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Depois da indústria, a infra-estrutura

Por Alberto Tamer
Atualização:

O governo anunciou uma nova política industrial, que poderá estimular as exportações e fortalecer setores atingidos pelos juros altos e a valorização cambial. Tudo irá depender, porém, de regulamentar essas medidas, de difícil implementação. Há urgência porque chegam com atraso de décadas. De qualquer forma, foi um passo importante para animar o setor industrial, que vem caminhando ao reboque do agrícola, com vigoroso crescimento. Mas o êxito só será possível se o governo voltar-se, agora, para a reconstrução da infra-estrutura obsoleta, que todos, inclusive em Brasília, reconhecem como o maior risco para sustentação da atual expansão econômica. Não temos uma rede de rodovias modernas e seguras, os navios dormem nos portos à espera de cargas que caminham pelas estradas precárias e ficam retidas em armazéns, onerando brutalmente o custo final da exportação; vivemos sob insegurança no fornecimento de energia; vivemos hoje a surreal esperança de chuvas no Sul-Sudeste e Nordeste, pois mais da metade das usinas em construção, no Centro e no Sul, estão paradas ou em atraso. Estes são apenas alguns desafios para a economia brasileira, agora estimulada pelos novos incentivos. ABDIB DIZ O QUE FALTA Paulo Godoy, presidente da Abdib, afirma à coluna que o novo grau de investimento deverá atrair mais recursos externos. "Precisamos de mais de R$ 100 bilhões por ano só para evitar que a infra-estrutura impeça o crescimento." Ele cita o recente caos nos aeroportos como exemplo do que precisa ser feito com urgência. E nós o drama dos portos. Paulo Godoy reconhece que as concessões voltaram a fazer parte da agenda do setor público, o que é um fato positivo. "Mas este é o momento em que todos os empreendimentos em infra-estrutura em condições de serem leiloadas para concessão deviam ser concedidos aproveitando o clima atual." O QUE FALTA FAZER O presidente da Abdib aponta algumas áreas de especial urgência e interesse. "No setor de transmissão, basta ao governo federal continuar a promover as rodadas anuais de concessão. Nos últimos dez anos, as concessões à iniciativa privada permitiram ao governo evitar maiores contrangimentos no abastecimento de energia elétrica, como ocorreu em 2001(racionamento). A iniciativa privada propiciou ao Brasil ter uma sistema mais robusto em tempo relativamente curto." ENERGIA É O GRANDE DESAFIO Para ele, "o maior gargalo está na geração de energia, pois não há projetos suficientes prontos para serem leiloados, exceto o da segunda usina do Rio Madeira, ainda em maio". "A primeira já foi concedida no último trimestre do ano passado. O que as autoridades públicas podem fazer é acelerar os investimentos em inventários e estudos para identificar quais os próximos aproveitamentos hidrelétricos podem ser concedidos. Sabemos que há estudos em andamento, mas achamos que o governo brasileiro precisa ter um verdadeiro banco de projetos de usinas de energia prontos para concessão." BAGAÇO DE CANA "Outro desafio é encontrar uma solução para a expansão da geração de energia por biomassa (bagaço de cana) e eólica, que devem ser complementares à hidrelétrica." Isso para evitar que se repita o racionamento de 2001, que, acrescenta a coluna, tinha tudo para não acontecer. Para nós, o governo atual está repetindo o mesmo erro imprudente do ano passado. O risco não passou, pois Madeira só entrará em operação em sete, oito anos, ou mais. E é insuficiente, pois sua energia será absorvida em apenas um ano de crescimento do consumo, com um PIB de 4%. Se for 5%, e com pouca chuva em nenhum dos 7 anos, nem se fala. E só isso não é tudo. Para a coluna - e todos, economistas, técnicos e até burocratas -, o Brasil não tem hoje infra-estrutura suficiente para sustentar um crescimento anual nem mesmo de 4%. E precisa aproveitar essa rara oportunidade interna e externa para crescer mais. LÁ FORA, TUDO MELHORA Se no cenário interno vai bem, lá fora parece melhorar ainda mais. Mercado em calma, bolsas tranqüilas e, acima de tudo, só fatos positivos na economia americana. A inflação aumentou apenas 0,2% em abril. Anualizada, recuou de 4,2% para 3,9%. Alimentos subiram apenas 0,9%, e energia, 1,9%. Os gastos com combustíveis foram os que mais pesaram na inflação. Excluindo ambos, alimentos e energia, o núcleo da inflação está em 2,3%, pouco acima do nível de tolerância do Fed. Isso abre espaço para mais uma redução do juro básico. Há otimismo quanto à recuperação, pois esses resultados, de abril, não retratam o estímulo ao consumo proporcionado a partir deste mês. No total, em dinheiro vivo, US$ 160 bilhões estão entrando no mercado neste mês. E A RECESSÃO? A cada dia, mais economistas se rendem: a recessão foi evitada. A economia dos EUA continua a dar sinais de resistência, o pior parece ter passado. Até o medo de que outros países estariam perdendo a capacidade de absorver as exportações americanas está regredindo. Os EUA continuam importando e exportando muito, projetando cenário mais benigno para os próximos trimestres. CALMA! AINDA NÃO Bernanke reconheceu tudo isso, na segunda-feira. A crise regride, as tensões foram diluídas, mas nem tudo passou. É preciso manter cautela e mais recursos dos bancos centrais no sistema. Não é ainda hora de comemorar, apenas respirar aliviado, mas estar preparado para manter a ação de apoio que até agora deu certo. Resumindo: o pior já passou, mas não quer dizer que a crise imobiliária e financeira chegou ao fim. É hora de prudência e vigilância. Mas, por favor, sem tragédias, senhores festivos profetas do caos. *E- mai: at@attglobal.net

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