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Dentro do pensamento do Fed

Por Floyd Norris
Atualização:

"Quando alguém me convence de que estou errado, eu mudo de idéia. O que você faz?" John Maynard Keynes. Há seis semanas, o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) achava que a economia superaria facilmente os problemas do mercado de crédito. Há uma semana, o Banco da Inglaterra advertiu sobre os riscos de salvar os que haviam feito empréstimos arriscados. Esta foi uma semana para dizer "tudo bem." O Fed cortou as taxas de juro e as autoridades britânicas resolveram que garantiriam os depósitos de qualquer banco britânico, depois do início de uma corrida a um banco que havia jogado num mercado hipotecário. Uma medida da persistente confiança no poder e sabedoria dos bancos centrais é que os mercados em todo o mundo subiram. As duas medidas mostraram que os dirigentes de bancos centrais ficaram mais temerosos de as contrações do mercado de crédito prejudicarem economias, mas os investidores inicialmente optaram por se concentrar mais na ação do que nos temores. Quinta-feira, porém, os mercados estavam operando de um modo que não poderia deixar o Fed feliz. O dólar caiu - um resultado esperado do corte das taxas de juro de curto prazo -, mas as taxas de longo prazo subiram, assim como as taxas hipotecárias. "O problema de Alan Greenspan está se tornando a calamidade de Ben Bernanke", disse Richard Barbera, economista-chefe do Investment Technology Group, ITG, recordando que, quando o Fed elevou as taxas de curto prazo no tempo de Greenspan, as taxas de longo prazo não acompanharam. Agora está ocorrendo o inverso, fato que tornará muito mais difícil estimular a economia. Os que quiserem compreender a inversão do Fed poderão se beneficiar da leitura de dois trabalhos de funcionários do Fed publicados recentemente quando o aperto do crédito estava se intensificando. Em conjunto, eles constituem uma admissão de que o Fed foi surpreendido pelo boom das atividades de empréstimo e imobiliárias no momento ascendente, e agora teme ser surpreendido no descendente. Um trabalho de Karen E. Dynan, uma economista do Fed, e Donald L. Kohn, vice-presidente do Fed, pergunta por que uma economia forte havia deixado os americanos mais afundados em dívidas do que nunca. "Os fatores mais importantes por trás do crescimento da dívida e a queda associada da poupança sobre a renda corrente provavelmente foram a combinação de preços imobiliários em alta com inovação financeira", eles concluíram. Em outras palavras, Wall Street e a alta dos preços dos imóveis facilitaram a captação de dinheiro, e os consumidores assim fizeram. Isso provocou um aumento maior que o esperado do consumo. Agora, dizem os autores, "um inesperado nivelamento ou queda" nos valores dos imóveis pode causar o efeito oposto. Frederic S. Mishkin, um diretor do Fed, disse, em outro trabalho, que isso poderia, por sua vez, causar na economia um efeito maior que o previsto pelo Fed. "Embora geralmente não coloque os mercados de imóveis e hipotecas perto do epicentro de casos anteriores de instabilidade financeira", escreveu, "eu observaria que a situação presente nos EUA pode ser diferente." Mishkin disse que havia modificado um modelo econômico do Fed e concluído que uma queda de 20% nos preços dos imóveis poderia causar uma queda de 2% nos gastos de consumo em dois anos, aproximadamente o dobro do que o modelo antigo previa. Mas não era esse o ponto que Mishkin queria salientar. Seu modelo mostrou que boa parte desses danos poderia ser evitada se o Fed agisse rapidamente para cortar taxas - como ele está fazendo agora. Nos bastidores, corre um debate agitado nos círculos de bancos centrais sobre se os bancos devem considerar os preços de ativos ao estabelecer uma política monetária. Ele surgiu após o estouro da bolha de tecnologia, há seis anos, e está de volta agora, com alguns dizendo que uma política muito branda do Fed provocou uma bolha imobiliária. Mishkin duvida de que o Fed possa fazer um bom trabalho de localizar uma bolha em preços imobiliários ou outros, e não vê nenhuma necessidade de tentar. Afinal, escreve, "as autoridades monetárias têm as ferramentas para limitar os efeitos negativos sobre a economia de uma queda no preço dos imóveis." A visão de Mishkin continua sendo a predominante entre dirigentes de bancos centrais, mas não é a única. Ele observa, com desaprovação, que o banco central sueco elevou as taxas no ano passado em reação a uma alta dos preços imobiliários, e afirma que pesquisas posteriores mostraram que a medida "confundiu o público e provocou um enfraquecimento geral da confiança no banco central sueco". Pode ser, mas ainda é cedo demais para se chegar a alguma conclusão. O que se pode ver é que, até agora, os começos de imóveis caíram muito mais rapidamente na Suécia do que nos EUA, mas a economia sueca ainda está crescendo um pouco mais que a americana. Mishkin é um economista com extensos trabalhos sobre instabilidade financeira, e sua confiança é tranqüilizadora, apesar de as ações do Fed não fazerem nada para afetar diretamente a secura de empréstimos para tomadores arriscados. O trabalho de Mishkin incluiu, também, uma conclusão que os investidores talvez não gostem de ouvir: "Garantir que um colapso dos preços dos imóveis não prejudica seriamente a economia agregada não elimina de maneira nenhuma fortes quedas nos preços das casas e, assim, não oferece segurança contra essas quedas", escreveu. "O mesmo raciocínio vale para os preços das ações. De fato, temos visto quedas substanciais nos preços de imóveis e de outros ativos em muitos países mesmo quando a política monetária foi substancialmente aliviada."

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