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Depois de alertar para 'fiscal descontrolado', presidente do BC fala em 'pano de fundo melhor'

Em evento, Campos Neto mudou o tom e disse que 'tenta chamar a atenção do mercado para além do ruído'; segundo ele, dados fiscais e rombo previsto para as contas públicas em 2022 estão melhores

Foto do author Eduardo Rodrigues
Foto do author Lorenna Rodrigues
Por Eduardo Rodrigues e Lorenna Rodrigues (Broadcast)
Atualização:

BRASÍLIA - O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, moderou o tom e passou a ver um "pano de fundo melhor do fiscal". "Eu tento chamar atenção do mercado para olhar para além do ruído", disse nesta terça-feira, 24, em evento da XP.

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O discurso é bem mais ameno do que o feito no dia 13 de agosto, quando disse que "é impossível para qualquer banco central do mundo fazer um trabalho de segurar as expectativas (de inflação) com o fiscal descontrolado".

Hoje, Campos Neto repetiu que os investidores do mercado têm relacionado as propostas do governo - como o parcelamento dos precatórios e a reforma do Imposto de Renda - a uma vontade de se criar um programa social mais robusto. Ele argumentou, porém, que os dados fiscais estão melhores do que se projetava para o momento, como a relação dívida e PIB e o rombo previsto para as contas públicas em 2022.

'Os números de fato estão melhores do que o mercado toma como verdade', disse Campos Neto. Foto: Adriano Machado/Reuters - 7/4/2020

"Os números de fato estão melhores do que o mercado toma como verdade. De fato há uma melhora fiscal associada a uma inflação maior, mas há também componentes que não estão associados a isso", disse.

A fala mais moderada vem depois de a agência Associated Press divulgar, na semana passada, que o presidente Jair Bolsonaro teria falado abertamente sobre seu arrependimento de apoiar a autonomia do BC durante um voo de volta após participar de um compromisso público em Mato Grosso. A AP também informou que um ministro, sob condição de anonimato, revelou que Bolsonaro tem expressado desconforto com a autonomia e gostaria de “interferir” na política monetária (ou seja, nas ações para o controle da inflação, como calibrar a taxa básica de juros).

O ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, teve que ir para o Twitter para afirmar que a autonomia do Banco Central “é um avanço histórico e irreversível”. Ele assegurou que não existe “nenhuma crise” entre Bolsonaro e o presidente do BC.

Analistas do mercado já preveem a inflação fechando em 7,11% este ano, bem acima do teto da meta que o BC deveria perseguir, de 5,25%. O centro da meta para o ano é de 3,75%, sendo que a margem de tolerância é de 1,5 ponto (de 2,25% a 5,25%).

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Campos Neto disse que o BC tem instrumentos para fazer a inflação convergir para a meta em "horizonte relevante", embora admita que houve deslocamento entre as expectativas de alta de preços da autoridade monetária e do mercado.

Para 2022, o mercado financeiro subiu de 3,90% para 3,93% a estimativa de inflação nesta semana. Foi a quarta alta seguida no indicador. No ano que vem, a meta central de inflação é de 3,50% e será oficialmente cumprida se o índice oscilar de 2% a 5%.

Expectativas

Ao defender um "pano de fundo melhor do fiscal", o presidente do BC foi na mesma linha de argumentos do ministro da Economia, Paulo Guedes, que nesta semana afirmou que "nenhum fundamento indica que o País está fora do conrole", apesar do "barulho" da antecipação das eleições.

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O ministro também citou a redução do déficit primário previsto, de 10,5% do PIB em 2020 para 1,70% em 2021 e a 0,30% para 2022.

No ano passado, o governo injetou um pacote de estímulo de R$ 524 bilhões em despesas adicionais para o combate à covid-19, o que impactou no tamanho do resultado negativo. Para este ano, estão previstos R$ 127 bilhões em gastos extras, após o governo ter “apostado” no fim da pandemia e, consequentemente, na possibilidade de retirar o suporte às famílias, aos trabalhadores e ao sistema de saúde. Políticas como o auxílio emergencial e o pacote de flexibilização de contratos de emprego só foram retomadas no fim do primeiro trimestre deste ano.

Guedes citou que a projeção para o crescimento do PIB do Brasil em 2021 está em 5,30%, mas não lembrou que em 2020, houve queda de 4,1% na economia. Ele afirmou que a expectativa para o crescimento do PIB cresce há 16 semanas, mas a maioria das projeções colhidas pelo Banco Central para o boletim Focus cai marginalmente há duas semanas e foi reduzida de 5,28% para 5,27% no relatório divulgado nesta semana.

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Para o ano que vem, os economistas continuam a reduzir as projeções. Agora, a maioria espera expansão de 2% do PIB em 2022, ano de eleições. Como mostrou o Estadão, uma "tempestade perfeita" de inflação e juros altos, desemprego, dólar caro, risco de apagão, conflitos institucionais, atropelo nas votações de projetos do Congresso e novos riscos fiscais obrigou economistas e investidores a reverem suas estimativas para o crescimento da economia no próximo ano para o mesmo patamar baixo comum nos anos pré-pandemia.

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