10 de janeiro de 2016 | 03h00
Na entrevista à imprensa, na quinta-feira, a presidente parecia sincera ao defender a reforma da Previdência e a elevação da idade mínima de acesso à aposentadoria. Mas ela sabe que enfrentará uma frente amplíssima de oposição dos camaradas amigos, a começar pelo PT, partidos aliados e de todo o baixo clero do Congresso – esse conjunto disforme que lhe deu apoio em troca de cargos, verbas e corrupção. Logo ela, desprovida de traquejo e habilidade política para negociar no idioma do troca-troca falado pelos parlamentares.
Urgentes antes mesmo do Plano Real (e lá se vão mais de 20 anos), as reformas (política, tributária, previdenciária, administrativa, trabalhista e sindical) dependem de emenda constitucional para serem aprovadas, portanto, de 2/3 de votos na Câmara e no Senado. Como conseguir tal proeza, fazê-las tramitar em apenas três anos e com um Congresso cada vez mais hostil ao governo? Ou Dilma resignou-se a cumprir seu papel e, se não tiver êxito, paciência, resta argumentar que tentou e volta para casa. Ou ela e o PT (Lula junto) se acertaram para falarem a públicos diferentes: ela dirige-se aos investidores no sentido de recuperar confiança, investimentos e crescimento econômico; e Lula e o PT tentam sair do volume morto com discurso político crítico ao governo e voltado para reconquistar apoio popular eleitoral. Se a estratégia tiver êxito ou fracassar, o País, os eleitores e o futuro dirão.
Para Dilma, a reforma da Previdência é a mais urgente pois é a que mais impacta o Orçamento da União com a multiplicação do déficit ano após ano. Além disso, a elevação da idade mínima é argumento aceitável por boa parte da população num país onde o número de idosos cresce em ritmo mais acelerado do que nascem crianças. A reforma tributária deveria ser mais urgente não só pelo poder de fazer justiça social (proporcionalmente à renda, os pobres no País pagam mais impostos que os ricos), mas também para simplificar a vida das empresas, com efeitos favoráveis em facilitar e atrair investimentos. Não foi tocada por FHC nem por Lula, muito menos por Dilma, seja por medo de perder receita tributária, seja porque ela implica extinguir privilégios e mexer em interesses de grupos poderosos. A administrativa visa a tornar mais leve o peso do custo do Estado aos contribuintes de impostos, ou seja, todos os brasileiros. E é dificultada pelo poder constituído, para proteger privilégios corporativos, e pela classe política viciada em apadrinhar funcionários que atuam no governo em favor de seus padrinhos e partidos.
Quando o PT assumiu o poder, em 2003, acreditava-se na rápida aprovação das reformas trabalhista e sindical – velhas conhecidas do então presidente Lula e, nos anos 1980, alvos de luta dos sindicatos do ABC paulista contra o peleguismo herdado da legislação varguista. Para discutir e formatar as duas reformas Lula escalou Osvaldo Bargas, companheiro das lutas sindicais e que acabou flagrado com uma boa soma de dinheiro no episódio que ficou conhecido como “dossiê dos aloprados”. E não se ouviu mais falar das duas reformas.
Porém, de todas elas, a reforma política é de longe a mais urgente, necessária e imprescindível. É uma espécie de mãe de todas as reformas, porque impõe limites e freia os abusos dos políticos que fazem as leis do País. Dela eles fogem como o diabo foge da cruz.
* SUELY CALDAS É JORNALISTA E PROFESSORA DA PUC-RIO
E-MAIL: SUCALDAS@TERRA.COM.BR
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