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É conveniente reduzir a meta de inflação

O Conselho Monetário Nacional deverá decidir em junho a meta a ser perseguida pelo Banco Central em 2019

Por Claudio Adilson Gonçalez
Atualização:

Em junho, o Conselho Monetário Nacional (CMN) ratificará (ou retificará) a meta de inflação para 2018, bem como estabelecerá o valor a ser perseguido pelo Banco Central (BC) em 2019. Os debates em relação a essa decisão já estão acalorados, com defesas enfáticas das duas posições, seja ela contrária ou a favor da redução da meta.

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O interessante é que não se trata da conhecida divergência entre economistas heterodoxos, que sempre defendem queda da taxa básica de juro, quaisquer que sejam os níveis em que esta e a inflação se encontrem, e os ortodoxos, em geral mais preocupados com a estabilidade de preços.

Os argumentos dos contrários à redução da meta podem ser resumidos nos seguintes pontos:

l a teoria econômica e a evidência empírica sustentam que a taxa de crescimento de longo prazo de uma economia não é afetada pelo nível da inflação. Assim, não faz sentido, como defendem os heterodoxos, um pouco mais de inflação para obter crescimento maior. Da mesma forma, uma inflação estabilizada, digamos, em 7% ou 8% ao ano, também não seria danosa ao crescimento, já que, se estável, os agentes a incorporam em suas decisões econômicas;

l em função do que foi dito acima, não valeria a pena o governo buscar níveis muito baixos de inflação no Brasil, exatamente num momento em que a economia dá sinais ainda incipientes de recuperação de uma das mais perversas recessões de sua história. Se assim o fizesse, o BC teria de praticar uma política monetária mais apertada, com prejuízos para a retomada do crescimento e para a estabilidade da relação dívida/PIB;

l a rigidez salarial no Brasil, tanto nominal, em razão de mandamento constitucional, quanto real, em razão da indexação, tornaria o custo de desinflacionar muito elevado.

Do ponto de vista teórico, não há nada de errado nos argumentos aqui listados. A falha em usá-los para criticar a redução da meta de inflação está em não considerar algumas particularidades específicas da nossa economia. Basicamente, minimizam-se os efeitos da inércia (em grande parte explicada pela indexação) e das expectativas na formação da taxa de inflação. Em conjunto, essas variáveis contribuíram com quase 80% do IPCA registrado em 2016, conforme estudo realizado pela MCM Consultores.

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Ocorre que a própria indexação torna frágil o argumento de que não haveria problema em manter um nível mais elevado de inflação no Brasil. Eventual choque de oferta, como, por exemplo, uma alta de preços agrícolas em razão de problemas meteorológicos, ao ser incorporada aos reajustes de salários e contratos indexados, tende a se transformar em inflação permanente, ameaçando a estabilidade da taxa inflacionária. Pior: quanto mais alta a inflação, maior será o incentivo para a indexação, criando-se, assim, um perigoso círculo vicioso.

As expectativas, que no estudo mencionado contribuíram com 37% da variação do IPCA em 2016, estão firmemente ancoradas em patamar inferior a 4,5% ao ano. É o que nos mostra o mercado de títulos públicos, quando comparamos os rendimentos reais dos papéis indexados à inflação com aqueles oferecidos por títulos com taxas nominais prefixadas. E não se diga que isso ocorre em razão da recessão. Mesmo papéis com vencimento para 2021 em diante mostram quadro semelhante. O nome disso é credibilidade do BC e crença de que o governo brasileiro, afinal, está realmente empenhado em ajustar as contas públicas.

Ao contrário dos argumentos mencionados no início deste texto, a redução da meta de inflação, digamos, para 4,25% ao ano em 2018 e 4,0% ao ano em 2019, exigirá juros menores, e não maiores (embora, no curto prazo, os juros reais possam ser ligeiramente maiores) do que os que prevaleceriam com a meta em 4,5%. Não é mágica. São apenas efeitos da redução da meta por um BC crível sobre as expectativas e destas sobre a taxa efetiva de inflação.

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