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Devolução de verba do BNDES ao Tesouro divide TCU

Para pelo menos quatro dos nove ministros, retorno imediato de R$ 100 bilhões emprestados pelo Tesouro seria ‘pedalada’

Foto do author André Borges
Foto do author Eduardo Rodrigues
Por André Borges e Eduardo Rodrigues
Atualização:

BRASÍLIA - A obtenção do aval do Tribunal de Contas da União (TCU) para a devolução de R$ 100 bilhões do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) aos cofres do Tesouro Nacional não será tarefa fácil para o governo. A operação, classificada pelo presidente em exercício Michel Temer como vital para ajudar no reequilíbrio das contas públicas, pode deixar a União novamente sob suspeita de irregularidade. Algumas avaliações são de que a antecipação de pagamento do banco público ao Tesouro pode configurar o financiamento da instituição ao governo.

O Estado apurou que ao menos quatro dos nove ministros da Corte de contas têm uma clara posição de resistência à proposta do governo, e veem na transação mais um clássico tipo de “pedalada”, ou seja, de apropriação indevida de recursos de bancos públicos para aliviar as contas federais.

Meirelles foi ao TCU para uma conversa com o presidente do tribunal Foto: Dida Sampaio|Estadão

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Apesar de o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, ter indicado há duas semanas que esta deveria ser uma transação trivial e que, “nos próximos dias”, o banco público liberaria uma primeira parcela de R$ 40 bilhões referente a empréstimos do Tesouro feitos anos atrás, os sinais são de que o tema caminha para um forte debate dentro do tribunal.

Segundo um dos ministros do TCU ouvidos pela reportagem, o que o governo propõe é adiantar a cobrança de um empréstimo dado ao BNDES que, por contrato, só teria de ser pago daqui a mais de 20 anos. Esse adiantamento infringe diretamente o que está previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal. “Não vejo como aprovar algo assim”, disse um ministro.

Entre 2009 e 2014, o Tesouro aportou R$ 440,8 bilhões no BNDES, a título de empréstimos de longo prazo. O objetivo inicial era estancar os efeitos da grave crise econômica mundial que começou no segundo semestre de 2008. O banco buscava suprir o vácuo deixado pelas instituições financeiras privadas, que secaram até linhas de capital de giro para as empresas.

Esses contratos de empréstimos previam prazos de 20 a 40 anos para pagamento. Hoje, a dívida do BNDES com o Tesouro, embutidos os juros, chega a R$ 514 bilhões. Na avaliação de alguns ministros, a proposta de adiantamento do governo é irregular, porque a lei proíbe o banco público de acelerar pagamentos de suas dívidas.

Para uma fonte do tribunal, uma forma de liberar a operação seria demonstrar que os empréstimos ao BNDES feitos pelo Tesouro (acionista único do banco) durante a gestão de Guido Mantega no Ministério da Fazenda seriam irregulares e que, portanto, agora teriam de ser desfeitos. Essa hipótese, porém, enfrenta resistências.

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Conversa. Nesta quinta-feira, 9, Henrique Meirelles foi ao TCU para uma conversa com o presidente do tribunal, Aroldo Cedraz. Estava acompanhado do ministro interino do Planejamento, Dyogo Oliveira, do secretário de política econômica do Ministério da Fazenda, Carlos Hamilton, e da presidente do BNDES, Maria Silvia Bastos Marques. No encontro, Meirelles reafirmou que “o propósito da política econômica é reduzir a evolução da dívida”. Apesar do encontro amistoso, não saíram do tribunal com a garantia de que a operação será aprovada, nem quando será votada.

Nos próximos dias, o Ministério da Fazenda vai enviar ao TCU uma consulta formal, com peças jurídicas e administrativas, para defender a legalidade e a necessidade da transação. O pedido será avaliado por técnicos da Secretaria de Macroavaliação Governamental (Semag). Essa avaliação foi determinada pelo ministro do TCU Raimundo Carreiro, com o propósito de “assegurar a observância às normas de direito financeiro em vigor e a preservação do interesse público”.

Após a conclusão dessa análise técnica, que tende a resultar em um parecer com sugestão de aprovação ou reprovação, o documento será encaminhado ao ministro Carreiro, que elaborará um voto sobre o tema. Só então o processo poderá ser votado em plenário.

Na semana passada, a proposta gerou mal-estar entre técnicos e ministros do TCU, após o procurador do Ministério Público de Contas, Júlio Marcelo de Oliveira, que foi veemente em apontar as pedaladas praticadas pela presidente afastada Dilma Rousseff, afirmar que a proposta de Michel Temer não infringiria a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Na Fazenda, a orientação é seguir à risca o que determinar o tribunal, para evitar qualquer tipo de ruído. O BNDES não comentou.