PUBLICIDADE

Publicidade

'Vamos testar uma alíquota progressiva para imposto sobre dividendos', diz relator de projeto do IR

Relator do projeto do Imposto de Renda antecipa ajustes, como uma tabela progressiva para lucros e dividendos

Foto do author Adriana Fernandes
Por Adriana Fernandes e Camila Turtelli
Atualização:

BRASÍLIA - Relator do projeto que altera o Imposto de Renda (IR), o deputado Celso Sabino (PSDB-PA), afasta a possibilidade de risco para as contas públicas com a votação do seu parecer, que prevê uma redução agressiva do imposto das empresas (IRPJ). O parecer foi apresentado aos líderes, na semana passada, prevendo uma queda de R$ 30 bilhões na arrecadação sem compensação. Sabino diz que não haverá redução de receitas porque a economia vai reagir positivamente à reforma com mais crescimento. “Zero de aumentar o déficit público”, diz. Na entrevista, ele antecipa ajustes adicionais que vai fazer no parecer, como uma tabela progressiva para a volta da tributação de lucros e dividendos. Não está descartada a possibilidade de ter uma faixa mais alta, acima da alíquota dos 20% previstos no projeto original. A distribuição de dividendos entre empresas coligadas também pode ficar isenta. O Estadão/Broadcast entrevistou o relator após ele se reunir com representantes dos shoppings centers.

PUBLICIDADE

Como recebeu as críticas ao seu relatório?

É natural que ele continue a ser aperfeiçoado. Demos o primeiro passo. A partir de agora, os deputados estão apresentando sugestões. O presidente (da Câmara, Arthur) Lira me pediu para fazer um esforço extra para reunir todas as bancadas e esclarecer e colher sugestões e críticas. Mas é importante destacar que o mercado reagiu muito bem. No dia da divulgação, a Bolsa no Brasil subiu, na contramão das do resto do mundo.

Por outro lado, muitos acham que há uma queda muito forte no IRPJ. O parecer não está na contramão do cenário internacional? Os países estão aumentando a tributação das empresas para fazer frente aos gastos com a pandemia.

Essa não é a reforma tributária da empresa A ou B ou de qualquer setor da economia e, sim, a maior reforma trabalhista de geração de emprego que o país poderia ter, com uma alíquota de 2,5% de IR.  Essa é a reforma que fará o País crescer. Estamos favorecendo os investimentos em capital, retendo mais recursos dentro da empresa para a implementação de novos projetos e apostamos em mais geração de emprego.

Há especialistas que apontam que o seu parecer acabou beneficiando os super-ricos?

Ao contrário, tributamos os mais ricos com lucros e dividendos, tributando as grandes fortunas através dos fundos exclusivos fechados criados para administrar os seus patrimônios. Vamos alcançar esses R$ 230 bilhões (de 20 mil contribuintes mais ricos) que foram declarados e não tributados.

Publicidade

Sabino diz que o parecer para a Câmara dos Deputados 'vai na jugular dos bancos'. Foto: Dida Sampaio/Estadão

O sr. diz que o pobre não consegue fazer lobby, mas as grandes empresas e os bancos conseguiram mudanças no seu parecer.

Não é verdade. Nós fizemos ajustes para adequar o projeto e simplificar. O que estamos tributando menos é o capital produtivo que está investido em máquina, fábrica, em shopping, construindo edifício e gerando emprego. E a classe média está amplamente contemplada com a atualização do IR.

O parecer final trará ajustes na tributação de lucros e dividendos?

Mantivemos a proposta inicial do governo de isenção de até R$ 20 mil para quem recebe lucros e dividendos distribuídos de micro e pequenas empresas, mas essa parte ainda está em maturação, assim como outras do projeto. Durante a tramitação, aperfeiçoaremos.

Quais serão os principais ajustes?

Os lucros dividendos serão tributados, não importa para quem sejam distribuídos. Nós retiramos do texto a possibilidade de tributação na distribuição entre empresas do mesmo grupo econômico, desde que sejam entre controladas e controladoras. E, agora, estamos estudando a possibilidade de incluir também as empresas coligadas, que não são controladas, mas investem numa sociedade de propósito específico ou em determinado projeto de uma corporação.

O sr. pode dar um exemplo?

Publicidade

Por exemplo, um empreendimento vai ser construído. Então, é criada uma sociedade. Estamos estudando a possibilidade de incluir no texto que outras empresas, que sejam coligadas que tenham 10% ou 20% daquele projeto, possam também não ter os seus dividendos tributados.

