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Debêntures incentivadas

Desonerar instrumentos de captação específicos é a pior opção para o financiamento de obras de infraestrutura

Por Bernard Appy
Atualização:

Segundo notícias veiculadas recentemente na imprensa, está em discussão a ampliação dos benefícios tributários para as debêntures incentivadas, que são instrumentos de captação de recursos destinados a investimentos em infraestrutura. O objetivo seria estimular o uso do mercado de capitais no financiamento de obras de infraestrutura, reduzindo a dependência de recursos do BNDES. Embora tal objetivo seja louvável, a verdade é que a concessão de benefícios tributários para instrumentos financeiros específicos (caso das debêntures incentivadas) é uma forma ineficiente de alcançar o objetivo pretendido.

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Para entender esse ponto, vale fazer uma rápida descrição do atual modelo de benefícios tributários à captação de recursos para a infraestrutura, introduzido por meio da Lei n.º 12.431, de 2011. Por esse modelo, a captação de recursos para o financiamento de obras de infraestrutura através de debêntures, Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) e Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs) é beneficiada pela redução do Imposto de Renda (IR). No caso de aplicação de recursos por pessoas físicas, a alíquota do IR cobrado na fonte é reduzida de 15% para zero. Já na aplicação de recursos por pessoas jurídicas, o IR é cobrado exclusivamente na fonte, à alíquota de 15%, ao invés da tributação normal de 34%. Para fazer jus ao benefício, os instrumentos beneficiados têm de atender a algumas exigências, como prazo médio ponderado mínimo, entre outras.

O problema do modelo descrito acima é que a concessão do benefício depende do tipo de investidor, do instrumento financeiro utilizado e da destinação dos recursos, o que, na prática, resulta numa colcha de retalhos tributária, que é distorciva e ineficiente. Esse ponto fica mais claro quando consideramos cada uma das distorções. Por um lado, o modelo atual não beneficia investidores institucionais, como fundos de pensão, pois os rendimentos dos fundos de pensão não são tributados quando de sua acumulação, mas apenas quando do resgate dos recursos pelos beneficiários. Na prática, isso significa que os investidores que têm o perfil mais adequado para aplicar em papéis de longo prazo são penalizados, pois o benefício concedido às pessoas físicas e às empresas reduz o juro dos papéis, tornando-os pouco atrativos para os fundos de pensão.

Por outro lado, a concessão de benefícios apenas para alguns instrumentos (debêntures, CRIs e FIDCs) também distorce o mercado, pois outros instrumentos que eventualmente poderiam ser mais adequados para o financiamento de longo prazo – como a emissão de ações ou mesmo financiamentos bancários – não são beneficiados.

Por fim, a concessão de benefícios apenas para investimentos de infraestrutura – e não para investimentos em geral – também pode gerar distorções, pois incentiva as categorias de investimento não beneficiadas a buscar financiamentos no BNDES, quando o objetivo da medida é exatamente deslocar a demanda de recursos do BNDES para o mercado de capitais.

Para desenvolver o mercado de capitais como fonte de recursos de longo prazo no Brasil, a medida mais eficiente é, seguramente, a criação de condições para que os juros no Brasil sejam baixos e estáveis.

Se, temporariamente, for necessário beneficiar algum setor – como o de infraestrutura – por causa do alto custo de financiamento no mercado, a melhor forma de fazê-lo (e a mais transparente) é por meio da concessão de subvenção diretamente aos empreendimentos selecionados. Se não for possível utilizar recursos do orçamento, a segunda melhor opção é a concessão de benefício tributário ao tomador dos recursos.

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A pior opção é exatamente desonerar instrumentos de captação específicos – que é o modelo atualmente existente no Brasil, cuja ampliação está sendo discutida –, pois, além do custo fiscal e da maior complexidade no acompanhamento da aplicação dos recursos, esse modelo impede o uso eficiente dos instrumentos de captação disponíveis no mercado.

*DIRETOR DO CENTRO DE CIDADANIA FISCAL

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