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Dilma coloca foco no investimento e agrada agências de rating

Fitch, Moody's e Standard & Poor's foram unânimes em dizer que o programa é ‘positivo’ e que o governo está na ‘direção certa’

Por Luciana Antonello Xavier e da Agência Estado
Atualização:

SÃO PAULO - O Brasil cresce pouco e não tem mais a posição de queridinho dos investidores, mas o governo de Dilma Rousseff agradou as três principais agências de classificação de risco ao promover uma mudança na sua política de estímulo ao crescimento, com seu plano de investimento em infraestrutura, anunciado na semana passada. Os responsáveis pela análise das notas de crédito do Brasil da Fitch, Moody's e Standard & Poor's foram unânimes em dizer, em entrevistas exclusivas à Agência Estado, que o programa é "positivo" e que o governo está na "direção certa".

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O que as agências destacam é que, no lugar de seguir com estímulos de curto prazo para a demanda doméstica, que é um tiro de alcance limitado, o governo finalmente resolveu mirar a ampliação da oferta no longo prazo e acabar com os gargalos de infraestrutura que impedem um crescimento sustentado. Uma tecla na qual as agências vem batendo há anos. "Parece que esta administração resolveu colocar sua estratégia econômica mais voltada para a oferta do que para o lado da demanda", observou o vice-presidente da Moody's, Mauro Leos.

"Assumindo que todo o plano de infraestrutura será implementado, ele é positivo", comentou a diretora-gerente de ratings soberanos da S&P, Lisa Schineller. A S&P foi a primeira agência a classificar o Brasil como grau de investimento, em abril de 2008.

Outro ponto importante foi o fato de o governo Dilma ter decidido andar de braços dados com o setor privado para que os investimentos em infraestrutura caminhem a passos mais largos. Dos R$ 133 bilhões que devem ser investidos em ferrovias e rodovias por meio do Programa de Investimento em Logística nos próximos 25 anos, R$ 91 bilhões devem vir do setor privado.

"O plano de infraestrutura vai na direção certa. O Brasil precisa fazer progressos em infraestrutura. O que é encorajador é que o governo fez uma abordagem pragmática, tratando das necessidades em infraestrutura junto com o setor privado", ressalta Shelly Shetty, chefe de ratings soberanos para América Latina da Fitch.

Leos, da Moody's, notou claramente essa diferença na estratégia do governo durante sua visita ao Brasil, feita na semana passada, exatamente quando foi lançado o novo plano de investimento. Durante os dias em que esteve no País, Leos se encontrou tanto com oficiais do governo como com o setor privado.

"Parece haver essa percepção de que o investimento privado pode ser mais dinâmico, dar um choque mais imediato. São mudanças fundamentais no modo como o governo olha a economia, com esse novo enfoque que estão tendo agora", disse. "Este é o lado positivo do crescimento baixo: fez o governo se mover em outra direção", completou.

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Schineller afirma que ainda que levem anos para todo o plano ser implementado, ele deve influenciar de modo mais imediato no sentimento do investidor. "Vai levar tempo. Não significa dizer que teremos tudo hoje ou no ano que vem. No entanto, se as expectativas ficam mais otimistas, só isso já ajuda o sentimento nos negócios. É um passo na direção certa. Atinge uma questão-chave do Brasil, que é o gargalo em infraestrutura", disse. "Há tempos enfatizávamos que esses gargalos seguravam os investimentos" , acrescentou Schineller. Shetty, da Fitch, também avalia que essa nova estratégia deve ter "impacto positivo na confiança do investidor".

Juro baixo

Os executivos das três agências de rating destacaram também que o Brasil convive agora um novo patamar baixo para os juros, algo sem precedentes na história de um País que já teve Selic em 45%, em março de 1999, e que atualmente está em 8% e pode cair abaixo desse nível na reunião do Comitê do Política Monetária (Copom) do Banco Central na próxima semana.

Leos comentou que conversou sobre o tema com empresários quando esteve no Brasil este mês. "O mais importante na discussão com o setor privado é que todos parecem concordar que há um novo patamar mais baixo de juros. Ainda que possa haver um aumento nos juros mais pra frente, a maioria espera que o nível de referência seja mais baixo. Isso criará espaço fiscal", ressalta.