No seu parecer, o sr. vai adotar uma tributação de lucro e dividendos progressiva ao invés de uma alíquota única de 20%?

Nós estamos fazendo as contas e vamos testar todas as possibilidades na Câmara e durante o aprimoramento do projeto no Legislativo federal. Há possibilidade sim de haver algumas alterações nesse item.

Como funcionaria essa progressividade?

Sem falar em números, por que vou chutar. Seria assim, isenção (para quem recebe até) R$ 2,5 mil,  até R$ 5 mil pagaria 5%; até R$ 10 mil pagaria 10%; até R$ 15 mil, 15%; R$ 20 mil, 20% e daí para cima uma outra alíquota, por exemplo.

Poderia ter mais do que 20%?

É. A progressividade cumpre o papel de justiça fiscal, os que ganham menos pagam menos e os que ganham mais pagam mais. Essa é vantagem.

Publicidade

A redução da faixa de isenção de R$ 20 mil para R$ 2,5 mil na tributação de lucros e dividendos não agrava o problema da pejotização?

Estamos partindo para um novo modelo, redirecionando a carga. Ao invés de tributar o capital produtivo, tributar mais a renda quando sai da empresa. Esse novo modelo está passível de ajustes até chegarmos ao modelo ideal. Pode ser que venha a tabela progressiva e a isenção seja ampliada para demais empresas. Estamos fazendo conta.

Haverá novas mudanças no fim da dedução do Juros sobre Capital Próprio (JCP) ?

Não. 75% de JCP são de bancos. Vamos tirar a dedutibilidade de JCP (uma forma de as empresas remunerarem os acionistas com vantagens tributárias). Vamos aumentar a carga sobre os bancos.

O presidente da Febraban elogiou as mudanças no projeto?

Eu não vi essas palmas, não. Onde foi? Vai direto na jugular dos bancos. Ou seja, estamos tributando os bancos, os mais ricos, as grandes fortunas e corrigindo a tabela do IRPF para metade não pagar nada.

Os Estados e municípios divulgaram duas cartas muito duras pedindo a paralisação do projeto. O sr. acha justa a queixa?

Publicidade

Absolutamente injusta. Não haverá queda de arrecadação e a pujança da economia, a partir da implantação desses projetos, permitirá que os negócios cresçam e os empreendimentos se multipliquem. Haverá incremento de arrecadação de ICMS (principal tributo estadual) e ISS (tributo municipal). Todos vão ganhar. Quero registrar que eles estão recebendo valores históricos, batendo recordes, de FPE e FPM (fundos de transferências). E estão experimentando recordes de arrecadação própria. Vai ser maravilhoso para eles. Já estamos ouvindo e estou à disposição dos governadores e prefeitos.

Os governadores têm força no Congresso. Corre o risco de a reforma ser paralisada?

Os empreendedores do Brasil, as pessoas que acreditam no País, vão se manifestar a favor.

O seu parecer aposta muito na redução de renúncias para compensar a perda de arrecadação, mas tem sido  muito difícil cortá-las. Não é uma aposta frágil?

O Executivo precisa cortar os benefícios que concede por força da PEC emergencial (que autorizou uma nova rodada do auxílio emergencial).  Tendo ou não tendo reforma tributária. Ninguém quer perder o suporte a uma maior competitividade. Mas vai ter que acontecer isso. Hoje, por exemplo, é possível comprar um veículo gol pagando todos os impostos federais. Agora, se você comprar um iate de luxo ou um jatinho particular não paga o tributo. Não é pouco não. São R$ 4 bilhões da indústria aeronáutica e naval.

Quais foram os critérios para escolher os setores?

Tudo que eu pude pegar, eu pequei. Esse foi o critério. Se eu pudesse, pegava mais. O que eu não consegui colocar é porque já está comprometido no projeto da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços, que unifica o PIS/Cofins e está em tramitação na Câmara) ou porque o prazo de validade de terminar o benefício.

Publicidade

O projeto corta incentivos do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT), medida que foi muito criticada.

O PAT é um importante mecanismo que beneficia empresas e empregados. Ele permite que empresas promovam alimentos para os trabalhadores e tem para isso quatro estímulos. Propomos revogar o quarto: o valor pago de PAT até o limite de 4% do imposto devido pela empresa pode ser abatido diretamente do imposto. Os três outros que permanecem continuarão sendo benéficos.

O sr. não vai mudar esse ponto?

