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Jornalista e colunista do Broadcast

Opinião|Dilema do Copom

Será mesmo o corte de juros o remédio adequado para ressuscitar a economia?

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Atualização:

A cada indicador de atividade econômica decepcionante, aumentam as apostas de que o Copom vai cortar os juros ainda este ano, uma vez que, segundo os defensores da redução da taxa Selic, restou apenas a política monetária como fonte de estímulo para tirar a economia brasileira dos braços da recessão. O Banco Central – e não o presidente Jair Bolsonaro ou mesmo o Congresso – virou o salvador da pátria.

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Será mesmo o corte de juros o remédio adequado – ou suficiente – para ressuscitar a economia em meio a um ambiente de agudas incertezas internas e externas?

De um lado, os que apostam em corte de juros neste ano dizem que o desemprego alto e a desaceleração recente da atividade elevaram o grau de ociosidade da economia e abriram o hiato do produto (a diferença entre o PIB corrente e o potencial) a tal ponto que, mesmo com uma recuperação mais vigorosa, caso o governo consiga destravar a sua agenda de reformas, a injeção de mais estímulo monetário não geraria uma pressão demasiada sobre a inflação.

De outro, os que defendem a manutenção dos juros em 6,50% em 2019 argumentam que, além das estimativas de inflação para 2020 e 2021 estarem neste momento exatamente na meta fixada pelo BC, de 4,0% e 3,75%, respectivamente, a incerteza sobre a aprovação da reforma da Previdência permanece elevada, afetando o prêmio de risco sobre os ativos brasileiros.

O dólar, por exemplo, vem se mantendo acima de R$ 4,00. Embora o nível de repasse aos preços da economia de uma desvalorização do câmbio tenha caído nos últimos anos, ele não é zero e em algum momento poderá pressionar a inflação, alertam os analistas que defendem a manutenção da Selic.

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Já o Banco Central até agora não sinalizou a possibilidade de reduzir a taxa Selic. De fato, conforme a mais recente ata do Copom, o BC mostrou preocupação com a atividade econômica ao destacar que o risco associado à ociosidade dos fatores de produção cresceu, o que reforçou a visão dos que querem um corte de juros.

Por outro lado, o BC ressaltou que “uma frustração das expectativas sobre a continuidade das reformas e ajustes necessários na economia brasileira podem afetar prêmios de risco e elevar a trajetória da inflação no horizonte relevante para a política monetária”. E disse ainda que esse risco se intensifica no caso de deterioração do cenário externo para economias emergentes. O BC descreveu o cenário externo como desafiador, citando o risco de desaceleração da economia global.

É bom lembrar que Ilan Goldfajn, o antecessor do presidente do BC, Roberto Campos Neto, parou de cortar juros na reunião do Copom de 16 maio de 2018, depois de ter reduzido a Selic de 14,25% para 6,50%, citando a frustração com as expectativas sobre a continuidade das reformas e o maior risco de reversão do cenário externo para economias emergentes. Tal conjuntura soa familiar? Campos Neto vem destacando em seus recentes discursos públicos o compromisso da instituição com a estabilidade de preços, ou seja, com a ancoragem da inflação e das expectativas inflacionárias.

Nesse sentido, enquanto a mediana das estimativas para o PIB de 2019 e 2020 vem caindo, os analistas não reduziram suas projeções para a inflação. Se o PIB potencial permanece praticamente o mesmo, por que a projeção de inflação não caiu com a revisão do crescimento em 2019 e 2020?

Conforme a pesquisa Focus, a estimativa do PIB de 2019 caiu de 2,55%, no fim do ano passado, para 1,24%, enquanto, no mesmo período, a projeção de inflação passou de 4,01% para 4,07%. Já a previsão para o PIB de 2020, que chegou a apontar crescimento de 2,80%, está agora em 2,50%, mas a projeção para a inflação segue em 4,00% há 98 semanas.

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Cortar a Selic em meio às incertezas sobre a aprovação da reforma da Previdência e a instabilidade política poderia ser contraproducente uma vez que esse ambiente adverso manteria elevadas as taxas dos contratos futuros de juros de longo prazo, as quais balizam o custo do dinheiro para as empresas que querem investir. Mesmo no cenário em que a reforma é aprovada, é preciso esperar como a economia vai reagir para mexer nos juros. O problema não é falta de crédito, e sim de confiança.

*É JORNALISTA DO BROADCAST

Opinião por Fábio Alves

Colunista do Broadcast

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