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Denúncias de transações suspeitas causam ruído para bancos, mas não devem levar a aperto regulatório

Analistas dizem que bancos já foram alvo de forte aperto regulatório desde a crise de 2008, incluindo as recentes normas contra lavagem de dinheiro; cenário é ainda mais presente no Brasil, onde a legislação de câmbio vem sendo modernizada

Foto do author Altamiro Silva Junior
Foto do author Aline Bronzati
Por Altamiro Silva Junior (Broadcast) e Aline Bronzati (Broadcast)
Atualização:

Novas denúncias de transações suspeitas por alguns dos maiores bancos do mundo, incluindo nomes como Deutsche Bank, JPMorgan e HSBC, que chegam a US$ 2 trilhões em operações, podem aumentar a inspeção sobre o setor financeiro no curto prazo, mas não devem gerar nova rodada de aperto regulatório, segundo analistas internacionais ouvidos pelo Estadão/Broadcast. O respingo no Brasil deve ser via mercado, na opinião destes profissionais, por causa do aumento da aversão a risco, pois a legislação brasileira já é mais dura.

HSBC Foto: Helvio Romero/ Estadão

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 A avaliação de analistas em Londres, São Paulo e Nova York é que os bancos já foram alvo de forte aperto regulatório desde a crise financeira mundial de 2008, incluindo mais recentemente normas fechando o cerco à lavagem de dinheiro. Esse cenário é ainda mais presente no Brasil, onde além de novas regras para banir o dinheiro sujo do mercado, a legislação de câmbio vem sendo modernizada.

Outro ponto mencionado pelos especialistas é que as denúncias das operações nos documentos obtidos pelo site BuzzFeed News e compartilhados com o Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ) são de operações de anos passados, algumas com início em 1997 e que vão até 2017. Ou seja, muitas já são conhecidas dos reguladores e já foram alvo de multas e resoluções, observa um gestor em Nova York. Para ele, é pouco provável que resultem em novo aperto regulatório ao setor financeiro.

O Deutsche Bank destaca exatamente este ponto em comunicado hoje, chamando atenção que as denúncias tratam "de questões históricas". O banco alemão observa que elas são "bem conhecidas por nossos reguladores", têm sido investigadas e já levaram a criação de novas normas e resoluções. Na mesma direção, o HSBC, que tem uma história de escândalos financeiros, incluindo o caso de lavagem de dinheiro que ficou conhecido como Swissleaks e relacionados a cartéis de drogas no México - e que foi tema da série 'Na Rota do Dinheiro Sujo' da gigante de streaming audiovisual Netflix, afirma que a denúncia trata de informação "histórica" e que desde 2012 vêm se empenhando para lidar com a questão.

Para um analista estrangeiro, especializado em bancos, pode ser que, nos desdobramentos futuros da investigação, apareça algum banco brasileiro, mas ele considera, a princípio, improvável. "A dificuldade de mexer com esse tipo de coisa é altíssima no Brasil. Os bancos acabam preferindo perder a transação a ter o risco. Se aparecer, imagino que seria no mundo de private, que é onde as engrenagens tendem a ser mais azeitáveis", opina. "Mas continuo achando improvável", diz.

"Sempre há reflexos. Não há como não haver. A grande questão da regulação bancária é 'não ir além, sem ficar aquém'", diz um advogado, especialista no setor bancário. Ele lembra que quando há elementos dentro do sistema especificamente para corrompê-lo, é mais difícil a prevenção imediata ou mesmo preventiva. Hoje, contudo, pondera, o rastreamento nos bancos brasileiros é de 100%. "Este 'mercado' está sempre um passo a frente procurando brechas", alerta.

Os estrategistas do banco americano Brown Brothers Harriman (BBH) veem impacto principalmente no curto prazo, nos preços das ações do setor, que já vinham sendo pressionados pelo temor dos investidores com os reflexos da pandemia na qualidade dos ativos. "Os grandes bancos globais estão sob pressão", afirmam nesta segunda-feira.

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O executivo de um grande banco também vai nessa direção e avalia que o efeito no Brasil deve ser indireto, devido ao aumento da volatilidade nos mercados globais que altera os preços dos ativos e fluxos por aqui. A leitura, reforça, é de que o impacto da investigação ficará restrito ao exterior. Durante reunião com boa parte da diretoria do banco, na manhã de hoje, o tema, afirma, sequer foi abordado.

Por conta das regras mais rigorosas aqui, o Brasil não deve ser impactado, ao menos por ora, pelo escândalo, avalia uma fonte do Banco Central, na condição de anonimato. "Não vejo grandes impactos por ora, a menos que isso tenha sido um gatilho para outras crises lá fora", diz a fonte da autoridade monetária, que prefere não ser identificada. "Por aqui, nossas regras são rigorosas e nossa supervisão é boa", acrescenta.

Além disso, as normas de prevenção à lavagem de dinheiro foram recentemente atualizadas no Brasil e as regras de câmbio vêm sendo modernizadas. Entra em vigor a partir de outubro circular do BC, publicada em janeiro, e que torna mais dura a regulamentação dos procedimentos e controles internos a serem adotados pelos bancos no País visando à prevenção da utilização do sistema financeiro para a prática dos crimes de "lavagem" ou ocultação de bens, direitos e valores.

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