Efeito do corte de juros na recuperação do País não é consenso entre economistas

Parte dos especialistas ouvidos pelo 'Estado' percebe sinais de retomada na concessão de crédito, enquanto alguns analistas dizem que desemprego alto e incertezas inibem efeito da Selic

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Por Douglas Gavras 
Atualização:
2 min de leitura

Se existe quase um consenso entre os economistas ao aprovarem a continuidade do corte dos juros básicos, os efeitos práticos da queda da Selic para 5,5% ao ano para a recuperação da economia ainda não são tão claros. Enquanto parte deles vê sinais de aumento de demanda por crédito, outros avaliam que o desemprego elevado e a demanda fraca ainda inibem investimentos e gastos das famílias. 

Fila em mutirão de emprego no Anhangabaú, no centro de São Paulo. Foto: Felipe Rau/Estadão

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O economista Sergio Werlang, da Escola Brasileira de Economia e Finanças da Fundação Getulio Vargas (EPGE/FGV), é um dos que defendem que os juros básicos no patamar mais baixo da série histórica já causam efeitos positivos visíveis, apesar de a recuperação após a recessão seguir a passos lentos. 

“O corte de juros é o canal clássico de política monetária. Para a continuidade da retomada da economia, é essencial que a taxa de juros de curto prazo siga seu rumo esperado, isto é, que o Banco Central continue cortando pelo menos mais duas vezes a Selic até que ela chegue a, pelo menos, 5% ao ano.”

Everton Pinheiro de Souza Gonçalves, superintendente da Associação Brasileira de Bancos (ABBC), ressalta que os efeitos da taxa de juros mais baixa podem ser sentidos nas concessões de crédito para pessoa física com recursos livres (que inclui desde empréstimos convencionais a créditos consignados), que cresceram 5,1% em julho, segundo o Banco Central.

“São alguns sinais de que começa a melhorar e que podem continuar, mantidas as condições atuais. A liberação de recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) também pode dar algum sinal positivo na demanda”, completa.

Os efeitos dos cortes de juros, no entanto, se perdem em uma economia que ainda de lado porque nem consumidor e nem empresários se sentem seguros para investir. Se para um pesa o endividamento das famílias e o desemprego em 11,8%, para o outro, a demanda reprimida segura investimentos. 

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O economista José Luís Oreiro, da Universidade de Brasília (UnB) avalia que não há sinais de recuperação, mesmo com juros em queda. “Basta olhar para as filas de desempregados que se formam nas grandes cidades. A inflação deve fechar, pelo terceiro ano consecutivo abaixo da meta (em 4,25%, para 2019). Sinal de que a política monetária está conservadora demais. Os juros básicos poderiam estar em 3,5% ao ano e a economia teria mais espaço para reagir.” 

O ex-diretor do Banco Central e chefe do Centro de Estudos Monetários do Instituto Brasileiro de Economia da FGV, José Júlio Senna, lembra que a sabedoria econômica ensina que é possível levar um cavalo até um riacho, mas não se pode obrigá-lo a beber água.

“A economia brasileira está enfrentando o mesmo dilema das economias desenvolvidas, em que as políticas de corte de juros não se refletem em aumento da tomada de crédito. As pessoas acumulam dívidas e incertezas e evitam tomar crédito.”

Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, avalia que a queda de juros é positiva, embora os efeitos mais robustos na economia só devem começar a ser observados só no ano que vem. “Além disso, é preciso que se continue a pensar em políticas de queda do spread bancário (a diferença entre os custos para o banco captar recursos e o que ele cobra do consumidor).”

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