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O vice-presidente da Moody's lembrou que a agência sempre destacou que "havia espaço fiscal relativamente limitado no caso do Brasil" e que isso agora está mudando. Segundo ele, será importante ver como o governo usará esse espaço fiscal. "Há dois modos de usar o espaço fiscal: gastar mais ou arrecadar menos impostos", explica. "O que é interessante e diferente é que parece haver a intenção de baixar a carga tributária de modo mais permanente e de maneira mais generalizada". Para as agências, embora a questão fiscal tenha deixado um pouco os holofotes é importante que o governo siga mantendo seu compromisso de cumprimento da meta de superávit primário.

Crescimento

Nenhuma das agências espera que o Brasil cresça mais do que 2,5% este ano, mas uma vez que um rating não é definido com base em eventos de curto prazo, mas em perspectivas de crédito para o investidor em prazos mais longos, crescer pouco deixa de ser o maior dos problemas. Especialmente quando o mundo, de modo geral, está crescendo muito pouco.

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"O Brasil tem passado por uma desaceleração econômica mais longa e vários fatores levaram a essa desaceleração, tanto domésticos como externos. No entanto, achamos que o Brasil tem recebido um bom nível de estímulos tanto monetário, com corte de juros, como com medidas macroprudenciais", disse Shelly Shetty, da Fitch.

"Acreditamos que haverá alguma recuperação da economia olhando para frente. No entanto, mesmo com a melhora de alguns indicadores, ainda é cedo para dizer quão rápida será a recuperação", disse Shetty. Das três agências, a Fitch é a que tem projeção de expansão do Produto Interno Bruto (PIB) mais alta para 2012, de 2,5%, e de 4,5% em 2013. "Nosso cenário básico para o Brasil está mais para o lado otimista. Embora claramente vemos os riscos para baixo (nas projeções)", salientou a analista.

A Moody's trabalha com uma previsão de crescimento do PIB de 1,5% a 2% em 2012 e de 4% "ou abaixo" disso em 2013. A S&P prevê que o Brasil crescerá ao redor de 2% este ano e 3,5% em 2013, mas também frisa que os riscos são para baixo e lembrou que em setembro a agência reverá suas projeções de PIB para o Brasil e outros países.

"Todos estamos assumindo que teremos uma recuperação neste segundo semestre. Há indicadores mostrando alguma melhora. Mas é surpreendente como ainda não tivemos mais impacto da política de alívio monetário", comentou Lisa Schineller, da S&P. Segundo ela, essa demora em se ver os efeitos do processo de cortes da Selic iniciado no ano passado se deve às incertezas no cenário internacional. Apesar de haver algum sinal de melhora doméstica, Schineller deixa claro que é "importante ser cauteloso".

Essa cautela deve ser observada pelo BC, como destaca a executiva da Fitch. "Se a economia melhorar de modo mais forte, então claramente o BC terá que colocar o foco nas pressões inflacionárias".

Rating

A estratégia do governo de focar em estímulos ao investimento não quer dizer que haverá elevação do rating do Brasil, mas é um passo benéfico para um País que ainda está no segundo degrau numa escala de dez na categoria de grau de investimento.

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Entre as três agências de rating, a que parece mais perto de promover uma melhora na nota do País é a Moody's. A visita de Leos ao Brasil na semana passada já tinha como objetivo analisar as condições econômicas para iniciar ainda este ano o processo de revisão. A nota de crédito de longo prazo em moeda estrangeira do Brasil pela Moody's é Baa2, com perspectiva positiva. Leos tem sinalizado que um upgrade pode estar a caminho até o final deste ano.

A S&P elevou o Brasil para BBB, com perspectiva estável, no ano passado, o que reduz as chances de um upgrade do País este ano, visto que a perspectiva primeiro deve ser colocada para positiva. Já a Fitch reafirmou em julho o rating BBB do Brasil, com perspectiva estável.

"A dinâmica do rating do Brasil continua a ser estável", disse Shetty, da Fitch. Segundo ela, a agência não vê riscos que pudessem levar a um eventual rebaixamento. "No lado positivo, o que estamos olhando para considerar um upgrade é a melhora sustentável no mix de políticas. Mas, por enquanto, não vemos nem pressões negativas nem positivas no rating".

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