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Economia brasileira, percepção e realidade

Por ANTONIO CORRÊA DE LACERDA
Atualização:

Teria a economia brasileira mudado tanto de 2009 para cá que justificasse uma alteração tão brusca de percepção sobre o nosso futuro, como se pôde observar, por exemplo, nas duas capas da revista inglesa The Economist? A primeira, de quatro anos atrás, trazia a imagem do Cristo Redentor "decolando", enquanto a segunda, de setembro de 2013, trazia o mesmo Cristo desgovernado.Em 2009 o PIB havia decrescido 0,3% com os efeitos da crise dos EUA. Mas esse não foi um privilégio do Brasil. Outras economias de países emergentes de porte, como México e Rússia, tiveram quedas bem mais expressivas: de 6,2% e de 7,8%, respectivamente. Já em 2010 o Brasil cresceria 7,5%, daí a euforia, de certa forma refletindo as expectativas de parte do mercado. Mas, desde então, nos últimos três anos o crescimento médio do País tem-se restringido à média de 2% ao ano.Isso, não obstante, manteve o Brasil entre as oito principais economias do mundo, com o quarto maior mercado em automóveis e informática, o segundo em cosméticos, um dos maiores produtores e exportadores do setor agropecuário e outros destaques, com a substancial melhora da distribuição de renda e a incorporação de cerca de 40 milhões de pessoas à classe de renda média ("C") no último decênio.O desemprego caiu a menos da metade: de 12%, há dez anos, para a média inferior a cerca de 5,5%, desde 2012, com a contribuição da redução do crescimento demográfico e o retardamento do ingresso dos jovens no mercado de trabalho, que preferem antes se educar melhor.Sob o ponto de vista das contas públicas, embora tenha havido uma deterioração recente dos indicadores, o Brasil tem um déficit público relativamente baixo, de 2,5% do PIB, no conceito nominal, que inclui o pagamento de juros. A inflação se mantém alta, encostando no teto superior da meta, e deve fechar o ano perto dos 6%, em linha, porém, com a média dos países em desenvolvimento, também nesse nível. Há uma pressão estrutural de inflação nesses países, decorrente da demanda por alimentos, o crescimento dos serviços e dos custos de mão de obra.Há, portanto, um efeito positivo nesta trajetória, uma vez que é a tradução de uma das dores do crescimento com distribuição de renda.Há, por outro lado, problemas como o insustentável crescimento do déficit em conta corrente do balanço de pagamentos, já próximo de US$ 80 bilhões este ano (era de US$ 24 bilhões em 2009). O ingresso anual de investimentos diretos estrangeiros, de outra parte, subiu de US$ 25 bilhões, em 2009, para mais de US$ 60 bilhões, no acumulado dos últimos 12 meses. No ranking dos maiores países receptores, o Brasil evoluiu da 7.ª colocação, em 2010, para a 4.ª, em 2012. O tal "desencantamento", felizmente, não chegou aos investidores produtivos.No entanto, perdemos competitividade com fatores sistêmicos desfavoráveis e o longo período de valorização do real, que estagnou a produção industrial nos últimos cinco anos. Houve certa deterioração na qualidade da política econômica, que, embora tenha acertado no atacado, especialmente no combate aos efeitos da crise dos EUA e europeia, errou na insistência de repetir medidas cujo efeito tende a ser decrescente, como financiamento incentivado e a desoneração tributária nos elos finais da cadeia produtiva.O Brasil precisa, urgentemente, focar o aumento da competitividade para gerar mais valor agregado local, qualificar e ampliar suas exportações e criar um ambiente mais favorável ao investimento, tanto em infraestrutura quanto na produção.Apesar das ressalvas, há uma clara dicotomia entre a real situação e potencial da economia do País e a forma como é retratada ou vista. Mas isso também revela, no mínimo, uma falha de comunicação. É necessário um esforço de melhora da qualidade da comunicação, assim como ampliar o leque de interlocução com os agentes, especialmente com os formadores de opinião.ECONOMISTA, PROFESSOR-DOUTOR DA PUC-SP, CONSULTOR, É COAUTOR DO LIVRO 'ECONOMIA BRASILEIRA' (5ª EDIÇÃO, 2013) E-MAIL: LACERDA.ECONOMISTA@GMAIL.COM

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