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Economistas respondem a Bolsonaro: Brasil não está quebrado, mas governo precisa fazer escolhas

Segundo especialistas, País tem boa situação financeira, mas precisa avançar na aprovação de medidas essenciais para a sustentabilidade das contas públicas, como as reformas tributária e administrativa

Foto do author Adriana Fernandes
Por Adriana Fernandes e Idiana Tomazelli
Atualização:

BRASÍLIA - Economistas ouvidos pelo Estadão são taxativos no contraponto ao presidente Jair Bolsonaro: o Brasil não está quebrado, mas é preciso fazer escolhas para ampliar gastos, incluindo o avanço na aprovação de medidas essenciais para a sustentabilidade das contas públicas. 

'Brasil está quebrado, chefe', disse Bolsonaroa apoiador nesta terça-feira, 5. Foto: Erado Peres/AP

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Nesta terça-feira, 5, ao responder um apoiador que o cobrou sobre o aumento da isenção do Imposto de Renda (hoje, concedido a quem ganha até R$ 1,9 mil por mês), Bolsonaro disse: "Chefe, o Brasil está quebrado, chefe. Eu não consigo fazer nada".

Para economistas, porém, o presidente pode, sim, se empenhar para a aprovação da reforma administrativa que prevê uma reformulação no RH do Estado, com mudanças na forma como os servidores são contratados, promovidos e demitidos. Ou cortar os chamados benefícios tributários, quando a União abre mão da arrecadação em favor de grupos específicos. Com esse discurso, a avaliação é de que o presidente posterga e acumula os problemas. 

Mansueto Almeida, ex-secretário do Tesouro Nacional dos governos Temer e Bolsonaro. Foto: Dida Sampaio/Estadão

Mansueto Almeida, ex-secretário do Tesouro Nacional dos governos Temer e Bolsonaro

O Brasil não está quebrado. O presidente quis dizer talvez que, apesar da carga tributária elevada aqui, mesmo cumprindo com o teto dos gastos, ainda teremos este ano e nos próximos déficit primário e crescimento da dívida pública. Assim, não há espaço para o governo abrir mão de arrecadação porque ainda teremos que reduzir o mais rápido possível o desequilíbrio fiscal ao longo dos próximos anos para consolidar o cenário de inflação na meta, juros baixos e recuperação da economia.

A situação é a seguinte: hoje, o Brasil não pode abrir mão de R$ 1 de receita e ainda tem que se esforçar para recuperar neste e nos próximos anos a arrecadação que perdeu com a crise da covid-19 na queda do Produto Interno Bruto (PIB) e na arrecadação.

Carlos Thadeu de Freitas, ex-diretor do Banco Central e atual economista-chefe da Confederação Nacional de Comércio (CNC). Foto: Roque de Sá/Agência O Globo

Carlos Thadeu de Freitas, ex-diretor do Banco Central e atual economista-chefe da Confederação Nacional de Comércio (CNC)

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O Brasil não está quebrado. O Brasil quebrou várias vezes no passado por falta de dólares. E quebrou em cruzados novos pela hiperinflação deixada pelo ex-ministro Maílson da Nóbrega com sua política de feijão com arroz. Hoje, o Brasil é credor líquido em dólares, tem a taxa de juros mais baixa da história, saiu em V da recessão e a renda média aumentou no ano passado. Fala que o País está quebrado somente quem não conhece economia. Mas presidente é presidente. Bolsonaro falou isso para ninguém pedir ajuda. Ele quis barrar pedidos de verbas ao governo. Quando ele prometeu ampliar a faixa de isenção do Imposto de Renda era outra época. Hoje, mudou tudo. É outro mundo. O presidente tem que falar não e não.

Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados. Foto: Gabriela Biló/Estadão

Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados

Iniciando a metade final de seu mandato, o presidente indica que não conseguirá fazer mais nada de relevante. Ao sugerir mãos atadas por um país quebrado, ele esquece de que poderia fazer uma reforma administrativa que envolvesse o funcionalismo da ativa e que poderia ir além na PEC emergencial, discutindo gastos tributários como a Zona Franca de Manaus. Ou que pudesse entrar em acordo sobre as reformas tributárias na Câmara e no Senado, mais profundas do que a apresentada pelo Ministério da Economia. Mas não. Ao sair com esse discurso por falta de força política o presidente posterga e acumula os problemas para 2023, início de um novo governo. Serão dois anos que, pelo jeito, veremos o Executivo bater cabeça como ficou o governo Temer depois da delação da JBS. Vamos, novamente, viver em compasso de espera.

Guilherme Tinoco, especialista em contas públicas. Foto: Twitter/Reprodução

Guilherme Tinoco, especialista em contas públicas

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O Brasil não quebrou. O País vive um momento econômico complicado e, em termos fiscais, há que de fato se ter muita responsabilidade. A dívida do país cresceu bastante, atinge níveis recordes e segue sendo uma das mais altas, senão a maior, entre países emergentes. Isso não é desculpa, contudo, para nada fazer. Esse discurso não serviu, por exemplo, para impedir o aporte bilionário de recursos na empresa estatal militar, Engeprom, ou a concessão de aumento salarial aos militares. Esse discurso também não tem sido suficiente para mobilizar o governo para realizar as reformas necessárias.

Onde está a reforma administrativa? Onde estão as privatizações prometidas? E o anúncio de corte nos benefícios fiscais? Também é importante lembrar que o atraso na vacinação custa bastante, em termos financeiros, conta que um país quebrado não pode suportar. A cada 1 ponto percentual de PIB perdido por conta desse atraso, o governo deixa de arrecadar um montante próximo ao valor da privatização da Eletrobrás.