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Dívida do governo volta ao radar dos economistas

Deterioração ocorre praticamente só nas contas do governo federal

Por Fernando Nakagawa
Atualização:

O efeito mais preocupante da crise econômica mundial sobre as contas públicas brasileiras fica cada vez mais evidente. Nos últimos sete meses, um dos principais indicadores que mostram a sustentabilidade dos gastos do governo apresentou piora ininterrupta, no mais longo período de deterioração desde a criação da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), no ano 2000. Desde dezembro do ano passado, a relação entre a dívida líquida do setor público e o Produto Interno Bruto (PIB) subiu 5,4 pontos. Para as agências de classificação de risco, esse comportamento ainda não é um problema, desde que o resultado se estabilize ou caia no ano que vem. Mas há dúvida se haverá espaço para melhora em 2010, ano de eleições. Dados do Banco Central (BC) mostram que o índice que mede o endividamento do setor público - governo federal, Estados, municípios e empresas estatais - atingiu 43,1% do PIB em junho e regrediu para o nível de fevereiro do ano passado. A deterioração vista desde dezembro foi patrocinada praticamente apenas pelo governo federal, cuja dívida subiu 5,1 pontos porcentuais no período. Enquanto isso, a dívida dos Estados aumentou apenas 0,1 ponto porcentual e a dos municípios não se alterou. "A elevação da dívida aconteceu em muitos países porque os déficits aumentaram com a queda da arrecadação e a alta do gasto público", explica o diretor regional da agência Moody?s para a América Latina, o mexicano Mauro Leos. Com a crise econômica, a arrecadação de impostos diminuiu, na esteira da queda da atividade econômica. Ao mesmo tempo, os governos passaram a gastar mais para amenizar a crise, a chamada política anticíclica. Leos é responsável pela nota brasileira na Moody?s, que desde o início de julho revisa o rating do Brasil e há possibilidade de que avaliação seja melhorada, o que levaria o País ao grau de investimento. A Moody?s é a única entre as três grandes agências de classificação de risco que ainda não conferiu o grau de investimento (investment grade) ao Brasil. Ainda este mês, Leos terá uma série de reuniões com a equipe econômica do governo em Brasília para avaliar os dados mais recentes da economia. Do escritório em Nova York, o diretor da Moody?s diz que o aumento da dívida por si só não é "necessariamente um motivo de preocupação". Segundo Leos, a piora da dívida era esperada em um período turbulento como o vivido desde o ano passado. "Mas a preocupação poderia surgir em 2010, quando esperamos melhora da economia. Se os indicadores da dívida não forem estabilizados ou mesmo começarem a cair, haveria um motivo para se preocupar", diz ele, ao lembrar que o Brasil também terá eleições presidenciais no próximo ano. AGÊNCIAS DE RISCO O analista de crédito da Standard & Poor?s Sebastián Brizzo concorda com a avaliação tranquila sobre o comportamento recente da dívida. Mas observa que o mercado financeiro passará a avaliar com lupa a capacidade do governo de retomar um comportamento mais austero nos próximos meses. "O importante será manter a política fiscal no médio e longo prazos. Será preciso mostrar pelo menos uma estabilização da dívida", observou. Por enquanto, a Moody?s e a S&P confiam na "demonstração de boa vontade" do governo brasileiro quanto à política fiscal. A equipe econômica tem dito que o aumento do gasto neste ano é pontual e, com a dissipação dos efeitos da crise, o rigor voltará a ser visto nas contas. "O ano de 2010 com as eleições é, claramente, um grande desafio. É preciso esperar a resposta da política fiscal à essa questão", diz Brizzo. Além da atenção especial com os passos do governo no próximo ano, as duas principais agências de classificação de risco chamam a atenção para o nível do endividamento do Brasil. As duas agências lembram que a dívida bruta do governo federal fechou em 63,7% do PIB em julho. "O nível brasileiro ainda é muito elevado, se comparado com outros países. O México, por exemplo, está perto de 30% e o Peru, próximo de 25%", afirma o diretor da Moody?s. Para Brizzo, reduzir esse nível é, atualmente, o principal desafio da política fiscal brasileira.

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