
30 Outubro 2018 | 04h00
A eleição terminou e Jair Bolsonaro está eleito democraticamente. Não foi minha opção, mas foi a opção da maioria dos brasileiros, e temos de respeitá-la.
Mas o Brasil está rachado, e, se nada for feito, o fosso entre os dois lados pode se ampliar ainda mais, não apenas azedando as relações sociais, mas também dificultando a superação da crise econômica que vivemos.
Agora é hora de criar condições para que o debate democrático siga seu rumo de forma civilizada e que o País faça as mudanças necessárias para que o crescimento econômico seja recuperado de forma sustentada.
É hora de tratar as divergências próprias do jogo democrático segundo as regras deste jogo, mesmo que não gostemos do resultado. Se a agenda do governo contemplar medidas das quais discordamos – como facilitar a aquisição de armas de fogo ou fragilizar a legislação ambiental –, vamos nos opor e defender nossas posições no Congresso Nacional. E se o resultado não for o que esperamos, buscar revertê-lo nas próximas eleições.
É hora de entender que a superação da crise econômica que estamos vivendo exige medidas duras de ajuste das contas públicas, a começar pela reforma da Previdência, e uma agenda de reformas voltadas a ampliar o potencial de crescimento do Brasil no longo prazo. Sei que é quase impossível que isso ocorra, mas a oposição não deveria sair criticando de forma oportunista medidas que sabe que seu candidato teria de adotar se fosse eleito. Desse ponto de vista, é admirável a atitude assumida pelo senador Tasso Jereissati, antes do primeiro turno das eleições, reconhecendo que o PSDB não deveria ter apoiado, no governo do PT, medidas que sabia que seriam ruins para a economia.
No entanto, se a oposição tem um papel a desempenhar, a construção de uma trajetória que não acirre ainda mais os ânimos nos próximos anos depende essencialmente do presidente eleito e da incorporação – em seu discurso e em sua prática – de um claro compromisso com os princípios republicanos.
É hora de Bolsonaro entender que a oposição é essencial para a democracia e que só pode ser vencida no debate e nas urnas. É hora de reforçar a importância de uma imprensa livre, e não buscar reprimir ou retaliar os críticos de sua campanha e de seu governo. É hora de aceitar incondicionalmente os princípios constitucionais democráticos e a independência dos Poderes, e não buscar distorcê-los a seu favor.
É hora, sobretudo, de abandonar o discurso de ódio que pautou sua campanha e mostrar que o governo não admitirá qualquer forma de intolerância e violência contra minorias e contra seus oponentes. É hora, em suma, de Bolsonaro provar que os temerosos com sua eleição – entre os quais eu me incluo – estavam errados.
Temos instituições que podem servir como contrapesos e impedir que uma atuação vingativa do Executivo comprometa a permanência do Estado Democrático no Brasil. Mas, neste momento, isso não seria suficiente para impedir que o clima político no País azedasse ainda mais.
Não é hora de a oposição apostar no “quanto pior, melhor”, pois, ao fazê-lo, valida uma postura intolerante do governo, além de prejudicar a implementação de medidas importantes para a superação da crise. No fim, quem paga a conta são todos os brasileiros.
Mas é hora, sobretudo, de o presidente eleito mostrar que vai atuar para reduzir as tensões no País. Sem uma sinalização clara de que irá abandonar o discurso de destruição de seus opositores e de que irá atuar dentro das regras do Estado de Direito, Bolsonaro estará legitimando um posicionamento intransigente de seus opositores.
O dissenso faz parte da democracia. O ódio – de lado a lado – faz parte de outra esfera da política. Talvez o aprofundamento da vala que se abriu entre os brasileiros seja inevitável. Eu espero que não.
*DIRETOR DO CENTRO DE CIDADANIA FISCAL
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