddad. Na visão dele, a indústria intensiva em mão de obra "acabou", porque perdeu a vantagem comparativa para a China e outros asiáticos. Ele ressaltou que é preciso apostar em tecnologia, marketing e gestão. A plateia ouviu em silêncio."A indústria está sendo massacrada pela deficiência da política econômica", disse Delfim. Ele defendeu que a política de valorização do câmbio e elevação do salário mínimo reduziu "dramaticamente" a competitividade do setor. Para o ex-ministro, a maior riqueza do Brasil é seu mercado interno, que deve ser "protegido" de forma "eficiente". Foi aplaudido pelos presentes. Limusines. O debate só esquentou quando o câmbio se tornou o centro da discussão. Haddad até tentou argumentar que é um fator "exógeno" e não "endógeno", ou seja, que se a economia brasileira vai bem, a valorização do real é uma consequência. Mas não convenceu os empresários.Para Delfim, o maior problema do Brasil é a supervalorização do real, que persiste desde o Plano Real. "O Gustavo Franco (ex-presidente do BC no governo Fernando Henrique) foi só o instrumento", disse. Ele acredita que o governo Dilma Rousseff está indo na direção correta ao tentar influenciar no mercado cambial. "Não existe câmbio flutuante, todo câmbio é manipulado."Ao final do evento, o ex-ministro só ganhava elogios. "Você pode concordar ou discordar, mas o Delfim é brilhante", disse um empresário. "O Delfim já tem 80 anos e pode falar do que realmente interessa: câmbio", afirmou outro participante do almoço. Já eram quase 15 horas quando os empresários começaram a deixar o restaurante em suas limusines pretas.

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