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É preciso focar o debate sobre a Previdência

O déficit da Previdência é real, enorme e tem tendência explosiva

Por Cláudio Adilson Gonçalez
Atualização:

Uma aluna obteve o título de doutora em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro com uma tese sobre a Previdência Social no Brasil. Para ela, “(...) o déficit da Previdência é uma farsa criada pelo pensamento neoliberal conservador (...)”. Longe de mim protestar contra a liberdade da produção acadêmica, mas nem por isso posso deixar de lamentar que os recursos públicos aplicados em nossas universidades sejam utilizados para financiar esse tipo de asneira.

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O déficit da Previdência é real, enorme e tem tendência explosiva. Em 2016, foi de R$ 149,8 bilhões (2,4% do PIB), somente no INSS. Se forem computados os déficits do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) dos funcionários públicos estatutários da União, dos Estados e dos municípios, o buraco chega a quase 5% do PIB.

Na mesma linha daquela tese de doutorado, documento publicado pela Frente Parlamentar Mista em Defesa da Previdência Social (FPMDPS) mostrou que a Seguridade Social, que além da Previdência inclui saúde e programas sociais, apresentou superávit de R$ 54 bilhões em 2014 e de R$ 11 bilhões em 2015. Não foram divulgados os cálculos para 2016.

Para a Secretaria do Tesouro Nacional, os números são bem diferentes: déficits de R$ 193,6 bilhões em 2015 e de R$ 257 bilhões em 2016. Quando se utiliza o critério mais amplo de Seguridade Social, há uma interminável discussão do que se deve incluir como receita e como despesa. Por exemplo, diferentemente do Tesouro, o FPMDPS inclui nas receitas a parcela das contribuições sociais desvinculada pela DRU, dotações próprias de ministérios da área social, entre outras, e exclui o pagamento dos inativos da União.

Não pretendo fazer uma reconciliação contábil desses demonstrativos. O ponto que defendo é que se deve mudar o foco do debate, do déficit – cujo cálculo dá margem a infrutíferas e intermináveis discussões – para a magnitude e tendência do gasto previdenciário, que, além de menos polêmico, é, a meu ver, a variável que mais importa.

Com uma população de idosos de cerca de 10% em relação às pessoas em idade ativa, o Brasil gastou, em 2016, 12% do PIB com o pagamento de benefícios previdenciários, aqui incluídos o INSS e o RPPS. É um caso único no mundo.

Estudo que realizei utilizando dados demográficos do IBGE e parâmetros dos Ministérios do Trabalho e da Fazenda estima que, em 20 anos (2037), tal gasto alcançará 16% do PIB. Em prazo mais longo (2050), será de 20% do PIB, quando a população de idosos deve ultrapassar 22%, conforme estimativas da Pew Research Center.

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Sob qualquer critério que se utilize, o Brasil não suporta o tamanho do seu gasto com Previdência Social, mesmo que não houvesse déficit e fosse possível financiá-lo integralmente. Isso exigiria a alocação de recursos demasiadamente elevados em relação ao PIB, não deixando margem para o governo realizar investimentos e prestar serviços públicos essenciais ao crescimento econômico e à melhora da qualidade de vida da população.

As críticas ao projeto são infundadas e demonstram desconhecimento ou má-fé. Por exemplo, alegam que a idade mínima de 65 anos e a forma de cálculo do benefício são cruéis, pois, dado que a expectativa de vida ao nascer do brasileiro é de 76 anos, o trabalhador só se aposentaria com um rendimento próximo à média do salário de contribuição quando estivesse quase na hora de morrer. Tolice. O que importa no caso é a expectativa de vida de quem atinge 65 anos (e não ao nascer), e esta é atualmente de 83 anos, tendendo a aumentar, segundo o IBGE.

A reforma proposta pelo governo está bem formulada e tem fundamentos atuariais. Não há gorduras e é pequeno o espaço para o Congresso fazer bondades e aliviar as regras do projeto, sob pena de torná-lo inócuo para ajustar as contas públicas.

*ECONOMISTA, DIRETOR DA MCM CONSULTORES, FOI CONSULTOR DO BANCO MUNDIAL, SUBSECRETÁRIO DO TESOURO NACIONAL E CHEFE DA ASSESSORIA ECONÔMICA DO MINISTÉRIO DA FAZENDA