O PAT vai continuar, vale-alimentação, vale-refeição e continuará sendo interessante para a empresa e o trabalhador. Com a redução do IRPJ, a empresa que paga o PAT vai ter mais lucro. O restaurante também. A economia vai se desenvolver e vai ter gente mais empregada e mais gente recebendo o ticket alimentação. Estão surgindo fake news de que vai acabar. Estive com o presidente das associações de shoppings e falaram que vão continuar com o PAT e que vão apoiar publicamente.

O sr. acredita que essas renúncias serão cortadas, está confiante?

Eu acredito que um benefício a 1,1 milhão empresas  e para o desenvolvimento econômico que vai ser promovido, vai falar mais alto.

Dizem que a Receita está preocupada com essa queda do IR.

Publicidade

A Receita tem a obrigação de ser prudente,de fazer os cálculos pautados no princípio da prudência e com muita responsabilidade. Muitos cálculos eu fiz com eles. Pudemos rever algumas projeções de arrecadação.

Se as projeções não se confirmarem, vai aumentar o rombo das contas públicas. O sr. não se preocupa?

Zero de aumentar o déficit público. No segundo semestre, vamos ter uma arrecadação maior do que foi planejado, da meta que foi estabelecida. Vai bater com folga nos próximos quatro, cinco anos. 

O sr. pensa em reduzir essa queda, esse buraco, na arrecadação?  

Não vai ter queda de arrecadação. Por prudência, a lei nos impõe que faça as projeções para o futuro com base na economia atual. Se a economia continuar da mesma forma, teremos uma redução de R$ 30 bilhões. Só que a economia não vai ficar da mesma forma. A economia vai explodir. O exemplo que aconteceu na Bolsa na terça-feira (quando o parecer saiu), ocorrerá no ano que vem. 

Será mantida a queda da alíquota do IRPJ em 12,5 pontos porcentuais no parecer final?

Para manter, precisamosmanter o texto da forma como está. Se tivermos que mexer no benefício ou em alguma outra situação, vamos ter que mudar a proposta de 12,5 pontos porcentuais e rever a questão de lucro real, de alguns fundos que tiramos a tributação. Mas acredito que não porque a receptividade foi muito boa nos líderes da base. Estou recebendo muita manifestação de apoio.

Publicidade

Quando o projeto do IR vai para votação no plenário? 

Em agosto. 

O setor de serviços está preocupado com o projeto e acham que vai aumentar a carga. O sr. tem alguma resposta para eles?

Preocupados com que, se vai abaixar a alíquota de 15% para 2,5%.

O sr. tirou todas as medidas antielisão e combate a sonegação fiscal, mas a Receita diz que precisa delas para fiscalizar. Como é que fica?

Vamos organizar junto com a Receita o envio de um novo projeto que tenha afinidade para tratar de sonegação, elisão, diferimento. Eu já tirei do relatório. Essa página está virada.

Como o sr. vai convencer porque existe também oposição ao parecer?

Publicidade

Tem que falar com o pessoal do mercado. Eles amaram, as construtoras amaram, a indústria amou, os shoppings também.

No ano que vem, tem eleição. Os críticos avaliam que esse projeto do governo é populista ?

Uma (hora) a proposta é ruim porque faz isso e isso... A proposta é boa porque é populista. Mas eu vou responder. Este ano não é ano eleitoral. Ainda mais seria responsabilidade de qualquer um pensar em repercussão eleitoral quando temos uma decisão muito mais importante para tomar que é o futuro da economia do Brasil.

A manutenção da restrição ao uso do desconto simplificado do IR para pessoas físicas prejudica a classe média? Essa restrição vai continuar?

O desconto simplificado limitamos para quem ganha até R$ 40 mil por ano, ou seja R$ 3.333 por mês. Qualquer pessoa em qualquer faixa de arrecadação, que tiver um INSS e um dependente apenas para descontar, terá redução de carga tributária. Estamos mantendo todas as possibilidades de deduções (como gastos com saúde e educação que diminuem o imposto a pagar ou aumentam a restituição) que já existem hoje. Todas.

A OAB pediu uma exceção para os advogados. Será concedida?

A princípio, não estou planejando fazer diferenciação para nenhum grupo da nossa sociedade.

Como está a sua relação com o ministro Paulo Guedes que apresentou um projeto muito diferente do seu parecer?

O ministro é um grande entusiasta das ideias que nós oferecemos ao relatório e ele tem contribuído. Ele tem defendido as mudanças. Quero fazer justiça a Receita e ao ministro que escolheram o caminho a ser seguido e que está muito correto. Nosso trabalho tem sido de organização de ideias que têm sido construídas junto com a Receita.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.