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Desaceleração da China traz incertezas para a economia brasileira e mundial

Crescimento menor tende a reduzir as exportações do Brasil para o país asiático, mas medidas do governo chinês para estimular a atividade devem amenizar o impacto

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Por Luciana Dyniewicz
Atualização:

A economia chinesa cresceu 8,1% no ano passado, no que foi a maior alta desde 2011, quando avançou 9,6%. O desempenho, no entanto, pode não ser tão positivo quanto o número sugere e coloca o mercado em dúvida em relação ao futuro da segunda maior potência global. O resultado tem relação com a base de comparação fraca. Em 2020, quando adotou uma quarentena rígida para conter a covid-19, a China avançou apenas 2,2%, número mais baixo para o país desde 1977. E o Produto Interno Bruto (PIB) da China também perdeu vigor durante o ano. No último trimestre, a alta foi de 4% na comparação com o mesmo período de 2020. No primeiro, no segundo e no terceiro trimestre, o incremento havia sido de 18,3%, 7,9% e 4,9%, respectivamente.

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O freio era esperado e reflete as medidas que o governo de Xi Jinping vem adotando para substituir o modelo de crescimento acelerado por outro mais sustentável. O objetivo é trocar, por exemplo, o foco do mercado externo pelo interno, implementar políticas para reduzir a emissão de gás carbônico e limitar a especulação imobiliária. O resultado no curto prazo dessa mudança de modelo econômico e o avanço da covid-19, no entanto, parecem ter preocupado Xi Jinping.

O presidente chinês pretende iniciar seu terceiro mandato no fim de 2022 e notícias negativas na economia podem não ajudar. Esse cenário fez com que, desde dezembro, o governo anunciasse medidas para suavizar a desaceleração - mas os economistas não têm certeza se elas serão suficientes.

“O governo estava preparado para a desaceleração e reconhece os riscos da disseminação da Ômicron, mas também está se preparando para que as reuniões de março (dois dos mais importantes congressos anuais do Partido Comunista) ocorram de forma tranquila",diz Larissa Wachholz, sócia da Vallya Participações, assessoria financeira com atuação no mercado chinês. "Para que haja um entendimento político para o terceiro mandato de Xi Jinping (que deve ser anunciado nas reuniões), a economia tem de estar tranquila também.” 

Pequim, na China; alta de casos de covid-19 e reformas adotadas pelo governo chinês tiraram o impulso do PIB Foto: Ng Han Guan/AP - 21/01/2022

Entre as políticas adotadas até agora para estimular a economia estão a redução do compulsório bancário e da taxa básica de juros. Corte em taxas de empréstimo também têm sido anunciadas e, em dezembro, o governo definiu de forma antecipada - e pouco usual - as cotas para emissão de títulos pelas municipalidades. “É um sinal de que o governo quer que (as cidades) gastem”, diz o economista especializado em China Livio Ribeiro, do Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getúlio Vargas (FGV/Ibre).

Ribeiro está entre os economistas que apostam que as novas medidas serão suficientes para segurar a desaceleração chinesa. Na última segunda-feira, 17, quando saiu o PIB da China de 2021, ele inclusive elevou sua previsão para 2022 de 4,8% para 5%. 

“O governo está deixando claro que vai ajudar o crescimento. A palavra da moda é ‘estabilização do crescimento’. Será um ataque cirúrgico. Nada semelhante aos estímulos de 2009 e 2010, mas um ajuste fino para sustentar a economia em patamares que o governo julga adequado”, diz Ribeiro.

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O economista destaca que, apesar da perda de ritmo no fim do ano passado, o PIB da China chegou a surpreender positivamente no último trimestre, ficando além das expectativas do mercado. O próprio Ibre projetava uma alta de 3,3% para o período.

Para 2022, Ribeiro espera que janeiro e fevereiro sejam mais fracos devido aos lockdowns que têm sido imposto para conter a covid. A economia, porém, deve ganhar um pouco de tração a partir de março, quando o resultado das medidas que vêm sendo anunciadas começará a ser percebido.

Diferentemente do Ibre, o Itaú Unibanco revisou suas projeções para a China para baixo: de 5,1% para 4,7%. O número é inferior ao que o governo de Xi Jinping deve anunciar, em março, como meta para 2022: algo entre 5% e 5,5%, segundo especialistas.

Economista do Itaú especializada em China, Laura Pitta afirma que as medidas econômicas de Xi Jinping são para “equilibrar pratinhos” e classifica o risco da Ômicron como grande. “A China adota uma política de tolerância zero em relação à covid. Isso leva à restrição de mobilidade e a implicações relevantes nos serviços.”

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Laura destaca que ainda são necessárias medidas mais claras para a construção civil, um dos pilares da economia chinesa. O governo vinha restringindo o acesso ao crédito para o setor, em uma tentativa de reduzir o risco financeiro do super alavancado mercado imobiliário. A política, no entanto, provocou desaceleração no segmento, que é um importante empregador e comprador de matérias-primas. “O setor é crucial para a economia chinesa e nossa principal preocupação hoje é com ele”, afirma Laura. 

Impacto

Apesar de o Brasil ter destinado 31,3% de suas exportações do ano passado para a China, o País não deve sofrer com a perda de ritmo da economia oriental, na visão do economista Luka Barbosa, também do Itaú. Isso porque, ao menos por enquanto, a demanda aquecida dos Estados Unidos deve compensar o impacto. “Achamos que as exportações totais vão crescer mesmo com a China desacelerando. Neste ano, ainda haverá um crescimento global que ajudará o País.”

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Segundo os cálculos do economista, para cada ponto porcentual que a China deixa de crescer, o PIB brasileiro pode perder 0,2 ponto porcentual. “Revisamos a economia da China em 0,4 (ponto porcentual). Isso daria (uma redução de) 0,1 ponto porcentual aqui. Não é algo relevante para se fazer uma revisão.” Barbosa frisa que a retração de 0,5% na economia brasileira prevista pelo Itaú para 2023 será resultado apenas da alta da taxa básica de juros, a Selic, e não do panorama internacional.

A Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) tem uma visão diferente e projeta redução de 4,7% nas exportações gerais do País. O presidente executivo da entidade, José Augusto de Castro, afirma ainda não ter estimativa da queda dos embarques para a China, mas destaca que haverá uma diminuição na comparação com 2021.

Por outro lado, a demanda aquecida nos Estados Unidos deve segurar o preço das commodities, sobretudo do minério de ferro - importante produto na cesta de exportações do Brasil para a China -, dizem os analistas. Além disso, se a economia chinesa realmente avançar entre 5% e 5,5% neste ano, as cotações das commodities devem ganhar reforço. 

“Mas a realidade dos preços do minério não é mais a mesma do primeiro semestre de 2021 e tenho dificuldade de enxergar que aquele movimento se repita. O conceito chinês hoje é estabilização, e não aceleração”, acrescenta Livio Ribeiro, do Ibre.