PUBLICIDADE

Publicidade

Economistas lançam manifesto contra política econômica

Por Agencia Estado
Atualização:

Economistas ligados ao PT ou que apoiaram a candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência lançam hoje, simultaneamente, no Rio de Janeiro e em São Paulo, um manifesto contra a atual política econômica. No documento, "A Agenda Interditada - Uma Alternativa De Prosperidade Para o Brasil", eles defendem o controle do câmbio e de capitais externos, além de redução do superávit primário e das taxas de juros. A seguir, a íntegra do manifesto, que já conta com 240 assinaturas e foi organizado por Plínio de Arruda Sampaio Jr, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). "O Brasil está sendo levado a um beco sem saída de estagnação e desemprego por uma política econômica que capitulou à insensatez do totalitarismo de "mercado". Desde os anos 90 o debate sobre alternativas de desenvolvimento foi virtualmente interditado com o recurso ao dogma de que o "mercado", sábio e virtuoso, se deixado a si mesmo promoverá a prosperidade coletiva. Passado mais de um decênio em que o experimento neoliberal vem sendo praticado no Brasil, é hora de um balanço, e de um questionamento: até quando o crescimento com redistribuição de renda será negado à sociedade brasileira? A interdição do debate econômico nos últimos anos pretendeu desqualificar como anacrônica toda crítica a qualquer aspecto da política econômica. Hoje, repetindo o que aconteceu na última década, a sociedade vem sendo privada de participar ou acompanhar um debate genuíno sobre medidas de política econômica, boa parte das quais decidida de comum acordo com o FMI à revelia de qualquer instância democrática, inclusive do Congresso Nacional. O "mercado" não debate, apenas ameaça. E aqueles que deveriam debater em seu nome tomam a ameaça de suas reações como suficientes para cancelar o próprio debate. Os pontos-chave da política econômica são encapsulados numa cadeia de tabus porque a simples menção de discuti-los é descartada em face do risco da especulação do "mercado", pelo que o "mercado" obtém uma franquia para continuar ditando os rumos de uma política econômica em proveito único de seus operadores, e cujo resultado para a sociedade tem sido baixo crescimento econômico e ampliação do desemprego. Basta. Queremos abrir a agenda da economia política brasileira e expor a caixa preta da política econômica ao debate aberto. É um imperativo moral que reconheçamos o alto desemprego, sem precedentes em nossa história, como o mais grave problema social brasileiro, resultante diretamente das políticas monetária e fiscal restritivas, assim como da abertura comercial sem restrições. É um imperativo político, em face dos direitos de cidadania e tendo em vista a preservação da democracia, que se promova uma política retomada do desenvolvimento com justiça social e estabilidade cujo objetivo último é o pleno emprego. Há alternativa. Ela não passa por mudanças tópicas em um ou alguns dos aspectos da "coerente" política ortodoxa em curso, mas pela inversão de toda a matriz da política econômica. Isso significa reforçar a interferência do Estado no domínio econômico, a exemplo do que ocorreu historicamente em situação similar com o New Deal, nos Estados Unidos, para corrigir as distorções provocadas pelo "livre mercado", sobretudo o alto desemprego, que compromete a estabilidade social e política do País. Em linhas gerais, implicaria um conjunto simultâneo de medidas do tipo: 1.controle do fluxo de capitais externos e administração do câmbio em nível favorável às exportações; 2.enquanto perdurar o alto desemprego, redução do superávit primário pelo aumento responsável do dispêndio público, a fim de ampliar a demanda efetiva agregada induzindo a retomada do desenvolvimento e do emprego; 3.ampliação dos gastos públicos nos três níveis da administração, com prioridade para dispêndio com ampliação dos serviços de educação, saúde, segurança, assistência e habitação, grandes geradores de empregos, e de competência também dos estados e municípios - o que implica a restauração da saúde financeira da Federação, inclusive mediante renegociação das dívidas de Estados e Municípios para com o Governo federal; 4.redução significativa da taxa básica de juros, como complemento indispensável da política fiscal de estímulo à retomada dos investimentos privados; 5.promoção de investimentos públicos e privados em saneamento e infra-estrutura (logística e energia), para assegurar a melhoria da competitividade sistêmica da economia; incentivo a investimentos imediatos em setores privados próximos da plena capacidade; 6.manutenção e ampliação da política de incentivo às exportações; e substituição de importações; 7.política de rendas pactuada para controle da inflação. Sustentamos que o Brasil tem diante de si uma alternativa de política econômica de prosperidade. O atual Governo, que foi eleito em função de expectativas de mudança, tem diante de si a responsabilidade de evitar que a crise social herdada se transforme numa crise política de proporções imprevisíveis, a exemplo do que tem ocorrido em outros países da América do Sul contemporaneamente, e do que ocorreu historicamente na Europa, nos anos 20 e 30. Os obstáculos políticos à mudança não são maiores que os riscos de não realizá-la. Colocamos o foco de nossas sugestões na promoção do pleno emprego porque se trata de uma política estruturante da solução de outros problemas sociais e econômicos miséria, subemprego, marginalidade, iníqua distribuição de renda, violência, insegurança. Contudo, este não é um projeto estritamente econômico, nem um projeto fechado. É uma contribuição de economistas à busca de um novo destino nacional, base do resgate da cidadania, e condição para uma sociedade solidária. Nenhuma das medidas propostas ou seu conjunto são um anátema à luz da história econômica real dos países que experimentaram algum êxito econômico e social, hoje como no passado. Desafiamos os que se escondem por trás da onipotência do deus "mercado" que sustentem à luz da discussão pública e de suas consequências atuais e futuras suas propostas de política econômica. Queremos o debate já. Queremos o exercício democrático da controvérsia. Chega de interdição." Rio de Janeiro/São Paulo, junho de 2003

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.