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Jornalista e comentarista de economia

Opinião|E as questões de fundo?

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Atualização:

Tanto o governo federal como os estaduais apressam-se a atender a algumas das reivindicações apresentadas nas manifestações que acontecem há três semanas pelo Brasil. O risco é de que se limitem a resolver apenas os problemas imediatos e não os de fundo, que são as distorções da economia, como os gastos públicos desordenados e a inflação.Na semana passada, em ação coordenada pelo governo federal, governadores e prefeitos trataram de cancelar os reajustes da condução. Em São Paulo, por exemplo, o aumento de R$ 0,20 nas tarifas de ônibus e metrô foi sumariamente cancelado e não apenas adiado, como já tinha sido. E, ontem, o governador Geraldo Alckmin antecipou-se às manifestações e tratou de cancelar novo reajuste do pedágio.Além disso, a presidente Dilma, governadores e prefeitos se dispuseram a dialogar com as lideranças dos movimentos para terem melhores condições de atender às reivindicações. Paralelamente a essas iniciativas, aumenta a pressão para resolver as principais questões políticas mostradas pela rua, como a falta de representação dos jovens e das novas classes médias nos fóruns de decisão política e econômica. Daí as inúmeras declarações de que deva ser necessário apressar a reforma política, pleito com que ainda no período Lula o governo já se havia comprometido, mas ao qual não deu seguimento.São providências necessárias e, até certo ponto, inadiáveis. Portanto, têm de ser levadas adiante. No entanto, infelizmente, não se vê a mesma disposição das autoridades em atender às mais importantes questões econômicas de fundo, que são as causas do descontentamento.No discurso de sexta-feira em cadeia de rádio e TV, a presidente Dilma não se referiu a nenhuma das questões econômicas que permeiam a falta de confiança e a insatisfação da sociedade.É óbvio que os reajustes das tarifas de condução não são o problema principal. Ele está na inflação que impôs os reajustes. A inflação, por sua vez, voltou a disparar em consequência de outros desajustes, sobre os quais até mesmo o Banco Central tem se manifestado reiteradamente e que permanecem sem resposta.No pronunciamento de sexta-feira, a presidente Dilma não fez nenhuma referência, nem explícita nem implícita, às causas econômicas dos atuais distúrbios políticos e sociais. Isso não significa que as ignore. Mas, à falta desse foco, a sociedade corre o risco de que as doenças subjacentes permaneçam sem tratamento. A simples eliminação dos reajustes da condução e do pedágio, por exemplo, tende a aprofundar os atuais desequilíbrios orçamentários. As receitas serão mais baixas e as subvenções tendem a aumentar. Como o impacto sobre a atividade econômica tende a ser ainda mais acentuado pelo crescimento mais baixo, as receitas públicas sofrerão ainda mais. E, se a tudo isso se juntar a crescente deterioração da confiança no governo, então estamos diante de um quadro que exige bem mais atenção das autoridades do que a que vem sendo dispensada. Ontem, a presidente Dilma anunciou a amarração de um Pacto de Estabilidade Fiscal. Pode ser um bom recomeço, embora não se saiba ainda o que isso significa.

Opinião por Celso Ming

Comentarista de Economia

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